Milei e sua possível boa relação com o FMI
Segundo especialistas, a relação entre o país e órgão deverá ser "fácil", já que o presidente promete ajustes maiores do que os pedidos pelo Fundo
Como será a relação entre a Argentina e o FMI com o ultraliberal Javier Milei? Difícil saber. Mas, segundo especialistas, o diálogo pode ser "relativamente fácil", já que ele promete ajustes maiores do que os pedidos pelo próprio Fundo.
A vitória desse economista ultraliberal de 53 anos nas eleições presidenciais argentinas no domingo foi como um tsunami em um país que mantém uma relação complicada com o Fundo Monetário Internacional (FMI), ao qual recorreu mais de 20 vezes em busca de recursos desde 1956.
Com uma inflação de mais de 140% ao ano e 40% da população vivendo na pobreza, Milei tem clareza de que sua prioridade é a economia, que espera endireitar cortando drasticamente os gastos públicos.
Durante os últimos meses, prometeu um ajuste "muito mais duro que o do Fundo", que define como um "mecanismo perverso que favorece os governos irresponsáveis".
"Fora dos trilhos"
Arturo Porzecanski, pesquisador do fórum Wilson Center de da American University, ambos em Washington, estima que "a tendência é tão ruim que justifica plenamente um ajuste maior", pelo menos a nível fiscal.
O programa de 44 bilhões de dólares entre a Argentina e o FMI "está fora dos trilhos, porque o governo sainte descumpriu seus objetivos fiscais e outros, em grande parte devido ao 'Plan Platita' de cortes tributários e gastos públicos extras realizados para tentar popularizar a candidatura" do ministro da Economia peronista, Sergio Massa, explicou Porzecanski à AFP.
Como consequência, "o mais provável é que o FMI não aprove" o próximo repasse, o que significa que o novo governo terá que buscar fundos para pagar o que deve ao organismo creditício, acrescentou.
No entanto, no momento, a situação ainda não está clara.
A vitória de Milei "cria incertezas, porque não se sabe exatamente o que fará", afirmou à AFP Claudio Loser, presidente da consultora Centennial America Latina e ex-diretor do Departamento do FMI para as Américas. "O importante é formular os detalhes de seu programa", acrescentou.
Na segunda-feira, a diretora-geral do FMI, Kristalina Georgieva, estendeu a mão a Milei, dizendo que espera "trabalhar estreitamente com ele" para "desenvolver e implementar um plano sólido para garantir a estabilidade econômica e fortalecer o crescimento inclusivo para todos os argentinos", em uma mensagem na rede social X (antigo Twitter).
O diálogo entre a instituição financeira e o presidente eleito "será relativamente fácil", opina Loser.
Milei chega à Casa Rosada com intenção de quebrar paradigmas, mesmo que alguns dos seus planos possam levar a nada sem o apoio do Congresso, onde seu partido, A Liberdade Avança, que conta com somente sete dos 72 senadores e 38 dos 257 deputados, dependerá de alianças com outras agremiações políticas.
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Dolarizar, sim ou não
Entre os seus planos está a reforma do Estado, com privatizações.
"Tudo que possa estar nas mãos do setor privado vai estar nas mãos do setor privado", afirmou Milei na segunda-feira, mas foi ambíguo sobre uma de suas promessas de campanha que deu muito o que falar: dolarizar a economia argentina.
"O eixo central é fechar o Banco Central, depois a moeda será a que os argentinos escolherão livremente", limitou-se a dizer.
Loser está convencido de que "a dolarização não soluciona os problemas da Argentina per se, como não aconteceu no Equador e em El Salvador", porque "falta um apoio significativo de fora para ter os dólares e têm que usar suas energias em outras coisas".
Para Porzecanski, no entanto, parece "uma boa ideia", mas concorda que durante os próximos meses "o novo governo não terá os dólares necessários", por isso defende "um passo intermediário".
Seria o de legalizar "a posse, a poupança, e as transações realizadas com dólares, passando a um regime de câmbio dual onde os pesos e dólares circulam simultaneamente, e os argentinos possam usar dólares ou pesos para realizar seus pagamentos com inteira liberdade", explica.
Na Argentina, onde os dólares são escassos e as reservas do Banco Central estão bastante reduzidas ou, até mesmo, no negativo, segundo alguns economistas - incluindo o presidente eleito -, existem mais de uma dezena de tipos de câmbio para diferentes atividades. Além disso, há restrições para acessar dólares.
Agora que Milei revolucionou a política com sua eleição, todos se perguntam quem ele nomeará como ministro da Economia. Outro mistério que os mercados esperam que seja revelado em breve.