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Coronavirus

Mais de mil cidades têm problemas no abastecimento de oxigênio, diz balanço

Os dados são do Conasems, conselho que reúne secretários municipais de Saúde e começou a ser feito nas duas últimas semanas de março

Segundo levantamento, 87% dos municípios como principal a falta de estrutura de armazenamentoSegundo levantamento, 87% dos municípios como principal a falta de estrutura de armazenamento - Foto: MARCIO JAMES/AFP

Gestores de saúde de ao menos 1.068 municípios relataram, em um levantamento, preocupação sobre o estoque de cilindros de oxigênio e até mesmo risco de desabastecimento nos próximos dias se a curva de casos de Covid-19 se mantiver em alta e houver novos entraves junto a fornecedores.

Os dados são do Conasems, conselho que reúne secretários municipais de Saúde, e obtido pela reportagem.

Segundo o órgão, o total de municípios com dificuldades pode ser ainda maior, já que apenas uma parte respondeu ao questionário. Ao todo, gestores –como secretários, representantes de hospitais e de outras unidades de saúde que atendem pacientes de Covid– de 2.411 municípios enviaram dados.

O levantamento começou a ser feito nas duas últimas semanas de março, e terminou na terça-feira (6).

O maior impasse é a dependência de cilindros de oxigênio, modelo visto como de maior dificuldade de fornecimento –e apontado por 87% dos municípios como principal estrutura de armazenamento.

Os 1.068 municípios informaram haver risco de desabastecimento em ao menos uma unidade em até dez dias.

Segundo a assessora técnica do conselho, Blenda Pereira, isso indicaria que haveria possibilidade, em parte das cidades, de falta já nos próximos dias, já que algumas respostas vieram ainda no início do balanço. Em outras, o alerta persiste. "Vemos que é um problema nacional", afirmou.

Recentemente, no entanto, parte dos estados e o Ministério da Saúde adotaram medidas emergenciais para diminuir o risco de uma possível falta, como a distribuição de cilindros extras, o que amenizou a situação.

"Mas, como o número de pacientes ainda cresce, há risco", diz Mauro Junqueira, secretário-executivo do Conasems.

Segundo ele, ações recentes parecem ter ajudado a evitar um problema mais grave. "Ainda é um cenário preocupante, que temos de monitorar", afirma.

Avaliação semelhante tem Geraldo Reple Sobrinho, secretário de Saúde de São Bernardo do Campo, no ABC paulista e presidente do Cosems-SP, que reúne gestores municipais do estado.

"Já melhorou, mas ainda não está equacionado. Ainda há algumas regiões em situação crítica", afirma ele, segundo quem o último balanço feito pela entidade junto aos municípios apontava déficit de 2.578 cilindros.

"São Paulo tem uma grande capacidade de produção. O problema é a logística. Com aumento dos casos, as empresas precisam trocar os cilindros várias vezes. Imagina fazer isso a uma cidade a mais de 50 km [de distância]", diz.

O problema se repete em outros estados.

"Consumimos 300% a mais do que o normal. O ministério trouxe um carregamento de 340 cilindros, que distribuímos para as cidades em situação mais delicada. Mas a preocupação persiste, porque Mato Grosso tem território grande, e os municípios não conseguem ter estoque. Tem cidades a quase 800 km da distribuidora", afirma Marco Antônio Felipe, presidente do Cosems-MT.

Secretário de Saúde de Guarantã do Norte (MT), ele diz também sofrer com a distância –e com o impacto do aumento de casos. "Temos um hospital municipal com demanda, e estamos a 230 km do primeiro posto de abastecimento", relata.

No momento do balanço, a maior parte dos representantes disse ao Conasems que o município ainda conseguia fazer as compras, mas relatava aumento na demanda e dificuldades com fornecedores como pontos de preocupação.

No geral, frases como "tem dias que não há cilindros suficientes para serem abastecidos, e tem dias que o fornecedor não tem estoque de entrega" ou "há dificuldade de manter o estoque" foram enviadas junto às respostas.

O balanço teve adesão sobretudo de cidades de pequeno e médio porte. Entre as capitais que responderam, Macapá (AP) reportou dificuldades.

Segundo Ferreira, do Conasems, o levantamento foi enviado a todos os gestores para investigar a situação também em municípios sem leitos para Covid, mas que têm feito atendimentos por meio de unidades de saúde ou intermediárias.

As dificuldades foram relatadas em todos os estados, incluindo em cidades menores com atendimento apenas nestes locais. Como justificativa, diferentes cidades informaram alta demanda e necessidade de atender pacientes graves em salas adaptadas até que haja transferência para hospitais da região.

"Tivemos que montar alguns leitos em unidades básicas de saúde. E, do dia para a noite, nos vimos tendo que ter 10 a 20 cilindros à disposição", relata Felipe, do Cosems-MT, sobre a situação em cidades da região.

Em Capistrano (CE), com 17 mil habitantes, por exemplo, não há UTI e antes da pandemia havia cilindros de oxigênio para manter seus dois leitos de internação. Atualmente, são 15 internados, todos com necessidade de oxigênio.

Erika Medeiros, responsável por um hospital de pequeno porte na cidade cearense, disse à pesquisa que há o risco de o município "colapsar a qualquer momento". Sem cilindros, a prefeitura não tem estoque e diariamente busca oxigênio em Mossoró (RN), a 260 km, e Fortaleza, a 90 km.

Grazielle Resende, diretora do Hospital Municipal de Bom Jesus de Goiás, disse na pesquisa que o gasto de oxigênio aumentou de "forma extrapolada". "De fato não estamos conseguindo atender de forma eficaz e estamos amedrontados com o possível colapso do atendimento." A cidade tem 25 mil habitantes.

Segundo Resende, o hospital tem hoje cinco leitos com pacientes com Covid-19 e gasta mensalmente a quantidade utilizada durante todo o ano no período anterior à pandemia.

Apesar disso, para Junqueira, do Conasems, cidades menores estariam mais vulneráveis. Ele diz, contudo, ver sinais de melhora, que ainda precisam ser confirmados.

O balanço do conselho questionou também a falta de outros insumos. Os mais frequentes em baixo estoque foram luvas, máscaras e aventais. "Isso nos preocupou. Além da escassez de oxigênio, o abastecimento de EPIs [equipamentos de proteção individual] também pode estar prejudicado [em alguns locais]", diz Pereira, do Conasems. O conselho pretende aplicar nova fase de pesquisa para atualizar a situação.

Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que tem ajudado no transporte de cilindros de oxigênio para estados como Acre e Amapá. Mil cilindros também foram distribuídos a Mato Grosso, Rio Grande do Norte, Rondônia e Acre.

A pasta diz ainda ter requisitado mais 500 cilindros de oxigênio para atender outros estados monitorados com baixo nível do insumo. O ministério não informou quais seriam esses locais.

A pasta diz ainda que se prepara para receber 5.133 concentradores de oxigênio, equipamento usado na assistência a pacientes, que serão doados por empresas privadas e devem chegar até 14 de abril.

Sobre os baixos estoques de EPIs, como luvas e máscaras, afirmou que a aquisição desse material cabe aos estados e municípios, mas que fez uma compra de 345 milhões para distribuição "em razão da escassez".

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