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guerra no oriente médio

Explosão que matou 21 soldados de Israel revela construção secreta de zona tampão na Faixa de Gaza

De acordo com o Canal 12 de Israel, havia um total de 2.850 edifícios na área de amortecimento planejada, dos quais as Forças Armadas já destruíram cerca de 1.100

Tanque do exército israelense avança no sul de Israel ao longo da fronteira com a Faixa de GazaTanque do exército israelense avança no sul de Israel ao longo da fronteira com a Faixa de Gaza - Foto: Jack Guez/AFP

Os 21 soldados que morreram em Gaza esta semana enquanto equipavam dois edifícios com explosivos estavam tentando demolir parte de um bairro palestino, como parte de um plano para criar uma zona tampão entre o enclave e o território israelense, afirmaram autoridades militares do país em uma entrevista coletiva.

A explosão na segunda-feira ocorreu depois que combatentes de Gaza dispararam contra um tanque que guardava uma unidade israelense usada para colocar explosivos dentro de prédios palestinos na fronteira com a intenção de demoli-los, disseram os militares de Israel na terça-feira.

"É um dos esforços adicionais ou camadas de segurança que estão sendo implementadas após 7 de outubro" disse o tenente-coronel Jonathan Conricus, membro sênior da Fundação para a Defesa das Democracias e porta-voz das Forças Armadas até o início deste mês.

Autoridades israelenses apresentaram a ideia em diversas ocasiões, mas os comentários de terça-feira foram a primeira confirmação pública de que a estratégia está em curso.

Israel quer demolir muitos dos edifícios palestinos próximos à fronteira para criar o que eles descrevem como uma "zona de segurança", de acordo com três autoridades, que falaram ao jornal New York Times sob anonimato porque não estavam autorizadas a comentar publicamente sobre o assunto.

Duas das autoridades disseram que o objetivo de Israel era criar uma zona tampão de quase um quilômetro ao longo de toda a extensão da fronteira de Israel com Gaza, que tem cerca de 58 quilômetros — em seu ponto mais estreito, o território tem menos de 6,5 quilômetros de largura. A intenção é dificultar que se repita um ataque como o de 7 de outubro, no qual cerca de 1.200 pessoas foram mortas e outras 240 sequestradas, de acordo com estimativas israelenses, e que levou à retirada de dezenas de milhares de residentes do sul de Israel.

Questionados sobre a criação de uma zona tampão, os militares disseram que suas forças estavam "localizando e destruindo infraestruturas terroristas embutidas, entre outras coisas, dentro de edifícios", o que, segundo eles, era necessário para implementar um plano de defesa para o sul de Israel. Um dos objetivos de guerra do país é criar “condições de segurança para o retorno dos residentes do sul às suas casas”, disse o porta-voz chefe das Forças Armadas, contra-almirante Daniel Hagari. Algumas das áreas demolidas ficam a algumas centenas de metros dos bairros israelenses que foram atacados.

Antes de 7 de outubro, os guardas de fronteira israelenses impunham uma zona tampão de 300 metros ao longo dos 58 quilômetros de divisa, embora os palestinos pudessem cultivar na área. As autoridades israelenses agora argumentam que a aplicação negligente da zona permitiu que o Hamas rompesse a cerca da fronteira em 7 de outubro.

Os militares recusaram-se a fornecer mais detalhes sobre a zona tampão, incluindo a profundidade da área que pretendem limpar. Em um comunicado publicado na quarta-feira, as Forças Armadas disseram apenas que “isso faz parte das ações imperativas necessárias para implementar um plano de defesa que proporcionará maior segurança no sul de Israel”.

De acordo com o Canal 12 de Israel, havia um total de 2.850 edifícios na zona tampão planejada, e as Forças Armadas já destruíram cerca de 1.100 edifícios. Procurado pelo jornal Washington Post, o Exército não quis comentar.

A ideia de uma área de amortecimento ganhou tanta força no discurso israelense que o Departamento de Estado dos EUA se manifestou contra ela em dezembro, porque reduziria efetivamente o tamanho de Gaza, um processo ao qual o governo americano se opõe.

John Kirby, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, repetiu essa objeção na terça-feira, quando perguntado em uma entrevista coletiva da Casa Branca sobre as medidas de Israel para criar uma zona-tampão.

"Não queremos ver o território de Gaza reduzido de forma alguma" disse Kirby. "Não apoiaremos isso".

No entanto, o Secretário de Estado Antony Blinken, falando durante uma visita à Nigéria, disse que os Estados Unidos estavam abertos a uma zona tampão temporária, embora apenas para permitir o retorno dos israelenses que fugiram de suas casas ao longo da fronteira de Gaza após 7 de outubro.

"Se houver necessidade de acordos de transição para permitir que isso aconteça, isso é uma coisa a ser feita" comentou Blinken. "Mas quando se trata do status permanente de Gaza daqui para frente, fomos claros, continuamos claros sobre não invadir seu território".

Para os palestinos, a prática é cruel e impediria que os habitantes de Gaza, em um enclave já lotado, pudessem voltar para suas casas. Os críticos da política israelense afirmam que a prática faz parte de uma desconsideração mais ampla pelas moradias e propriedades civis. A maioria dos edifícios de Gaza foi danificada durante a guerra, de acordo com estimativas das Nações Unidas, e mais de 25 mil habitantes de Gaza foram mortos, de acordo com autoridades de Gaza.

Balakrishnan Rajagopal, relator especial das Nações Unidas sobre o direito à moradia adequada, disse que a demolição sistemática de casas na fronteira palestina poderia constituir um crime de guerra porque elas não representam uma ameaça imediata a Israel.

"Simplesmente não há previsão nas Convenções de Genebra para o que Israel está fazendo ao longo da fronteira, que é uma espécie de limpeza preventiva de propriedades" disse Rajagopal em uma entrevista por telefone. "Israel pode tomar medidas sobre cada propriedade específica, mas não de forma generalizada em toda a fronteira. Israel, como potência ocupante, tem a obrigação de não se envolver no que é chamado de destruição arbitrária de propriedade".

Os militares não responderam a um pedido de comentário do New York Times sobre as alegações.

Embora Israel nunca tenha anunciado formalmente a demolição de casas palestinas na fronteira, o conceito de uma zona tampão ao longo da divisa com Gaza tem sido amplamente discutido pela mídia israelense desde o início de dezembro, quando a ideia foi relatada pela Reuters.

Os ministros israelenses também sugeriram planos para criar essa zona de proteção desde as primeiras semanas da guerra. Eli Cohen, o ministro das Relações Exteriores na época, afirmou que, após a guerra, "o território de Gaza também diminuirá". Dias depois, Avi Dichter, o ministro da agricultura, falou sobre a criação de "uma faixa" ao longo da fronteira de Gaza.

"Não importa quem você seja, você nunca poderá chegar perto da fronteira israelense" declarou Dichter. 

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