Longa investigação, agência europeia descarta ligação entre pensamentos suicidas e Ozempic
Análise teve início ainda em julho do ano passado após relatos acenderem o alerta da autoridade de saúde irlandesa
A Agência Europeia de Medicamentos (EMA) concluiu uma investigação, que teve início ainda em julho do ano passado, sobre uma possível relação entre os análogos de GLP-1 – classe de medicamentos à qual pertence o Ozempic – e um risco aumentado de pensamentos suicidas ou de automutilação.
Após analisar as evidências disponíveis, o Comitê de Avaliação de Risco de Farmacovigilância (PRAC) da agência descartou uma suposta ligação. A classe de remédios avaliada, que engloba ainda nomes como Wegovy, Mounjaro, Victoza, Trulicity e Saxenda, é utilizada amplamente no tratamento da diabetes tipo 2 e da obesidade.
“Após analisar as evidências disponíveis de estudos não clínicos, ensaios clínicos, dados de vigilância pós-comercialização e os estudos disponíveis, o PRAC considera que não é necessária nenhuma atualização das informações sobre o produto”, diz o comitê em nota.
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“Os detentores da autorização de comercialização desses medicamentos continuarão a monitorar esses eventos de perto, incluindo quaisquer novas publicações, como parte de suas atividades de farmacovigilância, e notificarão quaisquer novas evidências sobre esse assunto”, continua.
Segundo a EMA, a investigação foi desencadeada após a agência de medicamentos irlandesa identificar os primeiros relatos de pensamentos suicidas e automutilação em indivíduos que faziam uso da semaglutida, substância do Ozempic e do Wegovy, e da liraglutida, princípio ativo do Victoza e do Saxenda.
“Até agora, as autoridades recuperaram e estão analisando cerca de 150 relatos de possíveis casos de automutilação e pensamentos suicidas”, disse a agência na época, mas pontuando que a presença de uma queixa “não significa necessariamente que um medicamento tenha causado o evento adverso em questão”.
Em outubro do ano passado, um levantamento do GLOBO com base em dados do sistema de notificação de eventos adversos da FDA, nos Estados Unidos, mostrou que desde 2010 a agência americana também tinha recebido relatos semelhantes, ao menos 273.
No entanto, esse monitoramento não é incomum e faz parte da chamada vigilância pós- comercialização, em que autoridades de saúde acompanham todos os relatos possivelmente atribuíveis a um remédio para garantir a sua segurança. Porém, apenas uma análise como a conduzida pela EMA responde se de fato o medicamento causou aquela queixa.
A avaliação europeia tinha previsão para terminar ainda em novembro do ano passado, mas foi estendida após a autarquia demandar novos dados às farmacêuticas. Para concluir que não há relação entre os análogos de GLP-1 e os pensamentos suicidas, o órgão afirma ter analisado uma série de evidências além dos relatos.
Uma delas foi um estudo conduzido por pesquisadores da Escola de Medicina Case Western Reserve, nos Estados Unidos, publicado em janeiro deste ano na revista científica Nature Medicine. Os responsáveis examinaram cerca de 2 milhões de pacientes que faziam uso dos análogos de GLP-1, para diabetes ou para obesidade.
O risco de pensamentos suicidas no grupo foi comparado durante seis meses ao observado em indivíduos que faziam uso de outras medicações mais antigas para as duas doenças. Não apenas o risco não foi aumentado, como na verdade os pesquisadores constataram uma incidência menor dos relatos entre aqueles que utilizavam os análogos de GLP-1.
"A explosão de popularidade desses medicamentos torna imperativo entender todas as suas possíveis complicações. É importante saber que as sugestões anteriores de que eles poderiam desencadear pensamentos suicidas não se confirmaram nessa população muito grande e diversificada dos EUA”, disse Pamela B. Davis, professora da Case Western Reserve, em comunicado.
Além disso, a EMA também diz ter conduzido um estudo próprio, com base em registros eletrônicos de saúde, que avaliou o risco de eventos relacionados ao suicídio e à automutilação em pessoas com diabetes tipo 2. Os resultados também “não apoiaram uma associação causal entre o uso de agonistas do receptor de GLP-1 e esse risco”, afirma.