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Maduro seria deposto se decidisse invadir a Guiana, acreditam auxiliares de Lula

Integrantes do governo brasileiro não acreditam em 'aventura militar' da Venezuela e esperam que assunto seja esquecido

Maduro e Lula em BrasíliaMaduro e Lula em Brasília - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A comitiva brasileira chefiada pelo assessor especial da Presidência, Celso Amorim, ainda estava no avião, a caminho de São Vicente e Granadinas, quando o debate sobre a missão diplomática foi iniciado.

O que seria considerado um sucesso para o encontro entre Venezuela e Guiana? Em tom bem-humorado, e levando em consideração a escalada retórica, um dos integrantes afirmou que uma foto de Nicolás Maduro no aeroporto do país já seria o suficiente.

No decorrer das reuniões, porém, a realidade foi outra, bem mais favorável ao Brasil, que buscava diminuir as tensões. Pressionado, o presidente venezuelano assinou um compromisso, junto ao governo de Georgetown, de renunciar a qualquer uso da força.

Após participar do papel de mediação, auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula da Silva entendem que Maduro enxergou o momento como uma forma de "descer da árvore" sem a possibilidade de cair. Sem acreditar numa "aventura militar", o Palácio do Planalto avalia que a concretização das ameaças, ou seja, a invasão da Guiana para tomar o Essequibo, seria o fim do presidente, com a consequente deposição.

O cenário poderia ser agravado por um processo convulsivo do chavismo e resultar num isolamento ainda maior da Venezuela no mundo. Durante as reuniões da manhã em Kingstown, em São Vicente e Granadinas, e até mesmo em negociações precedentes, houve um alinhamento dos países do Caribe, que formam a Caricom, para conter as pretensões de Maduro.

O mesmo também ocorreu com a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), presidida por São Vicente e Granadinas. Embora Maduro tenha saído do encontro se declarando vencedor, como se fosse um arauto da "paz", o que se percebeu foi o robustecimento do alinhamento diplomático contra a violação da soberania da Guiana. Houve até mesmo a indisposição de Cuba, um país aliado da Venezuela. Isso sem contar o declarado apoio militar dos Estados Unidos ao presidente do país vizinho, Irfaan Ali.
 

No dia do encontro, por volta das 17h, os países que acompanharam a reunião começaram a rascunhar os parágrafos dos pontos da declaração entre os dois países. Os tópicos foram sendo, aos poucos, sedimentados, com ajustes reivindicados de parte a parte. O Brasil sugeriu, assim como outros países, a inclusão do compromisso de não haver uso da força.

Como informou O Globo, desde o primeiro momento o objetivo do Brasil era baixar a temperatura da crise, o que de fato ocorreu com a realização da reunião e, sobretudo, com elaboração do documento em Kingstown.

Deixar o assunto esfriar
No Palácio do Planalto, olhando em retrospecto as semanas de intenso esforço diplomático, o caminho a ser perseguido continua a ser esse. Para a segunda rodada de conversas, que ocorrerá no Brasil em três meses, é importante a continuidade o diálogo.

No longo prazo, a ideia é "embalar o assunto e deixar quieto" — ou seja, esperar até que a Venezuela pare de reivindicar o território do país vizinho com ameaças.

O governo sabe, porém, que o assunto pode e deve retornar à pauta às vésperas das eleições presidenciais venezuelanas, marcadas para 2024. No estudo de caso da disputa territorial, a diplomacia brasileira entende que a Guiana tem mais "lastro" histórico e documental para defender o território de Essequibo, embora haja dúvidas sobre a seriedade da arbitragem de 1899, que definiu as fronteiras atuais.

Desde o princípio da escalada das tensões, que culminou com a tentativa de anexar Essequibo por decreto, o Brasil tentou pressionar Maduro a recuar. Neste sentido, as iniciativas mais importantes foram a declaração dos países do Mercosul para evitar atos "unilaterais", o telefonema de Lula a Maduro e o agendamento da reunião em São Vicente e Granadinas.

Brasil quer que Maduro aceite opositora
Agora, há um novo caminho a ser trilhado pelo governo do petista, em uma frente paralela. É a tentativa de levar adiante o reconhecimento internacional das eleições presidenciais venezuelanas, bem como a garantia do relaxamento às sanções impostas ao regime chavista.

No momento, a diplomacia americana pressiona para que Caracas aceite a candidatura de María Corina Machado, que venceu as primárias da oposição, mas foi tornada inelegível pelo regime chavista. O Brasil, contudo, é cético na possibilidade de que Maduro seja flexível em relação à adversária e já começa a trabalhar com a possibilidade de outros grupos de oposição participarem do pleito.

Na visão do Brasil, a recuperação da institucionalidade da Venezuela precisa ser acompanhada em "dois tempos", ou seja, nos processos eleitorais de 2024 e 2025. No segundo ano, serão escolhidos candidatos aos governos nos estados e à Assembleia Nacional. Neste sentido, é um acompanhamento que será feito aos poucos.

Para continuar a monitorar a crise de Essequibo e o processo eleitoral, será importante a recomposição na embaixada em Caracas. Na semana passada, o Senado aprovou a indicação de Glivânia Maria de Oliveira para o cargo de embaixadora do Brasil na Venezuela, cargo que estava vago desde que o ex-presidente Jair Bolsonaro rompeu relações com Maduro.

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