Israel intensifica ofensiva na Cisjordânia em meio à expectativa de colonos por apoio de Trump
Operação militar lançada durante cessar-fogo em Gaza foi recebida com otimismo
O Exército de Israel recrudesceu sua operação militar contra a cidade de Jenin, na Cisjordânia, nesta quinta-feira (23), e anunciou a morte de dois palestinos que afirmam ter envolvimento com os assassinatos de três israelenses neste mês.
O ataque, parte de uma operação mais ampla anunciada pelo governo, demonstra uma mudança do foco militar para o território mais ao norte durante o acordo de cessar-fogo na Faixa de Gaza — e em um momento em que o retorno de Donald Trump à presidência dos EUA alimenta expectativas por parte de colonos israelenses de apoio aos seus planos de reconhecimento e expansão da ocupação sobre a região.
Os militares israelenses identificaram os homens mortos como Mohamad Nazzal e Katiba Shalabi, afirmando que eles seriam integrantes da Jihad Islâmica Palestina, um grupo armado com atuação comprovada em Jenin.
Eles entram na estatística de dez mortos e mais de 40 feridos na Cisjordânia, divulgada pelo Ministério da Saúde palestino, desde o início da nova operação, nomeada pelo premier israelense, Benjamin Netanyahu, como "Muralha de Ferro". Também há relatos na imprensa palestina sobre dezenas de presos.
Leia também
• Netanyahu diz que Musk foi 'falsamente difamado' por suposta saudação nazista na posse de Trump
• Centenas de palestinos fogem de Jenin no terceiro dia de operação israelense
• Rubio promete "apoio firme" a Israel em conversa com Netanyahu
A operação antiterrorismo foi lançada em um momento particularmente delicado para Netanyahu. Ao concordar com o acordo de cessar-fogo com o Hamas para reaver parte dos reféns sequestrados pelo grupo terrorista durante o atentado de 7 de outubro de 2023 — uma exigência da maior parte do povo israelense, que motivou meses de manifestação em todo o país —, o premier ficou exposto à ala mais radical de seu próprio governo.
Um dos partidos de extrema direita de sua coalizão, o Poder Judaico, deixou o governo e reduziu a maioria do premier no Knesset a uma margem mínima. A sigla tem entre sua base eleitoral colonos israelenses, que defendem uma abordagem linha-dura contra os palestinos, incluindo o não reconhecimento e ocupação de territórios na Cisjordânia e em Gaza.
Ao deixar o governo, o líder do Poder Judaico, Itamar Ben Gvir (então ministro da Segurança Interna), tentou fazer com que outra liderança de extrema direita, o ministro da Economia, Bezalel Smotrich, do partido Sionismo Religioso, abandonasse a coalizão e derrubasse o Gabinete de Netanyahu. Smotrich, contudo, manteve-se no governo, com a promessa de que a guerra contra o Hamas seria retomada ao fim do cessar-fogo para retorno dos reféns.
A imprensa israelense especulou sobre outras contrapartidas oferecidas a Smotrich — líder de uma sigla que também conta com os votos de colonos para se manter eleitoralmente viável — pelo premier, em uma série de reuniões que mantiveram antes do "sim" ao acordo. Entre elas, estaria o apoio a novos assentamentos na Cisjordânia e a criação de um "novo padrão de defesa", que o extremista poderia explorar eleitoralmente como uma conquista sua dentro do governo.
Não está claro se a operação antiterrorismo em Jenin seria parte das contrapartidas, uma vez que a região é motivo de preocupação para Israel desde antes do início da guerra em Gaza. Por não ter todas as fronteiras controladas por Israel, a Cisjordânia é considerada uma área mais propensa à entrada de armas vindas do Irã, e Jenin seria um ponto central na estratégias de grupos como Hamas e Jihad Islâmica. De todo modo, a ação ostensiva foi bem recebida sobretudo por colonos israelenses, que recentemente se envolveram em escaramuças com militantes palestinos na região.
Expectativa com Trump
Os assentamentos israelenses na Cisjordânia são um dos maiores pontos de pressão internacional sobre o Estado judeu. Estabelecidos na esteira da vitória israelense durante a Guerra dos Seis Dias, em 1967, eles são considerados ocupações irregulares por boa parte dos observadores internacionais — em agosto, a Corte Internacional de Justiça (CIJ) emitiu uma opinião consultiva sobre a ocupação israelense da Cisjordânia e de Jerusalém Oriental, bem como seus assentamentos, afirmando que violam o direito internacional. O governo israelense defende o direito dos colonos de permanecerem na terra.
Ao longo dos anos, os colonos estiveram envolvidos em uma série de episódios de violência, seja por ação de grupos armados que contestam a permanência dos assentamentos na região, seja por ações dos próprios colonos — no começo da semana, um grupo de homens armados atacou duas vilas palestinas, o que motivou uma repreensão do ministro da Defesa israelense, Israel Katz.
As atividades violentas também motivaram a imposição de sanções por países estrangeiros, incluindo os EUA.
Leia também
• Netanyahu diz que Musk foi 'falsamente difamado' por suposta saudação nazista na posse de Trump
• Centenas de palestinos fogem de Jenin no terceiro dia de operação israelense
• Rubio promete "apoio firme" a Israel em conversa com Netanyahu
Ao contrário de Netanyahu, porém, o atual momento é visto como positivo para os colonos. Se por um lado o cessar-fogo em Gaza desagradou os interesses dos colonos, as sinalizações e contrapartidas desde então agradaram. Internamente, por ocasião do acordo com o Hamas, Katz assinou uma ordem para liberar todos os colonos em detenção administrativa por crimes praticados na Cisjordânia, no que foi visto como uma forma de contrabalancear os interesses do grupo.
Na arena internacional, a posse de Donald Trump, em Washington, também chegou provocando um sentimento de euforia. Em um dos primeiros decretos assinados nas primeiras horas de governo, o republicano levantou sanções que haviam sido impostas pelo governo Biden contra colonos de Israel que teriam se envolvidos em atividades extremistas. A ordem foi vista como um sinal verde para ações ostensivas pelos colonos.
Forças políticas israelenses, incluindo os partidos liderados por Ben Gvir e Smotrich, têm pressionado o governo para reocupar territórios palestinos ao fim da guerra em Gaza, como uma repercussão do ataque lançado pelo Hamas há 15 meses. Israel não tem mais assentamentos em Gaza, embora controle a maior parte de sua fronteira.
Atividade terrorista
Antes do início da guerra em Gaza, Jenin já era alvo de preocupação israelense — e mesmo da Autoridade Nacional Palestina —, pela propagação de grupos armados na região. Tanto Hamas quanto a Jihad Islâmica recrutam jovens na cidade para ingressarem na luta armada. Mesmo as forças de segurança palestinas, ligadas a Autoridade Nacional Palestina, realizaram operações na cidade do norte no mês passado.
Em um período mais recente, observou-se o surgimento de novas milícias na região, representadas por uma geração mais jovem, frustrada com uma liderança palestina que eles veem como corrupta e que não se opõe firmemente à ocupação israelense.