Geórgia reprime manifestantes e aprova "lei de agentes estrangeiros", nos moldes da Rússia
Parlamento aprovou medida após semanas de protestos contra a legislação; sessenta e três pessoas foram presas
O parlamento da Geórgia aprovou, nesta quarta-feira, uma lei para limitar a influência estrangeira no país, acusada por ativistas pró-União Europeia de ser semelhante à legislação utilizada na Rússia para silenciar a oposição. A tramitação do projeto levou milhares de pessoas às ruas, que foram duramente reprimidas, com 63 pessoas detidas durante uma manifestação noturna.
O Legislativo aprovou o projeto de lei, ignorando três semanas de manifestações populares contrárias, por 83 votos a favor e 23 contra. A legislação tem apoio do governo de Tiblisi, que pretende sancioná-la ainda em maio. A medida pode afastar o país de suas pretensões de integrar a União Europeia.
Uma onda de protestos tomou o país do Cáucaso desde o começo de abril, quando o governo iniciou a tramitação do projeto de lei sobre agentes estrangeiros. O partido no poder, Sonho Georgiano, tentou aprovar uma legislação similar no início de 2023, mas não conseguiu devido aos protestos em massa.
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Desta vez, os protestos foram reprimidos pela polícia antidistúrbios, que usou gás lacrimogêneo e balas de borracha contra os manifestantes. Um deputado da oposição, Levan Khabeishvili, foi agredido durante a repressão e precisou de assistência médica. Khabeishvili é presidente do Movimento Nacional Unido, o principal partido de oposição do ex-presidente Mikhail Saakashvili, atualmente preso. Um repórter da AFP viu policiais de choque mascarados avançarem violentamente sobre a manifestação pacífica que começou na terça-feira à noite.
— Não vamos permitir que aprovem uma lei russa que pode enterrar nosso futuro na Europa — disse Natia Gabisonia, uma manifestante de 21 anos.
A presidente da Geórgia, Salome Zurabishvili, uma política pró-europeia que está em conflito com o partido no governo, pediu ao ministro do Interior que ponha fim à "repressão" e afirmou que houve um "uso desproporcional da força". O Ministério do Interior afirmou que a polícia usou a violência de forma "legítima" para conter uma protesto que se tornara "violento". Espera-se que Zurabishvili vete a medida, mas o partido governante tem votos suficientes para anulá-la.
Líderes europeus também condenaram o uso de violência contra os manifestantes. O chefe de política externa da UE, Josep Borrell, afirmou que os manifestantes estavam pacificamente mostrando sua oposição ao projeto de lei.
"A Geórgia é um país candidato à UE, faço um apelo às suas autoridades para garantirem o direito à manifestação pacífica. O uso da força para suprimi-la é inaceitável", escreveu Borrell no X (antigo Twitter).
'Lei russa'
O projeto de lei aprovado exige que qualquer ONG independente e organização de mídia que receba mais de 20% de seu financiamento do exterior se registre como uma "organização que busca os interesses de um poder estrangeiro".
Em uma rara aparição pública esta semana, o bilionário Bidzina Ivanishvili — presidente do partido governante, que é amplamente considerado o principal poder na Geórgia — disse que a medida visa aumentar a transparência do financiamento estrangeiro para grupos civis.
— O financiamento não transparente de ONGs é o principal instrumento para o estabelecimento de um governo georgiano a partir exterior — disse ele a apoiadores do governo.0
A Geórgia busca há anos aprofundar as relações com o Ocidente, mas o partido no poder tem sido acusado de tentar direcionar a antiga república soviética para mais perto da Rússia. Em dezembro, a UE concedeu ao país o status oficial de candidato, mas disse que Tbilisi teria que reformar seus sistemas judiciais e eleitorais, reduzir a polarização política, melhorar a liberdade de imprensa e limitar o poder dos oligarcas antes que as negociações de adesão sejam formalmente iniciadas. (Com AFP)