Falta de água dificulta esforços para conter incêndios florestais em Los Angeles; entenda
Sistemas de armazenamento e de bombeamento não conseguiram acompanhar a alta demanda para conter as chamas, que avançaram rapidamente na cidade
Os esforços dos bombeiros para combater os incêndios florestais de rápida propagação em Los Angeles foram dificultados pela falta de água no sistema local de abastecimento, que, sobrecarregado pela intensidade do fenômeno, secou alguns hidrantes em áreas mais elevadas da cidade.
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Autoridades agora afirmam que os tanques de armazenamento que fornecem água para regiões de grande altitude, e os sistemas de bombeamento que os abastecem, não conseguiram acompanhar a demanda enquanto o fogo avançava de um bairro para o outro.
Segundo funcionários de segurança locais, isso ocorreu em parte porque aqueles que projetaram o sistema não consideraram a velocidade impressionante com que múltiplos incêndios simultâneos poderiam se espalhar pela cidade. À medida que o crescimento urbano se espalha para áreas próximas à mata ao redor do país — e as mudanças climáticas trazem condições de incêndio mais desafiadoras — um número crescente de cidades tem enfrentado uma perda súbita de água disponível.
— Estamos lidando com uma situação que simplesmente não faz parte de nenhum projeto de sistema de água doméstico — disse Marty Adams, engenheiro-chefe do Departamento de Água e Energia de Los Angeles, responsável por fornecer água a quase quatro milhões de residentes.
No Colorado, quando os bombeiros estavam prestes a ficar sem água em 2022, as equipes tomaram a medida extraordinária de usar água não tratada. Em 2023, na ilha de Maui, no Havaí, os bombeiros descobriram que seus hidrantes estavam secos enquanto as chamas avançavam pela comunidade de Lahaina, matando 102 pessoas no incêndio mais mortal do país em mais de um século. Agora, a destruição simultânea de casas e canos causou o escoamento de água pelos quintais e ruas bem no momento em as equipes precisavam dela em seus hidrantes.
O primeiro foco de incêndio registrado em Los Angeles nesta semana começou na manhã de terça-feira em Palisades. Ele consumiu mais de 6 mil hectares e destruiu mais de mil estruturas, levando à emissão de ordens de evacuação para 37 mil residentes. Depois, outros focos foram surgindo, sobrecarregando as equipes de combate ao fogo em toda a região. Segundo Chad Augustin, chefe do Departamento de Bombeiros de Pasadena, a propagação inicial do incêndio não poderia ter sido interrompida, mesmo com mais água disponível.
— Aquelas rajadas de vento estavam enviando as brasas para muitos metros à frente do incêndio. Isso é o que realmente causou a propagação rápida das chamas — afirmou.
Novos desafios
Os sistemas de águas municipais nos Estados Unidos, como o de Los Angeles, são projetados para lidar com cargas pesadas, incluindo aquelas usadas em grandes incêndios, que podem exigir que vários caminhões de bombeiros se conectem ao sistema ao mesmo tempo. O transporte de água para os níveis superiores das comunidades das encostas, como Pacific Palisades, no entanto, pode ser um desafio, avaliam especialistas. Lá, a água é coletada num reservatório que bombeia para três tanques de armazenamento, cada um com capacidade de 1 milhão de galões.
— Mas os sistemas de bombeamento e armazenamento foram projetados para um incêndio que poderia consumir várias casas, não um que consumiria centenas — disse Adams, o engenheiro-chefe do Departamento de Água. — Se isso vai se tornar uma norma, será necessário um novo pensamento sobre como os sistemas são projetados.
Os tanques de armazenamento em Palisades e outras comunidades afetadas estavam cheios antes dos incêndios. Ainda assim, à medida que o fogo se espalhava na terça-feira, o primeiro tanque foi rapidamente esvaziado. Horas depois, o segundo já estava vazio. O terceiro secou na manhã de quarta. Naquele dia, no topo da Sunset Boulevard, um homem se ajoelhou diante de um bombeiro que combatia um incêndio que consumia a casa ao lado, implorando para que ele direcionasse a água para as chamas que ameaçavam sua própria casa.
— Estamos com 25% [de água]. Aguente — respondeu outro bombeiro, que chegou a conectar sua mangueira a um novo hidrante para ajudar, mas descobriu que ele estava seco.
Traci Park, membro do Conselho da Cidade de Los Angeles, cujo distrito inclui Pacific Palisades, disse que os sistemas de água da cidade estavam entre várias partes de infraestrutura criticamente subfinanciadas. Ao New York Times, ela afirmou que existem “catástrofes ambientais esperando para acontecer” em todos os lugares com os encanamentos de água atuais, alguns deles com mais de 100 anos de idade. Mesmo com o crescimento da cidade, disse, a infraestrutura não foi atualizada.
— Nossos bombeiros estavam lá ontem (quarta-feira) combatendo um incêndio florestal feroz com caminhões de bombeiros e hidrantes. Não é assim que se combate um incêndio florestal — ressaltou, levantando a questão da complexidade de combater incêndios que ocorrem em áreas de mata, mas que invadem bairros urbanos.
Grag Pierce, pesquisador da Universidade da Califórnia que estuda recursos hídricos e planejamento urbano, ecoou as preocupações sobre os sistemas de água projetados para incêndios urbanos. Ele pontuou, contudo, que redesenhar os sistemas de água para permitir que os bombeiros enfrentem um incêndio florestal de grande escala seria “extremamente caro”.
Para o especialista, a questão mais fundamental é avaliar se é uma boa ideia reconstruir bairros adjacentes a áreas selvagens, questão debatida na região à medida que as mudanças climáticas aumentam a frequência e a intensidade dos incêndios.