Medo da violência faz Câmara do Rio liberar carros blindados para todos os vereadores que desejarem
Processo que orientou o aluguel da frota tem parecer da coordenadora de segurança da Câmara do Rio
O presidente da Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, Carlo Caiado (sem partido), decidiu nesta quarta-feira (3) autorizar o aluguel de carros blindados para todos os parlamentares que desejarem.
A decisão foi tomada depois de pelo menos cinco episódios de violência ocorridos nos últimos meses com integrantes da casa: Rosa Fernandes (PSC), Luciano Vieira (Avante), Verônica Costa (PL), Vitor Hugo (MDB) e Ulisses Marins (Republicanos). O Globo apurou que existe uma orientação recente da chefia da segurança da Câmara para que todos os integrantes da mesa diretora façam uso do benefício.
— A gente tem que preservar a vida dos vereadores. Veja o que aconteceu com a nossa amiga Marielle Franco. Talvez, se ela estivesse em um carro blindado poderia ter sobrevivido. Nos casos do Luciano Vieira e da Verônica atiraram nas janelas, na altura da cabeça. Não parece ter sido uma simples tentativa de assalto — justificou Caiado.
O presidente da Câmara acrescentou que tem recebido também diversos ofícios em que colegas relatam ameaças. A lista inclui, entre outros, Chico Alencar (PSOL), que é o relator do processo no Conselho de Ética contra Gabriel Monteiro, além de Celso Costa (Republicanos), Tarcísio Motta (PSOL), Monica Benício (PSOL) e William Siri (PS0L).
Mesmo antes da resolução, 13 vereadores já tinham autorização para usar blindados. Além deles, Carlos Bolsonaro (Republicanos) é atendido por intermédio da presidência da República, por ser filho do presidente Jair Bolsonaro.
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No despacho que autorizou a liberação dos carros, Caiado afirma que os vereadores no exercício do mandato ''em diversos locais da nossa cidade, muitas vezes contrariam os interesses do crime organizado que dominam esses locais'' e que ''cabe a esta casa legislativa prover os meios para que parlamentares exerçam seus mandatos com autonomia, independência e liberdade''.
O processo que orientou o aluguel da frota tem inclusive um parecer da coordenadora de segurança da Câmara do Rio, a delegada Izabela Santoni. Foi ela quem recomendou, por exemplo, que os integrantes da mesa utilizem carros blindados, confirmou Caiado.
— Muitos colegas têm enfrentado situações difíceis, está complicado. É fato que exercer o mandato deixa a gente exposto. E não temos certeza, nesses episódios, o que se tratou de fato de uma tentativa de assalto ou de um atentado — disse Tânia Bastos (Republicanos), vice-presidente da Câmara.
Para fazer uso do benefício foi criada uma nova verba de representação. A Câmara do Rio vai ressarcir em cerca de R$ 7,5 mil os gabinetes. A medida, em princípio, vale por seis meses.
Além dos episódios mais recentes, outros incidentes já ocorreram com vereadores quando se deslocavam pela cidade. Três deles morreram no exercício do mandato. Além de Marielle Franco (PSOL), morta a tiros no Estácio quando voltava de uma agenda em 2018, outro episódio ocorreu anos antes. Em 2004, Dr. Monteiro de Castro foi assassinado em uma tentativa de assalto na Avenida Brasil. Logo depois de perder a reeleição em 2018, Alberto Salles foi assassinado a tiros na Barra da Tijuca.
Em 2017, o vereador Dr. Gilberto (Podemos), que é policial civil, reagiu a tiros em uma tentativa de assalto na Avenida Brasil quando retornava da Câmara para casa. Um dos homens morreu e Gilberto feriu apenas a mão, sem gravidade.
Em julho, Veronica Costa (PL), que é candidata a deputada federal, teve o carro atingido por tiros também na Avenida Brasil, na altura de Fazenda Botafogo. Ela voltava de um ato de pré-campanha na Baixada Fluminense e acredita que só tenha escapado porque seu carro era blindado.
— Uso carro blindado desde que Marielle morreu naquela situação absurda. Não acho que meu caso tenha sido um simples assalto. Eram pelo menos oito homens armados que cercaram, tentaram abrir as portas e atiraram no meu carro — disse Verônica.
Segundo ela, outros veículos pararam no cerco dos bandidos e só o dela, onde estava com motorista e dois assessores, foi alvo:
— Meu carro ainda está em reparos. Estou circulando em um blindado emprestado por um amigo. Se tivesse morrido iam falar do caso uns dois meses. Depois seria esquecida — disse.
Ela adiantou que por já ter um veículo reformado não pretende pedir o benefício.
O incidente envolvendo Rosa Fernandes, que integra o Conselho de Ética, ocorreu no fim de junho. Por causa de ameaças, a parlamentar já tinha um blindado cedido pela Câmara do Rio.
O veículo foi atingido a tiros em Brás de Pina por integrantes de uma moto. Rosa não estava no carro. Ela acompanhava uma fiscalização da prefeitura numa rua próxima.
O primeiro vereador da atual legislatura a ser alvo de um ataque foi Vitor Hugo. O caso ocorreu em março de 2021, quando o carro em que estava com o filho, que hoje tem oito anos, foi cercado por bandidos em um dos acessos à Linha Amarela, em Pilares. Ele estava num blindado próprio.
— Imagens mostraram que os homens aguardavam a saída do condomínio onde morava na Zona Norte. Depois desse episódio, até me mudei. Escapei porque como o carro era blindado, o joguei em cima deles.
O vereador, que tem blindado próprio desde que foi secretário de Meio Ambiente de Duque de Caxias, diz que pretende pedir um dos carros oferecidos pela Câmara do Rio.
— Como se trata de algo oferecido a todos, vou solicitar. Manter um veículo blindado é muito oneroso — disse Vitor.
O caso envolvendo Luciano Vieira (Avante) ocorreu no fim de junho quando ele voltava de um ato de pré-campanha a deputado federal na Baixada Fluminense.
Dois tiros atingiram o vidro do motorista em um dos acessos a Barros Filho. Ele usava um blindado próprio e nada sofreu. Durante o ataque, Luciano chegou a contar aos colegas o que passava, por um aplicativo de mensagens:
— Blindado ajuda a proteger, mas a gente entrega na mão de Deus — disse o vereador. Ele acrescentou que continuará a usar o carro próprio.