São João

Festa Junina: conheça a origem dos festejos e a história dos santos celebrados neste período

Festa junina reúne cultura e religiosidade

Leonardo Alves, devoto de Santo Antônio, celebra o período junino com fé e entusiasmoLeonardo Alves, devoto de Santo Antônio, celebra o período junino com fé e entusiasmo - Foto: Arthur de Souza/Folha de Pernambuco

Junho chegou e, como tradicionalmente ocorre em Pernambuco e demais estados da região Nordeste, o São João está no centro das atenções. Uma multidão de apaixonados pelo período junino já planeja festas e quadrilhas, assim como se esbaldar em deliciosas comidas típicas, grande parte delas feitas à base de milho.

Mas, para além do festejo em si, também há outro, ou melhor outros, protagonistas nesta época do ano. Afinal, ao falarmos de São João não estamos falando apenas sobre a simbologia da festa, mas também sobre o santo católico que dá nome às comemorações. Comemorações essas, aliás, que são divididas especialmente com outras duas santidades, Santo Antônio e São Pedro, e com um terceiro nome um pouco menos famoso dentro dos festejos, mas que completa o quarteto junino: São Paulo.

Como explica a historiadora Thalyta Oliveira, a relação entre os santos católicos e as festas juninas iniciou no Brasil ainda no período colonial, com a chegada dos portugueses. Inicialmente de origem pagã, os festejos foram incorporados à tradição cristã e se tornaram parte do calendário comemorativo do País.

“As festas juninas são eventos tradicionais do calendário brasileiro e demonstram a diversidade cultural de nosso país. Tradicionalmente, iniciam na véspera de Santo Antônio, em 12 de junho, e terminam no dia 29 de junho, quando celebramos São Pedro e São Paulo. Apesar de ser uma tradicional festividade popular brasileira, temos que destacar que ela foi trazida pelos portugueses ao nosso país durante o período colonial”, disse. 

Thalyta Oliveira, historiadora - Foto: Melissa Fernandes/Folha de Pernambuco

“As origens das festas juninas estão atreladas diretamente às festividades pagãs realizadas na Europa na passagem da primavera para o verão, conhecido como solstício de verão. Inicialmente essas festas eram realizadas como forma de afastar os maus espíritos e qualquer praga que pudesse atingir a colheita. Assim, as comemorações que antes eram realizadas por diferentes povos pagãos europeus começaram a ser cristalizadas a partir do momento que o cristianismo se consolidou como principal religião do continente. Dessa forma foi incorporada ao calendário festivo do catolicismo”, acrescentou. 

O próprio nome da festa pode ser atrelado tanto ao mês quanto ao santo. “Ao ser introduzido ao Brasil, foi chamado de festa joanina em referência ao São João, mas, ao longo dos anos, teve o nome alterado para festa junina, agora fazendo referência ao mês de sua realização, junho. No início, estava relacionado à religiosidade, no entanto, podemos dizer que essa conotação foi se perdendo um pouco, uma vez que muitas vezes é vista mais como uma festividade popular que propriamente religiosa. Além disso, a evolução da festa junina fez com que fosse associada aos símbolos típicos das zonas rurais e tornou-se um grande símbolo da cultura popular nordestina”, comentou a historiadora.

Professor de sociologia do Colégio Salesiano, Matheus Souto destaca o caráter intrínseco entre a cultura do Nordeste e os festejos juninos. “Quando a gente fala sobre a cultura nordestina, a primeira coisa que vem em geral é essa memória do São João ou a memória em geral das festas juninas. Então, quando a gente fala sobre a cultura própria do Nordeste, é impossível dissociá-la do São João e das festas juninas como um todo, que se relacionam muito com a própria história e cultura própria do Sertão, do Agreste, de vários aspectos da festa.” 

A história dos santos também foi incorporada às expressões locais. O ato de acender fogueira, por exemplo, faz alusão ao nascimento de São João Batista e à forma como eram anunciados tais momentos na chamada Terra Santa. O viés “casamenteiro” de Santo Antônio seria algo compartilhado unicamente entre Brasil e Portugal. São Paulo representa o arrependimento e a conversão. Já São Pedro carrega consigo a simbologia do Sertão.

Matheus Souto, professor de Sociologia - Foto: Divulgação

“São Pedro acaba ganhando o aspecto mais próprio para a cultura nordestina, principalmente o Agreste, o Sertão, porque sendo ele o porteiro do céu, como se entende na tradição católica, também seria aquele responsável pelas chuvas. Então, para o povo sertanejo que tinha na chuva essa grande esperança de uma boa colheita, até para as festas, é algo muito característico. É algo tipicamente nosso essa relação, da nossa cultura, essa questão da agricultura, do agrário, e portanto a relação com o santo que patrocinaria a própria chuva da festa. Realmente, São Pedro é essa figura que tem esse caráter bem brasileiro, bem nordestino, bem agrário”, analisou.

