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ESTADOS UNIDOS

Luigi Mangione, suspeito de matar CEO, abandonou uma vida de privilégios e promessas

Jovem de 26 anos era graduado em tecnologia da Ivy League, de uma família proeminente de Maryland e que, nos últimos meses, sofreu dores físicas e psicológicas

Luigi Mangione posa com parentes, integrantes de clã renomado em Baltimore Luigi Mangione posa com parentes, integrantes de clã renomado em Baltimore  - Foto: Instagram / mscm128

A versão online de Luigi Mangione, de 26 anos, que a polícia acredita que seja o atirador mascarado que calmamente sacou uma pistola com silenciador na calçada de Manhattan na semana passada e assassinou Brian Thompson, CEO da UnitedHealthcare, era um entusiasta de tecnologia formado pela Ivy League (oito das universidades mais prestigiadas dos Estados Unidos) que exibia sua aparência bronzeada e definida em fotos de praia e festas com amigos de fraternidade vestindo blazers azuis.

Ele foi o orador da turma de uma prestigiada escola preparatória em Baltimore, formou-se com bacharelado e mestrado na Universidade da Pensilvânia e atuou como conselheiro-chefe em um programa pré-universitário na Universidade Stanford, na Califórnia. Com suas credenciais e conexões, ele poderia ter se tornado empreendedor ou CEO de um dos prósperos negócios da família. Em vez disso, escolheu um caminho diferente.

 

Mangione foi preso em Altoona, Pensilvânia, na segunda-feira, depois que um funcionário do McDonald's o reconheceu e chamou a polícia. Os oficiais disseram ter encontrado com ele uma identificação falsa, uma arma semelhante à vista no vídeo do assassinato e um manifesto condenando a indústria de saúde. Ele foi posteriormente acusado de homicídio, além de falsificação e posse ilegal de armas.

Antes de uma audiência de extradição na Pensilvânia, na terça-feira, Mangione tentou resistir aos oficiais que o conduziam à entrada do tribunal e gritou para os repórteres: “Isso é completamente fora de contexto e um insulto à inteligência do povo americano”, embora não tenha ficado claro a que ele se referia.

Seu advogado informou ao tribunal que Mangione contestaria sua extradição para Nova York para enfrentar as acusações de homicídio. Nas horas após sua captura, começou a surgir uma visão de sua jornada desconcertante de aluno exemplar a suspeito de assassinato.

Corte de comunicação
Mangione mantinha contato regular com amigos e familiares até cerca de seis meses atrás, quando, de forma repentina e inexplicável, parou de se comunicar. Ele sofria de uma dolorosa lesão nas costas, disseram amigos, e então desapareceu, levando parentes a fazerem perguntas ansiosas aos amigos: alguém havia ouvido falar dele?

Em julho, um homem marcou uma conta de mídia social que parecia ser de Mangione e disse que não ouvia notícias dele há meses. “Você assumiu compromissos para o meu casamento e, se não puder cumpri-los, preciso saber para planejar adequadamente”, escreveu o homem em uma publicação posteriormente excluída.

Esses seis meses provavelmente se tornarão o foco dos investigadores enquanto tentam reunir mais evidências sobre a conexão de Mangione com o assassinato e o que ele fazia durante o tempo em que ninguém conseguiu encontrá-lo.

Mangione deixou postagens sobre autodesenvolvimento, alimentação saudável e tecnologia — e uma resenha do manifesto do Unabomber. Cartuchos encontrados na cena, com palavras como “atraso” e “negar” escritas neles, levantaram a hipótese de que o ataque foi uma vingança contra seguradoras de saúde por rejeitarem reivindicações.

No comunicado de três páginas que Mangione carregava quando foi preso, ele descreveu o assassinato como um “ataque simbólico”, de acordo com um relatório policial interno obtido pelo The New York Times. O texto caracterizou o assassinato como um desafio direto à “suposta corrupção e ‘jogos de poder’” da indústria de saúde, e os investigadores disseram no relatório que o suspeito “provavelmente se vê como uma espécie de herói” que decidiu agir.

Após o ataque, as redes sociais se encheram de ressentimento contra o setor de seguros, e o suspeito não identificado tornou-se, para alguns, um herói popular.

Família influente
Mangione veio de uma criação privilegiada, parte de uma influente família do setor imobiliário na região de Baltimore. Seus avós, Nick Mangione Sr. e Mary C. Mangione, compraram o clube de campo Turf Valley em Ellicott City, Maryland, nos anos 1970 e desenvolveram a comunidade em torno do campo de golfe.

Nos anos 1980, a família adquiriu o Hayfields Country Club em Hunt Valley, Maryland. Também fundou a empresa de casas de repouso Lorien Health Services, e o pai de Mangione, Louis Mangione, tornou-se proprietário. A família também era dona da estação de rádio WCBM, que transmite programas politicamente conservadores, e possuía outros imóveis. Um primo, Nino Mangione, é membro eleito da Câmara dos Deputados Estaduais de Maryland.

