Lei que liberta "sem querer" criminosos sexuais encurrala o governo espanhol
Na Espanha, as novas leis podem ser aplicadas retroativamente se isso beneficiar o preso, por isso a enxurrada de pedidos de revisão
Apresentada como um avanço na luta contra a violência sexual contra as mulheres, os primeiros passos na Espanha de uma nova lei do governo de esquerda resultaram inesperadamente em solturas, redução de penas e uma polêmica colossal.
Desde que os primeiros casos foram conhecidos, na terça-feira (15), já foram quase quinze os condenados que tiveram suas penas reduzidas, dos quais 4 foram libertados, segundo a imprensa espanhola.
Entre eles, um homem que abusou sexualmente da enteada menor de idade, cuja pena foi reduzida de 8 para 6 anos de prisão, ou um professor que manteve relações sexuais com alunos adolescentes em troca de drogas, e que recebeu redução de seis anos gratuitamente. Ao mesmo tempo, muitas outras demandas foram rejeitadas.
A "Lei de Garantia Integral da Liberdade Sexual", que entrou em vigor em outubro, foi apresentada como uma conquista do setor mais feminista do governo de coalizão de Pedro Sánchez, especificamente da ministra da Igualdade, Irene Montero, do partido Podemos.
Essa nova lei fortaleceu o arsenal legal contra o estupro, eliminando os "abusos" mais brandos e integrando todos os crimes sexuais na categoria de "agressões". Em troca, e para que houvesse proporcionalidade, as faixas de penalidade foram modificadas.
Leia também
• Mulher é presa por envenenar o marido com croquete psicotrópico
• Espanha e Alemanha anunciam planos para treinar tropas ucranianas
• Astronautas treinam em vulcão das Canárias, na Espanha
Sendo assim, embora as penas para crimes como estupros coletivos ficassem mais rígidas, todos os condenados por agressão sexual com pena mínima de oito anos a viram reduzida para seis.
Por exemplo, o Tribunal Superior de Justiça da Andaluzia justificou a redução da pena porque, com a nova lei, a pena aplicada é "a mesma no limite máximo, mas dois anos e meio a menos no mínimo".
"Machismo"
Para a ministra Irene Montero, "o problema que temos é que há juízes que infringem a lei" por "machismo", disse à imprensa, defendendo melhorar sua "formação".
O Conselho Geral da Magistratura Judicial (CGPJ), em representação dos juízes, manifestou o seu "mais firme repúdio" a estes "ataques intoleráveis".
Na Espanha, as novas leis podem ser aplicadas retroativamente se isso beneficiar o preso, por isso a enxurrada de pedidos de revisão de sentenças.
Alterar a lei agora não aboliria as revisões já feitas, precisamente porque as leis que endurecem as penas não se aplicam retroativamente.
A maior ameaça que paira sobre a reputação da nova lei seria que ela acabasse servindo para reduzir as penas do caso que a inspirou, conhecido como "La Manada", quando cinco homens estupraram uma jovem de 18 anos nas festividades de São Firmino, em Pamplona, e foram inicialmente condenados por abuso sexual, provocando protestos por todo o país. Depois, o Supremo Tribunal acabou condenando-os por estupro.
O advogado de "La Manada" já anunciou que vai pedir a redução da pena de um dos cinco homens.
A um ano das eleições gerais, Pedro Sánchez defendeu a lei na quarta-feira (16), lembrando que o seu propósito era "dar às mulheres mais garantias contra qualquer tipo de agressão sexual", mas a ala socialista do seu governo o convidou a refletir e criticou a resposta de seu parceiro, o Podemos.
O principal partido da oposição, o Partido Popular, acusou "Sánchez, Irene Montero e o resto do Governo" de serem "responsáveis por colocar em risco as vítimas e a sociedade, que assumam suas responsabilidades", afirmaram.