Guantánamo: EUA libertam 11 prisioneiros que não foram acusados de nenhum crime em 20 anos de prisão
Medida faz parte de esforço do governo do Joe Biden para diminuir a população carcerária da unidade
Os militares dos EUA enviaram 11 prisioneiros iemenitas da Baía de Guantánamo para Omã para recomeçar suas vidas, informou o Pentágono na segunda-feira, deixando apenas 15 homens na prisão.
A medida é um esforço ousado no final do governo de Joe Biden, que deixou a população carcerária da unidade menor do que em qualquer outro momento em seus mais de 20 anos de história.
Nenhum dos homens libertados havia sido acusado de crimes durante suas duas décadas de detenção. Agora todos prisioneiros restantes, com exceção de seis, foram acusados ou condenados por crimes de guerra. Havia 40 detentos quando o presidente Biden assumiu o cargo e ressuscitou um esforço do governo de Barack Obama (2009-17) para fechar a prisão.
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Os EUA abriram Guantánamo para abrigar suspeitos capturados em todo o mundo, contornando o direito constitucional ao devido processo legal garantido em solo americano. A instalação foi marcada por várias alegações de prisão extrajudicial, negação de direitos e tortura. Os 15 restantes estão mantidos em dois prédios prisionais com celas para cerca de 250 detentos.
Uma informação do jornal Wall Street Journal afirma que o governo Biden negocia com o Talibã a saída de pelo menos um prisioneiro de alto escalão da al-Qaeda, supostamente associado a Osama bin Laden, em troca de americanos detidos no Afeganistão. O acordo tem sido discutido desde pelo menos julho, segundo o jornal.
Biden disse ao grupo em 14 de novembro que os EUA libertariam Muhammad Rahim al-Afghani se seus governantes afegãos libertassem George Glzmann, Ryan Corbett e Mahmoud Haibi — este último, o Talibã nega estar mantendo em detenção. O grupo ofereceu uma contrapoposta, mas Biden ainda não se decidiu sobre ela, informou o WSJ.
O Pentágono realizou a operação secreta na madrugada de segunda-feira, dias antes da audiência em que o prisioneiro mais notório de Guantánamo, Khalid Sheikh Mohammed, se declarará culpado de planejar os ataques de 11 de setembro de 2001, que mataram quase 3 mil pessoas, em troca de uma sentença de prisão perpétua em vez de enfrentar um julgamento com pena de morte.
A transferência estava sendo planejada há cerca de três anos. Um plano inicial para realizar a transferência em outubro de 2023 foi prejudicado pela oposição do Congresso. Cliff Sloan, um advogado que serviu como enviado para o fechamento de Guantánamo durante a administração Obama, chamou a transferência de "um marco significativo" que muda o equilíbrio da população da unidade para uma maioria de homens que foram acusados ou condenados por crimes de guerra.
— Mas ainda há muito mais que precisa ser feito — afirmou.
Quem são os libertados?
Os 11 libertados incluem Moath al-Alwi, um ex-grevista de fome de longa data que ganhou atenção no mundo da arte por construir modelos de barcos a partir de objetos encontrados na prisão de Guantánamo; Abdulsalam al-Hela, cujo testemunho foi solicitado pelos advogados de defesa no caso USS Cole; e Hassan Bin Attash, o irmão mais novo de um réu no caso de conspiração de 11 de setembro.
Todos os prisioneiros foram liberados para transferência por meio de painéis federais de revisão de segurança nacional.
As autoridades americanas se recusaram a dizer o que os EUA deram a Omã, um dos aliados mais estáveis de Washington no Oriente Médio, e quais garantias receberam em troca. Por lei, os militares não podem enviar prisioneiros de Guantánamo para o Iêmen porque, como uma nação envolvida em uma guerra civil brutal, é considerada instável demais para monitorar e reabilitar os retornados.
Em geral, os EUA pagam aos países anfitriões quantias para moradia, educação, reabilitação e para monitorar as atividades dos homens. Washington também pediu aos países receptores que impedissem os ex-detentos de Guantánamo de viajar para o exterior por pelo menos dois anos.
Poucos detalhes sobre o programa de reabilitação foram divulgados por Omã, uma nação insular liderada por um sultão. Diferentemente da Arábia Saudita, que mostrou seu centro de reintegração para os detentos de Guantánamo a repórteres e acadêmicos. As autoridades americanas chamaram o programa de Omã de “bem completo” e projetado para ajudar os iemenitas a retornarem à sociedade com empregos, casas e famílias, muitos por meio de casamentos arranjados.
Medidas do governo Obama
O governo Obama enviou 30 detentos para Omã de 2015 a 2017. Um homem morreu no país, mas os demais foram enviados para casa — 27 para o Iêmen e dois para o Afeganistão, de acordo com um funcionário do Departamento de Estado, que falou sob condição de anonimato devido à sensibilidade das negociações diplomáticas.
Muitos dos iemenitas se casaram e tiveram filhos em Omã e foram repatriados com suas famílias. A notícia dos sucessos chegou aos prisioneiros iemenitas em Guantánamo e fez de Omã um país de reassentamento desejado, disse George M. Clarke, advogado de dois dos homens que foram transferidos esta semana.
Os homens enviados a Omã foram capturados por aliados dos Estados Unidos ou levados sob custódia dos EUA entre 2001 e 2003. Clarke disse que eles estavam ansiosos para voltar a um mundo com telefones celulares e acesso à Internet.
— Eles querem viver suas vidas — disse Clarke, que representa Tawfiq al-Bihani e Bin Attash. — Eles querem se casar. Querem ter filhos. Querem conseguir um emprego e ter uma vida normal.