América do Sul

Justiça argentina identifica pela primeira vez desaparecido da ditadura graças à mecha de cabelo

Pesquisa foi realizada pela Equipe Argentina de Antropologia Forense,

Carlos Vullo, diretor do Laboratório de Genética Forense da Equipe Argentina de Antropologia Forense Carlos Vullo, diretor do Laboratório de Genética Forense da Equipe Argentina de Antropologia Forense  - Foto: Equipe Argentina de Antropologia Forense / divulgação

Em 4 de junho de 1976, os argentinos Oscar San Pedro e Walter Zaporta foram presos e passaram a engrossar a lista de desaparecidos da última ditadura argentina (1976-1983). Ambos eram motoristas de ônibus e militavam num sindicato. Até agora, a principal suspeita das famílias era de que tinham sido queimados vivos.

Esse e vários outros casos considerados como “morte violenta” pela Justiça argentina foram reabertos nos últimos meses, com o intuito de confirmar o que de fato aconteceu com tantos desaparecidos sobre os quais ainda existem dúvidas.

No caso de Zaporta, a resposta foi encontrada graças a uma mecha de cabelo. A família de San Pedro continua em busca de respostas.

De acordo com Carlos Vullo, diretor do Laboratório de Genética Forense da Equipe Argentina de Antropologia Forense, a mecha de cabelo de Zaporta foi encontrada em um envelope que apareceu quando foi reaberto o expediente judicial.

— Não tínhamos muitas expectativas, mas entre os cabelos encontramos algo que identificamos como sangue seco. Foi uma surpresa, e nos permitiu confirmar uma das identidades comparando com o DNA de um familiar — explica Carlos Vullo, diretor do Laboratório de Genética Forense da Equipe Argentina de Antropologia Forense, referindo-se a material doado pelo filho.

— A família nunca teve acesso a seus restos, não tinha nada. Agora sabe que tem certeza absoluta sobre como ele morreu.

Segundo explicou Vullo, até agora as investigações tinham sido feitas com restos do esqueleto dos desaparecidos, sendo esta a primeira vez em que foi usamos uma mecha para este fim.

Sua equipe já ajudou a identificar mais de 800 desaparecidos da ditadura argentina e foi convocada para colaborar em investigações em outros países da região, entre eles México e Colômbia. Assim, assegura Vullo, a experiência bem-sucedida pode ser “um bom precedente para pesquisas em outros países”.

Os corpos apareceram carbonizados uma semana após o sequestro, na província de Buenos Aires. A suspeita de que poderiam ser San Pedro e Walter Zaporta existiu desde um primeiro momento, mas faltava confirmação.

A Promotoria de Direitos Humanos da cidade de La Plata, capital da província de Buenos Aires, em parceria com o Departamento Histórico Judicial da Corte Suprema, a Procuradoria de Crimes Contra a Humanidade (PCCH) e a Junta de Pessoas Libertadas, encontrou a mecha de cabelo em um envelope dentro de um processo que havia sido iniciado uma semana após a descoberta dos corpos.

Após quase 50 anos do assassinato, o trabalho dos investigadores não foi simples. A sorte da equipe, comentou Vullo, foi ter encontrado na mecha de cabelo o material aderido.

Vullo disse que "ficamos agradavelmente surpresos por ter obtido o resultado e por ter ultrapassado os limites de certeza que estabelecemos para identificar uma pessoa desaparecida”.

A descoberta acontece em momentos em que o governo do presidente Javier Milei defende a reabertura de processos sobre vítimas de grupos guerrilheiros que atuaram no país nos anos 70 e 80.

Na prática, como era esperado, trata-se da tentativa, em palavras da vice-presidente Victoria Villaruel, de “contar a história completa, e não apenas uma parte dela”.

Muitos familiares de guerrilheiros mortos durante a ditadura foram indenizados pelo Estado argentino, decisão que o governo Milei também pretende rever.

— Reabriremos todos os casos de vítimas do terrorismo para que a Justiça possa fazer o que deveria ter feito há mais de 20 anos — declarou a vice argentina, acusando especialmente ex-membros do grupo Montoneros, braço armado do do peronismo de esquerda. — Todos os Montoneros devem ser presos por sangrar a nossa nação — frisou Villarruel.

Até agora, a Justiça rejeitou tentativas de reabertura desses casos, argumentando que não se tratavam de crimes contra a Humanidade e, portanto, já prescreveram.

Recentemente, a vice argentina, filha de um militar, convocou um evento para celebrar o Dia Internacional de Comemoração das Vítimas do Terrorismo.

Villarruel não deu detalhes sobre como avançará com sua iniciativa — nem se tem o apoio do presidente. Milei já defendeu várias vezes a necessidade de rever a História recente da Argentina, mas não se pronunciou sobre a proposta de sua vice, com a qual mantém uma relação tensa.

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