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Maior inimigo de Israel, Hamas agradece ao Estado judeu pela ajuda na sua criação

Para frear a atuação do Fatah, que funcionava como coração da OLP, Israel permitiu ativamente a ascensão do grupo extremista

Palestinos exibem bandeira do Hamas durante as orações de sexta-feira, diante da Mesquita do Domo da Rocha, em JerusalémPalestinos exibem bandeira do Hamas durante as orações de sexta-feira, diante da Mesquita do Domo da Rocha, em Jerusalém - Foto: Ahmad Gharabli / AFP

Sob a justificativa de “pôr fim a todos os crimes da ocupação”, o grupo terrorista Hamas lançou, no sábado (7), mais de 5 mil foguetes contra Israel da Faixa de Gaza. Na outra ponta, a contra-ofensiva dura do Estado judeu para desintegrar os terroristas, entre elas, um “cerco total”, uma estratégia “em conformidade”, porque estavam lutando “contra animais”, segundo o ministro da Defesa Yoav Gallant.

O conflito armado, que já matou quase 3 mil pessoas e feriu mais de 4 mil até esta terça-feira (10), expõe a profunda animosidade entre Hamas e Israel, mas também esconde uma relação impensável na atualidade — o grupo terrorista, até certo ponto, agradece ao Estado israelense pela sua existência.

Durante a primeira intifada (em árabe, a palavra significa "agitação".) ou levante em Gaza, em 1987, o Hamas lançou uma carta de repúdio aos judeus e se recusou a aceitar a existência do Estado de Israel. Na época, o levante começou depois que um caminhão militar de Israel atingiu carros que levavam palestinos que voltavam do trabalho para a Faixa de Gaza, matando quatro pessoas.

Hamas, em árabe, é um acrônimo para Movimento de Resistência Islâmica. O grupo atuava junto à Irmandade Muçulmana, a organização islâmica fundada no Egito. Mas, ainda assim, por mais de uma década, autoridades israelenses permitiram ativamente a sua ascensão.

Na época, o principal inimigo de Israel era o partido Fatah, do falecido Yasser Arafat, que funcionava como o coração da Organização de Libertação da Palestina (OLP), que abrange vários partidos políticos palestinos.

O Fatah foi fundado no Kuwait, em 1959, após o êxodo palestino conhecido como Nakba. Seu nome significa “conquistar” e é um acrônimo para Movimento de Libertação Nacional da Palestina.

O grupo era secular, ou seja, livre de dogmas religiosos, e inspirou outros movimentos guerrilheiros esquerdistas revolucionários que travaram insurreições em outras partes do mundo durante a Guerra Fria.

A OLP, criada em 1964, realizou assassinatos, sequestros e, embora reconhecida por países vizinhos árabes, foi considerada uma entidade terrorista por Israel, e agentes nos territórios ocupados enfrentaram repressão brutal nas mãos do Estado a da segurança israelense.

Enquanto isso, as atividades de islamistas afiliados à Irmandade Muçulmana do Egito foram autorizadas a céu aberto na Faixa de Gaza — uma mudança radical comparada à época de quando o território palestino foi administrado pelo governo egípcio de Gamal Abdel Nasser. O Egito perdeu o controle da Faixa de Gaza para Israel depois da Guerra dos Seis Dias, em 1967, e viu o vizinho se apoderar da Cisjordânia. Os israelenses enxergaram nos partidários da Irmandade Muçulmana um contrapeso útil para a OLP de Arafat.

"Quando olho para trás, para a cadeia de eventos, acho que cometemos um erro" disse um funcionário do governo israelense que havia trabalhado em Gaza em 1980, em uma entrevista de 2009 para o jornal americano Wall Street Journal. "Mas na época ninguém pensou sobre os possíveis resultados".

Israel começou a apoiar o clérigo Sheikh Yassin, que montou uma ampla rede de escolas, clínicas e biblioteca. Yassin formou o grupo islâmico al-Islamiya Mujama, oficialmente reconhecido pelo governo israelense como uma instituição de caridade e, em seguida, em 1979, como uma associação. O país também aprovou a criação da Universidade Islâmica de Gaza, que agora considera como um viveiro da militância. A universidade foi um dos primeiros alvos atingidos pelos aviões israelenses na Operação Chumbo Fundido, em 2008.

O grupo Mujama se tornaria o Hamas. Israel prendeu Yassin em 1984, condenando-o a uma sentença de 12 anos após a descoberta de esconderijos de armas escondidas, mas ele foi liberto um ano depois. Na época, os israelenses deveriam estar mais preocupados com outros inimigos.

Mais tarde, as mesas foram viradas; após os Acordos de Oslo em 1993, com o reconhecimento formal de Israel da OLP — que renunciou oficialmente à resistência armada e passou a atuar na ONU como representante do seu povo — e o início do que hoje conhecemos como o processo de paz, o Hamas virou inimigo dos israelenses.

O grupo islâmico se recusou a aceitar Israel ou renunciar à violência e se tornou talvez a principal instituição da resistência palestina à ocupação israelense. Muito além de ideologia religiosa, essa é a principal razão para sua popularidade em Gaza.

Yassin foi morto em um ataque aéreo israelense em 2004. Em 2007, depois de uma vitória eleitoral do Hamas, que irritou tanto o Ocidente quanto o Fatah, o grupo islâmico assumiu o poder na Faixa de Gaza. O fato levou aos rigorosos bloqueios israelenses e à piora do conflito, que mais uma vez se repete.

Para o especialista em Oriente Médio do Centro Woodrow Wilson, Aaron David Miller, o Hamas depende de “uma ideologia e estratégia rica em confronto e de resistência.”

"(São) dois partidos que não conseguem viver um com o outro. Ou aparentemente um sem o outro" afirmou Miller.

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