FRANÇA

Militar confessa ter estuprado francesa dopada pelo marido no dia do nascimento da própria filha

O marido, Dominique Pelicot, é julgado em tribunal da França ao lado de 50 outros homens; vítima disse ter sido humilhada por alegações de cumplicidade

Gisèle Pelicot Gisèle Pelicot  - Foto: AFP

O mais novo entre os mais de 50 acusados no caso Gisèle Pelicot, que durante 10 anos era drogada pelo próprio marido, Dominique, para ser estuprada por estranhos, é um militar que tinha, na época, apenas 21 anos. Hoje, aos 26, ele diz ter violentado a francesa por duas vezes.

A primeira das ocasiões, segundo o réu, aconteceu em novembro de 2019, no dia do nascimento de sua própria filha, de acordo com informações divulgadas pelo jornal Correio da Manhã. O militar, que nasceu na Guiana, conta ter ido ao encontro de Dominique — e da inconsciente e violentada Gisèle — mais uma vez. Ele relata, ainda, que haveria um terceiro encontro, cancelado de última hora.

 

'Nada para fazer'
Outro réu, hoje aos 37 anos, afirmou não saber que a mulher estava dopada, apesar de não ter tido consentimento para manter relação sexual com ela.

De acordo com a imprensa francesa, o homem, um trabalhador rural, relatou em depoimento ao Tribunal de Avignon que a proposta de Dominique Pelicot veio quando estava em um bar, na véspera de Ano Novo em 2018, como uma experiência de "swing". Segundo ele, Pelicot o abordou no aplicativo Coco.fr e disse: "minha esposa gostou de você, gostaria de dormir com ela enquanto eu assisto?"

O suspeito diz ter concordado com a proposta já que não tinha "mais nada para fazer" naquela noite. Ele conta que havia brigado com familiares por conta do vício em bebida e drogas, do qual sofre desde os 14 anos.

— Eu tinha tomado banho, passado loção pós-barba, me arrumado. Uma hora depois de trocar mensagens, eu estava na casa dele — teria dito no depoimento, em trecho divulgado pelo tabloide inglês Daily Mail.

O réu diz não ter percebido que a mulher estava drogada, e afirma ter acreditado que tudo fazia parte de uma “encenação” entre Gisèle e o marido.

'Nunca houve consentimento', diz réu
Reconhecendo nunca ter “ter tido o consentimento” de Gisèle Pelicot, outro dos 51 co-réus em julgamento em Avignon, na França, declarou-se nesta quinta-feira culpado do estupro da mulher drogada pelo marido.

Na véspera, a vítima denunciou acusações de alguns advogados de defesa do caso que alegavam sua possível cumplicidade nas agressões. Lionel R., 44 anos, rebateu tais afirmações, admitiu ter abusado da vítima em 2 de dezembro de 2018 e pediu desculpas por ter feito parte deste "pesadelo".

— Nunca tive a intenção (de cometer estupro), mas, nunca tendo tido o consentimento de Madame Pelicot, só posso reconhecer os fatos — declarou ele, no tribunal.

No meio da oitiva, que durou toda a manhã, o vendedor de supermercado, pai de três filhos e casado na época dos acontecimentos, dirigiu-se a Gisèle Pelicot para pedir desculpas.

— Estou aproveitando a ocasião. Eu sei que é tarde demais. Eu nunca quis te machucar e eu o fiz. Perdão — destacou ele a Gisèle, que não esboçou reação. — É horrível saber que faço parte deste pesadelo. Esse pedido de desculpas não vai mudar nada, mas eu queria te pedir mesmo assim.

O julgamento, que começou no dia 2 de setembro, em Avignon, contra o ex-marido de Gisèle Pelicot, comoveu a França, e sua decisão de manter o julgamento a portas abertas a converteu a mulher em um símbolo contra a violência sexual.

— Desde que cheguei a esta sala de audiência me sinto humilhada. Me tacharam de alcoólatra, disseram que eu estava embriagada e fui cúmplice — afirmou a mulher no tribunal. — É tão humilhante e degradante ouvir isso (...) Nem por um segundo dei meu consentimento ao senhor Pelicot, nem a estes homens.

Dominique Pelicot, acusado de drogar a própria mulher para que dezenas de estranhos pudessem estuprá-la, admitiu esta semana ser "um estuprador" e afirmou que Gisèle Pelicot "não merecia" a provação sofrida durante quase dez anos.

— Sou um estuprador, como todos os outros nesta sala. Todos sabiam disso, não podem dizer o contrário — disse Pelicot, referindo-se aos 50 corréus no julgamento.

Pelicot, de 71 anos, é acusado de drogar a ex-mulher para que dezenas de estranhos, recrutados on-line, abusassem dela entre 2011 e 2020.

Esta é a primeira declaração de Pelicot em tribunal desde o início do julgamento, em 2 de setembro, e o seu depoimento é crucial para a análise do caso dos outros 50 réus, com idades entre 26 e 74 anos, que podem pegar até 20 anos de prisão.

Alguns réus alegam que não sabiam que Pelicot dava remédios para dormir à mulher e alegam que pensavam que se tratava de um casal libertino, algo que a vítima negou em seu primeiro depoimento no tribunal.

Gisèle Pelicot "não merecia isso", disse o principal réu no julgamento.

— Peço desculpas, embora isso não seja aceitável — acrescentou.

A presença de Pelicot na Justiça nesta terça-feira causou expectativa após ele ter ficado mais de uma semana afastado do processo por problemas de saúde. O seu primeiro interrogatório estava marcado para terça-feira passada, mas sua ausência obrigou o juiz à frente do tribunal a alterar o cronograma e decretar várias suspensões de sessão.

O julgamento de grande repercussão contra Pelicot tornou-se um símbolo do uso de drogas para o cometimento de agressões sexuais, uma prática conhecida como submissão química, e relançou o debate na França sobre a questão do consentimento.

Gritando "somos todos Gisèle", 10 mil pessoas manifestaram-se no fim de semana na França em apoio à principal vítima, que rejeitou que o julgamento fosse realizado a portas fechadas.

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