ESTADOS UNIDOS

Desinformação vira obstáculo após furacão Helene, e situação pode piorar com tempestade Milton

Impulsionados por figuras como Elon Musk e Donald Trump, teorias conspiratórias, boatos e mentiras ameaçam minar os esforços para fornecer informações precisas e recursos essenciais, alertam autoridades

Vista aérea mostra casas danificadas após furacão Helene atingir a FlóridaVista aérea mostra casas danificadas após furacão Helene atingir a Flórida - Foto: Chadan Khanna/AFP

Após a devastação provocada pelo furacão Helene nos Estados Unidos, parte do país se viu dividida: enquanto milhares de pessoas ainda lamentam as mais de 200 mortes e os danos causados pela tempestade de categoria 4 (de um total de 5) que atingiu a costa em 26 de setembro, outras reproduzem teorias conspiratórias, boatos e mentiras que ameaçam minar os esforços para fornecer informações precisas e recursos essenciais. A situação fica ainda mais preocupante com a chegada do furacão Milton, que deve atingir a Flórida também como uma tempestade de categoria 4 nesta semana, segundo o Serviço Nacional de Meteorologia.

No condado de Rutherford, na Carolina do Norte, autoridades de comunidades atingidas pelo fenômeno se reuniram para discutir os danos e os esforços contínuos de busca e resgate. Mas, em poucas horas, uma teoria da conspiração começou a circular. Postagens nas redes sociais indicavam que o encontro era, na verdade, uma discussão secreta sobre a destruição, confisco e venda de terras com fins lucrativos ou para a extração de lítio. Alegações falsas atribuem os eventos climáticos a conspirações globalistas, incêndios criminosos e supostas armas de energia — e muitas vezes são alimentadas por imagens geradas por inteligência artificial (IA) ou desatualizadas.

"Trabalho com desastres há quase 20 anos, e não consigo me lembrar de outro desastre em que houve tanta desinformação", disse Samantha Montano, professora assistente de gestão de emergências na Massachusetts Maritime Academy.

Os boatos também foram expandidos por figuras de destaque, incluindo o empresário Elon Musk, que repetidamente ampliou a desinformação para seus milhões de seguidores desde que comprou a plataforma de mídia social, em outubro de 2022. O ex-presidente Donald Trump, candidato do Partido Republicano nas eleições presidenciais de novembro, também afirmou falsamente que os fundos de ajuda a desastre estavam sendo desviados para abrigar imigrantes e sugeriu, sem provas, que os democratas não estavam dispostos a ajudar os residentes conservadores — embora alguns governadores republicanos tenham elogiado a resposta do governo do presidente Joe Biden.

Quando questionada sobre o papel de Trump na disseminação de falsas alegações, Karoline Leavitt, porta-voz do ex-presidente, reiterou a mentira. O governador da Carolina do Norte, Roy Cooper, disse em comunicado que a desinformação é “uma grave ameaça no rescaldo de uma tempestade como o Helene”, alertando que ela poderia ser “mortal”. No Tennessee, o prefeito Glenn Jacobs pediu que as pessoas “deixassem o ódio para ajudar”, e Kevin Corbin, representante estadual republicano da Carolina do Norte, pediu ajuda para “interromper essa besteira”.

Desafios da desinformação
Grande parte da desinformação foi dirigida à Agência Federal de Gerenciamento de Emergências (FEMA), que foi fortemente criticada durante o furacão Katrina, em 2005, pelas falhas na resposta de emergência. Desde então, a agência contratou gerentes de emergência mais experientes, incluindo sua atual administradora, Deanne Criswell, que já liderou o departamento de gerenciamento de emergências na cidade de Nova York. Apesar disso, seus esforços para lidar com as disparidades raciais nos programas de ajuda e reformular os programas de assistência fizeram da agência um alvo maior para a desinformação.

Nos últimos dias, a FEMA teve que lidar com alegações de que estava roubando doações, desviando ajuda para a Ucrânia ou recusando ajuda de outros, mentira que Musk espalhou. Mas até domingo, só na Carolina do Norte, havia mais de 700 funcionários da agência e mais de 1 mil membros da Guarda Nacional na região, e a FEMA aprovou US$ 30 milhões (R$ 163 milhões) em moradia e outros tipos de assistência. Cerca de 1,7 mil pessoas foram alojadas em hotéis por meio de um programa da agência, segundo autoridades. Biden também anunciou no domingo o envio de 500 tropas adicionais para o oeste do estado.

“Minha administração está usando todos os recursos para apoiar as famílias enquanto começam o processo de reconstrução”, disse o presidente democrata em comunicado.

Em entrevista à ABC no domingo, Criswell disse que a desinformação era “realmente perigosa”. Ela disse ser “uma vergonha que as pessoas estejam sentadas em suas confortáveis poltronas enquanto temos milhares de pessoas aqui no local que deixaram suas próprias famílias para ajudar aqueles que precisam”. A atual administradora da FEMA disse que a retórica criou “medo em nossos próprios funcionários”, e que houve pedidos para que os moradores formassem milícias para se defenderem dos funcionários da agência. Ameaças antissemitas e misóginas também foram proferidas contra eles.

A amplitude da desinformação chegou aos governos locais, uma tendência preocupante que surgiu no auge da pandemia de Covid-19. Autoridades da região disseram ter sido desanimador não apenas ver recursos sendo desviados da resposta à emergência para combater as alegações falsas, mas também enfrentar o desprezo e a desconfiança em comunidades pequenas. Muitos especialistas e voluntários dizem ter sido doloroso ver seus esforços sendo desacreditados ou questionados, muitas vezes por pessoas que podem nem ter uma conexão direta com a área.

"É desafiador ler e ver essas postagens nas redes sociais", afirmou Aaron Aguirre, piloto de helicóptero Black Hawk na Guarda Nacional do Tennessee. Só na última sexta-feira, ele ajudou a distribuir cerca de duas toneladas de suprimentos no leste do estado.

"Todos estão aqui porque querem estar, não porque precisam estar. Estamos totalmente envolvidos nisso. Realmente queremos estar aqui."

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