Segundo o especialista, essas relações contribuem para a construção de uma identidade regional. “Negar a relevância desses santos, suas histórias e as transformações na nossa cultura seria negar a nossa própria cultura. A nossa cultura se baseia na nossa herança ibérica que veio para cá e que se adaptou ao nosso clima, é a tradição ibérica nos trópicos. Então, seria negar a nossa cultura deixar essas coisas de lado. A gente precisa ter esse esforço constante de resgatá-las”, opinou.

Para o cientista da religião Aderson Viana, é importante mensurar que tais tradições mesclam elementos sagrados e profanos, montando uma simbologia inerente à região.

Aderson Viana, cientista da religião - Foto: Divulgação

“Na tradição católica, nessa religiosidade popular católica, existem diversas manifestações ou expressões populares que mesclam os elementos profanos e sagrados dentro dessas celebrações ou comemorações. No âmbito profano, nós temos as quadrilhas, as fogueiras, as comidas típicas feitas principalmente à base de milho. No âmbito do sagrado, nós temos por exemplo nas festividades em honra de Santo Antônio, a chamada trezena de Santo Antônio, que são 13 dias de preparação para a festa. Em relação a São João Batista e a Pedro, e vamos colocar aí também o apóstolo Paulo, tem a novena, nove dias de preparação. Então, é muito rico isso dentro da nossa cultura e nosso povo absorveu isso no calendário profano e também no calendário religioso”, disse. 

Como salienta Viana: “O sagrado é aquilo que acontece dentro do templo, aquilo que é realizado dentro do templo, ou que tem relação com práticas ou rituais religiosos. O profano é aquilo que é realizado fora do templo, porque está muito ligado ao folclore, às tradições e hábitos de uma população. Mas também é importante dizer que tanto no profano quanto no sagrado, nós lidamos com elementos simbólicos, porque estão no âmbito da cultura. Então, religião e tradições folclóricas estão diretamente ligadas à cultura”.

Devoto de Santo Antônio, o educador físico Leonardo Alves, 27, compreende a junção cultural e religiosa do período junino como uma tradição positiva e simbólica. “A cultura está atrelada a tudo ao nosso redor. Nós fazemos parte de uma cultura e que bom que há esse entrelaçamento. Porque imagina a festa de Santo Antônio, comemorar o dia de Santo Antônio, sem estar atrelado às festas juninas. Eu acho que não teria o mesmo sabor, não teria a mesma graça. Logicamente que a gente entende que há um momento de festa e há um momento também da oração, mas por que também não trazer esse momento de festa para dentro da igreja?”, avaliou. 

Leonardo Alves, devoto de Santo Antônio - Foto: Arthur de Souza/Folha de Pernambuco

Hoje membro do Ministério de Música, ele frequenta a Paróquia Santo Antônio, no bairro do Arruda, na Zona Norte do Recife, desde a infância. Já foi catequista, além de ter se batizado e realizado a Primeira Eucaristia e o Crisma também no local.

“Desde que eu nasci, eu tenho a igreja, a Paróquia Santo Antônio, como a minha casa. Falar de Santo Antônio é falar da minha relação interpessoal, mas também enquanto serviço a Jesus Cristo. Que enquanto eu me entendo, quando eu paro para refletir minha fé, para analisar sobre essas minhas questões pautadas na religião, sempre vem Santo Antônio, sempre vem a Paróquia Santo Antônio, sempre vem Santo Antônio de Pádua. Ele também foi o santo dos pobres, dedicou a vida aos mais humildes. Então, isso me faz também me identificar com ele, me identificar com esse processo mesmo de igreja, de pessoa, de religioso que quer chegar a Deus e através da humildade”, contou.

O professor de sociologia Matheus Souto, também mestrando com foco na política externa do Vaticano, destacou algumas das principais características dos santos celebrados no período junino.

“A mensagem principal de Pedro a gente poderia resumir em humildade e fidelidade à vontade de Deus. A de Santo Antônio seria resumida pela pureza. Ele geralmente era retratado com um flor de lírio na mão, que é uma flor que representa a pureza na simbologia, e do outro lado segurando o menino Jesus, para representar a inocência. E São João vai no aspecto de uma vida de pobreza e radicalidade da mensagem, uma vida de radicalidade do evangelho, de penitência, de oração, de jejum e doação. A história de São Paulo é muito interessante porque antes ele era um fariseu que caçava cristãos e depois se converte. Então, São Paulo fala muito propriamente para todos nós, ele era um homem como nós, que tinha os seus pecados, as suas dificuldades, que depois são purificadas”.

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