Ex-PM que pediu votos a ministra do Turismo ameaçava moradores e chefiava grupo de 70 criminosos
Comissão Parlamentar de Inquérito foi comandada pelo então deputado Marcelo Freixo, que agora será subordinado de Daniela Carneiro como presidente da Embratur
O ex-policial militar Juracy Alves Prudêncio, o Jura, que fez campanha lado a lado com Daniela Carneiro, a Daniela do Waguinho, ministra do Turismo do governo Lula, foi citado no relatório final da CPI das Milícias da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj).
Segundo o documento, o miliciano — condenado a 22 anos de prisão por homicídio — chefiava um bando "formado por 70 pessoas, incluindo policiais militares” que atuava nos bairros Comendador Soares, Jardim Nova Era, Jardim Pernambuco, Palhada e Rosa dos Ventos, todos em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. A CPI foi presidida pelo então deputado estadual Marcelo Freixo — que será subordinado a Daniela no novo governo, afinal, foi anunciado pela ministra como presidente da Embratur. Em nota, a ministra afirmou que "apoio político não significa que ela compactue com qualquer apoiador que porventura tenha cometido algum ato ilícito".
Ainda segundo o relatório, a milícia de Jura cobrava taxas de segurança R$ 20 a R$ 30 dos moradores, e de R$ 20 a R$ 40 de comerciantes. A quadrilha também tinha o monopólio da venda de gás, do sinal clandestino de TV a cabo e do "gatonet". Denúncias compiladas pela CPI apontavam que o ex-PM "estaria ameaçando os moradores a votarem nele dizendo que 'cabeças vão rolar' se ele não se eleger" e que homens armados de sua quadrilha obrigavam "moradores a colocar cartazes do candidato Jura nos postes, dizendo que os moradores têm que votar nele".
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Em 2008, Jura foi candidato a vereador de Nova Iguaçu pelo Partido Republicano Progressista (PRP). Com 9.335 votos, ele não conseguiu se eleger. De acordo com a investigação, o ex-PM usou a estrutura da milícia para fazer sua campanha.
No período eleitoral de 2018, Jura entregou santinhos ao lado da atual ministra numa passeata na Baixada Fluminense. Na época, Jura estava preso em regime semiaberto, mas conseguiu autorização da Justiça para sair da cadeia para trabalhar e ganhou o cargo de Diretor do Departamento de Ordem Urbana na Prefeitura de Belford Roxo, comandada pelo marido de Daniela, Wagner dos Santos Carneiro, o Waguinho. Daniela conseguiu ser eleita deputada federal.
A ministra, o marido e o miliciano também posaram juntos para fotos feitas em outros momentos, como uma festa infantil. Segundo as sentenças que condenaram o ex-sargento da PM entre 2010 e 2014, Prudêncio era chefe do Bonde do Jura, uma milícia acusada de uma série de homicídios na Baixada Fluminense. Ele está preso desde 2009, quando foi o principal alvo da Operação Descarrilamento, da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco), que levou para trás das grades nove PMs acusados de integrar a milícia que ele chefiava.
Prudêncio é condenado pelo homicídio de um desafeto da milícia. O crime aconteceu no dia 27 de maio de 2007. A vítima, Paulo Ricardo Soares da Silva, de 16 anos, foi executada a tiros dentro de um bar em Nova Iguaçu. “Quem lhe dota de poderes para matar? E matar de forma absoluta, atroz e ferozmente por simples desavença. A resposta não será encontrada em manual acadêmico ou em apostila de sociologia. Matam por capricho, matam por maldade, matam crentes da impunidade”, escreveu o juiz Murilo Kieling, da 3ª Vara Criminal, na sentença.
No último dia 13 de dezembro, a Justiça fluminense negou o pedido de Prudêncio para visitar a família no Natal. Segundo a decisão, da juíza Beatriz de Oliveira Monteiro Marques, o miliciano "atuaria, inclusive, na área política, ameaçando moradores das localidades em que atuava a votarem nele".
Procurado, o advogado de Prudêncio, Luan Palmeira, afirmou que não tem "autorização dele nem da família para falar sobre o processo". Palmeira pediu para conversar com seu cliente antes de dar qualquer declaração sobre a relação dele com Waguinho e Daniela. A ministra afirmou, por meio de nota enviada por sua assessoria, que "apoio político não significa que ela compactue com qualquer apoiador que porventura tenha cometido algum ato ilícito". Segundo o texto, "compete à justiça julgar quem comete possíveis crimes". Ela também afirma que "não tem nenhuma ingerência" sobre as nomeações na Prefeitura de Belford Roxo.