Logo Folha de Pernambuco

justiça

Justiça Militar autoriza PM a apreender armas e objetos após mortes em decorrência de ação policial

O magistrado considerou inconstitucional ato do governo de São Paulo, de 2015, que padroniza a atuação das corporações visando a evitar abusos e controlar a letalidade

MuniçãoMunição - Foto: Pixabay

Em meio ao recorde de letalidade policial no estado, o Tribunal de Justiça Militar de São Paulo (TJM-SP) decidiu permitir que oficiais da Polícia Militar apreendam armas e objetos em ocorrências com morte, inclusive em casos decorrentes de intervenção policial. Até agora, em uma cena de crime, cabia aos agentes apenas preservar o local até a chegada de um delegado.

A sentença do juiz militar Ronaldo João Roth, da 1ª Auditoria Militar, assinada em 8 de julho, acata pedido de habeas corpus coletivo da associação de oficiais Defenda PM, que tem no rol de funções advogar para agentes envolvidos em mortes durante operações.

O magistrado considerou inconstitucional ato do governo de São Paulo, de 2015, que padroniza a atuação das corporações visando a evitar abusos e controlar a letalidade.

A Resolução 40 da Secretaria de Segurança Pública (SSP) estabelece que, em caso de homicídio tanto de agentes quanto de civis durante uma ocorrência, os policiais devem preservar o local do crime até a chegada do delegado e "providenciar para que não se alterem o estado e a conservação das coisas para a realização de perícia".

 



O fato também deve ser comunicado imediatamente aos comandantes de área, à Corregedoria e ao Ministério Público. O policial que não obedece a tal determinação pode responder por crime funcional, usurpação da função pública, abuso de autoridade ou fraude processual.

Em junho, o subcomandante-geral da PM, coronel Marcus Vinícius Valério, determinou em despacho que os oficiais da PMs obedecessem à norma da SSP.

O estado, sob gestão de João Doria (PSDB), vem batendo recordes de letalidade policial, e multiplicam-se as denúncias de abusos. O número de mortes causadas por agentes teve a quarta alta neste ano e chegou a 442 casos. Abril foi o mês mais letal desde o início da série histórica, em 2001, com 116 casos. As ocorrências envolvendo policiais superam os registros de homicídios dolosos da capital paulista em 2020.

O juiz Roth avaliou que, aplicada a inquéritos militares, a Resolução 40 seria "inconstitucional" e "abusiva" e colocaria os PMs sob "constrangimento ilegal".

O magistrado argumenta na decisão que o Código de Processo Penal Militar prevê apreensão de "instrumentos e todos os objetos que tenham relação com o fato", e, portanto, não seria possível cumprir a legislação militar, o despacho e a norma da SSP ao mesmo tempo.

Roth cita o parágrafo 4º do artigo 144 da Constituição Federal: "Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares".

Ele considera que a PM deve apurar os crimes de homicídio doloso contra civil, quando praticado por agentes da corporação. Hoje, Polícia Civil é responsável por instaurar inquérito e cabe à Corregedoria apurar infrações disciplinares ou crimes militares.

Pela legislação brasileira, os crimes praticados contra a vida devem ser julgados pela Justiça comum, mesmo se o autor for militar. A única exceção é para membros das Forças Armadas que se envolvam em ocorrência com morte durante ações de GLO (Garantia da Lei e da Ordem).

Ainda assim, Roth afirma na decisão que, "à luz da Constituição Federal", a Polícia Civil "não pode apurar crime militar, como ocorre com os casos de homicídio doloso contra civil quando praticado por policial militar".

A sentença provocou reação de entidade da Polícia Civil, que vê tentativa de dificultar investigação de casos. O Ministério Público de São Paulo também recorreu da decisão.

Na sexta-feira (10), a Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (Adpesp) entrou com três ações contra a sentença pedindo a revogação do habeas corpus e questionando a competência técnica de um juiz de primeiro grau para decidir sobre o tema. Os pedidos ainda não foram julgados.

Para o presidente da entidade, o delegado Gustavo Mesquita, a atribuição de colher provas é da Polícia Civil para que os crimes "não sejam praticados e investigados pelos próprios pares, garantindo isenção e imparcialidade".

Com a decisão, "quando o delegado chegar, os objetos já terão sido recolhidos pelos PMs. As investigações serão obstaculizadas. Estão subvertendo a lógica justamente no momento em que a gente assiste à escalada de mortes em decorrência de ação policial", diz Mesquita.

O Ministério Público afirma que não concorda com a sentença e que entrou com recurso contra a decisão. "O juiz militar não tem competência para se insurgir contra uma resolução do Secretário de Segurança Pública e sobre matéria relativa às funções da Polícia Civil", disse, em nota. A promotoria considera ainda que a resolução 40 da SSP é "constitucional".

Já a SSP afirmou em nota que "avalia a adoção das medidas jurídicas cabíveis em relação à decisão".

Veja também

Ucrânia pede sistemas de defesa para enfrentar novos mísseis russos
Ucrânia

Ucrânia pede sistemas de defesa para enfrentar novos mísseis russos

Hospitais de Gaza em risco por falta de combustível
Gaza

Hospitais de Gaza em risco por falta de combustível

Newsletter