Militares restringem acesso ao Facebook em Myanmar em meio a pedidos de resistência
No Facebook, uma rede social muito popular no país, foram criados grupos pedindo a 'desobediência civil'
Os generais birmaneses determinaram, nesta quinta-feira (4), o bloqueio do acesso ao Facebook, um instrumento essencial de comunicação em Myanmar, três dias depois de um golpe de Estado que depôs o governo civil de Aung San Suu Kyi, enquanto continuam os apelos à resistência.
O Exército pôs fim à frágil transição democrática do país, na segunda-feira (1º), impondo o estado de emergência por um ano e detendo Aung San Suu Kyi e outros dirigentes do seu partido, a Liga Nacional pela Democracia (LND).
A líder de 75 anos, que se acredita estar em prisão domiciliar na capital, Naipyidau, segundo seu movimento, foi acusada de ter violado uma norma comercial.
Nesta quinta, centenas de partidários do exército se reuniram na capital. "Não queremos mais traidores nacionais vendidos a países estrangeiros" e "a Tatmadaw [as forças armadas] ama o povo", diziam alguns cartazes.
Não longe dali, 70 deputados da LND assinaram um "compromisso para servir ao povo" e organizaram uma sessão parlamentar simbólica para denunciar a tomada de controle do Parlamento.
Leia também
• Região de Myanmar recupera conexão com a Internet após 19 meses
• Itamaraty não chama de golpe militar a tomada de poder em Myanmar
• Itamaraty monitora situação de brasileiros em Myanmar
Nas ruas, multiplicaram-se os sinais de resistência contra o golpe de Estado, condenado pela ONU e muitos governos ocidentais.
Em Mandalay (centro), foi celebrada uma pequena manifestação com cartazes que diziam "Protesto do povo contra o golpe de Estado militar!". Quatro pessoas foram detidas, segundo a imprensa local. A AFP não pôde confirmar esta informação com as autoridades.
O temor de represálias persiste neste país que viveu sob ditadura militar por quase 50 anos desde sua independência em 1948.
Em Yangon, a capital econômica, os moradores fizeram buzinaços e panelaços pela terceira noite consecutiva. Alguns repetiam em coro: "Viva a Mãe Suu!", em referência a Aung San Suu Kyi.
Advogados protestaram com laços vermelhos com as cores da LND e faziam saudação exibindo três dedos, um gesto de resistência adotado pelos ativistas pró-democracia em Hong Kong e na Tailândia.
Os profissionais de saúde também se somaram ao protesto.
No Facebook, uma rede social muito popular no país, foram criados grupos pedindo a "desobediência civil".
A companhia americana informou nesta quinta que alguns dos seus serviços estavam "perturbados" e exortou as autoridades a "restabelecer a conexão", declarou à AFP uma porta-voz da plataforma.
As autoridades militares já tinham emitido uma advertência à população para que não dissesse nem publicasse nada que pudesse "fomentar distúrbios ou uma situação instável".
Negociações na ONU
O secretário-geral da ONU, António Guterres, disse que fará tudo o que puder para que a comunidade internacional "exerça pressão suficiente" sobre Myanmar para garantir um "fracasso" do golpe de Estado.
O Conselho de Segurança expressou, por sua vez, sua "profunda preocupação" e pediu "a libertação de todos os detidos".
No entanto, China e Rússia se opuseram no âmbito do máximo órgão da ONU a uma condenação explícita do golpe de Estado.
Pequim continua sendo o principal apoio de Myanmar na ONU. Durante a crise dos rohinyas, criou obstáculos a todas as iniciativas ao considerar o conflito um assunto interno birmanês.
Os Estados Unidos, por sua vez, estão avaliando "sanções específicas" contra entidades que canalizam apoio financeiro aos militares birmaneses, disse o assessor de segurança nacional do presidente Joe Biden, Jake Sullivan.
A União Europeia também planeja novas sanções contra o país.
Ambição pessoal
O chefe do exército birmanês, Min Aung Hlaing, que agora concentra a maior parte do poder, justificou o golpe de Estado alegando que houve fraudes maciças nas eleições legislativas de novembro.
As eleições, nas quais a LND venceu por ampla maioria, transcorreram sem problemas, segundo observadores internacionais.
Min Aung Hlaing, um pária em nível internacional desde a crise dos rohinyas, também depôs a dirigente por ambição política pessoal, acrescentam os especialistas.
Os militares acusam a Prêmio Nobel da Paz de 1991 de ter violado uma lei birmanesa de importação e exportação, informou a LND, depois que as autoridades encontraram walkie-talkies não registrados em sua casa.
E o ex-presidente Win Myint é acusado de ter violado a lei de gestão de catástrofes do país por descumprir as medidas contra o coronavírus.