A riqueza da família e seu trabalho filantrópico tornaram-na conhecida em Baltimore. Luigi Mangione era “simplesmente a última pessoa que você suspeitaria”, disse Thomas J. Maronick Jr., advogado e apresentador de rádio que conhece vários membros da família Mangione.

— É simplesmente uma família tão respeitada e proeminente no condado de Baltimore — disse ele.

Luigi Mangione frequentou a escola Gilman, uma renomada escola em Baltimore, onde lutava e praticava outros esportes e foi o orador da turma de 2016. Em um discurso de formatura, ele descreveu sua turma como “trazendo novas ideias e desafiando o mundo ao seu redor”.

Ele agradeceu aos pais presentes por enviarem a ele e seus colegas para a escola, que ele descreveu como “longe de ser um pequeno investimento financeiro”. Atualmente, a mensalidade custa US$ 37.690 por ano para o ensino médio.

Aaron Cranston, que se tornou amigo de Mangione durante o tempo na Gilman, disse lembrar dele como particularmente inteligente — talvez o mais inteligente da elite escola particular. Mesmo antes da faculdade, Mangione já havia criado um aplicativo em que os usuários podiam pilotar um avião de papel por obstáculos.

Mangione era social, amigável e nunca particularmente político, lembrou Cranston. Ele era ambicioso e levava seu interesse pela ciência da computação para a faculdade.

— Ele acreditava muito no poder da tecnologia para mudar o mundo — disse Cranston.

Race Saunders, 27, agora desenvolvedor de software na Califórnia, lembrou-se de ser “companheiro de estudos” de Mangione no ensino médio. Ele o recorda como um trabalhador esforçado.

— Estávamos todos definitivamente inclinados para a ciência da computação — disse Saunders.

Na faculdade, Mangione destacou-se na área. O programa de formatura da classe de 2020 da Universidade da Pensilvânia lista Mangione como membro da Eta Kappa Nu, uma sociedade de honra acadêmica para estudantes de engenharia elétrica e de computação. A sociedade é seletiva, convidando apenas o quarto superior da turma de terceiro ano e o terço superior da turma de quarto ano desses cursos para adesão, segundo seu site.

Após a faculdade, Mangione trabalhou ou fez estágios em várias empresas de tecnologia, de acordo com seu perfil no LinkedIn e um ex-empregador.

O perfil de Mangione dizia que ele havia trabalhado como engenheiro de software na TrueCar, um marketplace online com sede em Santa Mônica, Califórnia. A empresa afirmou em comunicado que ele não era funcionário desde 2023. Nos últimos anos, Mangione morou por seis meses em Honolulu em um espaço de “co-living” chamado Surfbreak, voltado para trabalhadores remotos.

Manifesto
Por meio de uma série de postagens, a trilha de Mangione na internet sugeria dores tanto físicas quanto filosóficas. Em janeiro, Mangione deixou uma resenha de um livro contendo o manifesto de Ted Kaczynski, o Unabomber, no Goodreads, uma rede social para leitores.

“É fácil descartar rapidamente e sem pensar isso como o manifesto de um lunático, para evitar enfrentar alguns dos problemas desconfortáveis que ele identifica”, escreveu Mangione sobre o documento. “Mas é simplesmente impossível ignorar como muitas de suas previsões sobre a sociedade moderna se tornaram prescientes.”

Uma das citações favoritas de Mangione, listada no Goodreads, era: “Não é sinal de saúde estar bem ajustado a uma sociedade profundamente doente”, de Jiddu Krishnamurti, um filósofo e professor religioso. A página do Goodreads também incluía livros de autoajuda sobre saúde e o corpo humano.

Uma conta de mídia social que parecia pertencer a Mangione apresentava uma imagem de raio-x de uma coluna vertebral reforçada com implantes cirúrgicos. O raio-x mostrava uma fusão espinhal, procedimento que usa parafusos e hastes para fundir dois níveis da coluna para corrigir um desalinhamento que pode causar dores sérias, segundo Hasit Mehta, professor do New York Medical College.

Por ora, os investigadores buscarão mais pistas que possam ligar Mangione ao ataque. O comunicado recuperado durante sua prisão parece fornecer alguns insights. O documento manuscrito de 262 palavras observa que, à medida que a capitalização de mercado da UnitedHealthcare cresceu, a expectativa de vida dos americanos não cresceu.

“Para poupar uma investigação longa, afirmo claramente que não trabalhava com ninguém”, escreveu o autor, segundo autoridades. A nota condenou empresas que “continuam a explorar nosso país para obter lucros imensos porque o público americano permitiu que elas fizessem isso.” Acrescentou: “Francamente, esses parasitas simplesmente mereceram isso.”

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