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Facebook 20 anos: como a rede consolidou a economia, onde as plataformas ditam as regras

Vendas e publicidade turbinaram os ganhos das redes sociais. Dados viraram ouro, no 'capitalismo de vigilância'

Em duas décadas, além de agregar novas ferramentas para anúncios, a Meta também aperfeiçoou suas plataformas de vendaEm duas décadas, além de agregar novas ferramentas para anúncios, a Meta também aperfeiçoou suas plataformas de venda - Foto: Olivier Douliery/AFP

No Brasil, país em que quase metade da população tem uma conta no Facebook e em que o número de celulares supera o de pessoas, ser um influenciador já é o ofício de meio milhão de pessoas. Aos vinte anos, a rede social Facebook pode ter perdido espaço na cultura de influência.

Mas, sob o guarda-chuva da Meta, sua controladora, costurou uma teia de plataformas que movimenta a chamada economia de criadores, usa dados para direcionar publicidade e virou saída para empresas venderem e se relacionarem com consumidores.

Em duas décadas, além de agregar novas ferramentas para anúncios, a Meta também aperfeiçoou suas plataformas de venda — pelo WhatsApp, Instagram e Facebook —, com recursos cada vez mais especializados em negócios, além de melhorar o direcionamento de anúncios.

Com isso, multiplicou em 16 vezes a receita na última década, desde que abriu capital, passando de US$ 7,8 bilhões para US$ 134 bilhões.
Facebook 20 anos: Caso Cambridge Analytica fomentou leis para garantir privacidade e combater desinformação Tulio Chiarini, pesquisador do Centro de Pesquisa em Ciência, Tecnologia e Sociedade do Ipea, explica que a Meta, assim como outras empresas de dados como o Google, acabam formando em torno de si um ecossistema próprio de negócios, que envolve empresas, usuários e companhias especializadas em fazer a ponte entre eles.

As regras do jogo desse ecossistema, lembra, ficam a cargo das big techs.


"São empresas que se tornaram dependentes de plataforma. Um ponto nevrálgico da Meta é que eles controlam todo o tronco de uma árvore com as empresas que possuem. O substrato desse ecossistema passa inteiro por uma única grande empresa, que detém as regras e regulamentos que governam a interação entre criadores e usuários, bem como as diretrizes para monetização"


Ascensão da economia de criadores
A Meta não informou ao GLOBO a quantidade de usuários que o Facebook tem no país. As estimativas, no Brasil, apontam para cerca de 110 milhões, que soma-se a cerca de 150 milhões de usuários do WhatsApp e mais 113 milhões do Instagram.
O tráfego dessa audiência passa por parte dos 249 milhões de aparelhos celulares, do país, segundo levantamento da FGV, média de 1,2 por habitante. Entre os conectados, 500 mil são influenciadores, de acordo com Nielsen Media Research, e a maior parte tem Instagram e TikTok como redes principais.

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João Finamor, professor de marketing digital da ESPM, explica que o Facebook abriu espaço para que a cultura dos influenciadores florescesse, em um momento em que começavam a explodir as estrelas do YouTube e que uma geração de blogueiros ainda influenciava adolescentes no início dos anos 2000.

— Pela facilidade de capilarização e de viralização de conteúdo, o Facebook deu voz para mais pessoas. Foi um catalisador da cultura de influenciadores.

Para as grandes empresas, a ascensão do Facebook, depois sucedido por Instagram, WhatsApp e TikTok, gerou em um movimento em que as próprias marcas se tornam influenciadoras, além de atenderem clientes e venderem por essas plataformas. As redes sociais forçaram as marcas a “descerem do pedestal”, avalia Eder Redder, diretor nacional de conteúdo da agência de publicidade Artplan: 'Sinto muito': Zuckerberg pede desculpas no Congresso dos EUA sobre falha na proteção de menores em redes sociais — Uma coisa é a marca vendendo algo e a outra é ela entrando na conversa (com o público).

Ela sai do seu patamar de uma marca intocável desenhada por marqueteiros para descer a montanha e conversar com as pessoas. Estratégia on-line para impulsionar negócio Apesar dos perfis com milhões de seguidores serem os mais lembrados quando o assunto é influência, a maior parte dos criadores de conteúdo no Brasil é formada pelos chamados “microinfluenciadores”, com até 50 mil seguidores, segundo a Squid, plataforma de digital influencers. Essa parcela representa 78% dos criadores brasileiros.

A empreendedora Cássia Lima, de 23 anos, conta que utilizou parcerias com influenciadores digitais para ampliar seu público quando abriu o studio Cássia Lima Beauty. Hoje, as redes sociais são o principal canal dela com consumidores:


"É onde divulgo meu catálogo, mostro meus serviços, meu atendimento. E isso gera muita visibilidade para o meu negócio", conta Cássia, que hoje faz ela própria o conteúdo do negócio, aparece nas redes e conversa com seus seguidores.


Tulio Chiarini, do Ipea, lembra que um dos efeitos adversos da dependência de negócios e criadores com as plataformas é ficarem sujeitos à mudanças nas políticas das redes, o que pode impactar drasticamente suas receitas e estratégias de negócios, e a falta de transparência na operação desses mecanismos.

Cronologia: Como a plataforma consolidou a era das redes sociais e mudou da política aos negócios
— A centralização pode resultar em um ambiente de negócios desigual, onde a Meta tem uma influência desproporcional sobre a economia de criadores, justamente por controlar hoje plataformas que se tornaram infraestrutura (o que se chama "infraestruturação de plataformas"). Isso pode limitar a inovação e criar um ambiente em que os criadores ficam vulneráveis a mudanças súbitas — afirma o pesquisador.

No caso das pequenas e médias empresas, a migração para a venda digital virou uma oportunidade - e uma necessidade - para aumentar a receita. Em 2017, apenas 22% das empresas brasileiras, de todos os portes, usavam a internet para esse fim. Essa proporção, em 2021, com o impulso da pandemia, saltou para 73%, segundo o Cetic.br.

A mina de ouro dos dados
A estudante de direito Giovana Fontes, de 25 anos, conta que começou a divulgar seu empreendimento - uma empresa de eventos - em grupos do Facebook. Hoje, com cerca de 30 festas por mês e 20% da agenda preenchida para este ano, ela diz que Facebook e Instagram são responsáveis por cerca de 60% do quadro de vendas do negócio.

— As redes sociais ajudaram muito a minha empresa. Elas possibilitam que pequenos empreendedores consigam divulgar seu trabalho e crescer organicamente. Algo que antes só era possível através de um grande investimento em publicidade — comenta a dona da Elementar.
Para ampliar a capacidade de negócios atingirem o público que buscam - sejam pequenos, como o de Giovana, ou de grande porte, como os atendidas pela Arplan - as redes sociais contam com uma mina de ouro pouco visível, mas fundamental: os dados dos usuários É a partir deles e de seu comportamento nas redes que os posts impulsionados chegam a quem tem o potencial de compra e é assim que a publicidade direcionada tem alguma efetividade.

Dessa dinâmica de negócio, veio o termo "Capitalismo de Vigilância", cunhado pela professora emérita da Harvard Business School Shoshana Zuboff. Nesse modelo, os dados não são usados apenas para aperfeiçoar sistemas e melhorar serviços, mas são transformados em produto - a riqueza é gerada a partir da coleta, análise e venda de dados sobre o comportamento humano.


"A acumulação de dados vira a nova forma de acumulação de capital. O modelo é centrado em dados e isso é o mais importante", acrescenta Tulio Chiarini.

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