PLANEJAMENTO

Ministério da Saúde traça estratégias para acelerar atendimentos complexos no SUS

Medida busca reduzir as filas de cirurgia que aumentam com os cancelamentos unilaterais de planos de saúde

SUSSUS - Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Com uma demanda represada no Sistema Único de Saúde (SUS) causada pelo envelhecimento da população, migração de usuários de planos para hospitais públicos e pandemia de Covid, o Ministério da Saúde faz uma ofensiva em várias frentes para tentar reduzir as filas de cirurgia, seja de ordem simples ou complexa, e desafogar o SUS.

O esforço envolve desde o corte de burocracia e planejamento regional para as filas até a implementação de um prontuário único e atendimentos em telessaúde.

O governo demonstrou priorizar o tema em fevereiro do ano passado, ao destinar R$ 600 milhões para o Programa Nacional de Redução de Filas, que traz estratégias para ampliar o acesso a cirurgias, exames e consultas.

De março do ano passado a abril deste ano, cerca de 958 mil cirurgias eletivas (que não são consideradas de urgência) foram feitas por meio da política, segundo dados do ministério. Em 2024, foi reservado R$ 1,2 bilhão para o programa, com a meta de 1,6 milhão de cirurgias.

O conjunto de medidas, contudo, não é suficiente para aliviar a demanda por cirurgias complexas, e vem avançando apenas na realização de procedimentos simples, como a correção de cataratas, uma das mais procuradas pela população atendida no SUS.

Segundo o Ministério da Saúde, em novembro de 2023, mais de 1 milhão de pessoas estavam na fila do SUS aguardando por cirurgias eletivas em todo o país. Em nota, a pasta informou, porém, que ultrapassou a meta de atendimentos em "dois ciclos" do programa de redução de filas.

Entre março e janeiro de 2024, a meta de cirurgias foi superada em 30%, com a realização de 648.729 procedimentos. Já entre fevereiro e maio de 2024, houve atendimento 60% acima do planejado, com 438.355 intervenções. "O programa se mostrou responsável por 86% da expansão das cirurgias eletivas no país em 2023", diz a pasta.

Diante da necessidade de atender à demanda, a pasta passou a investir em novas políticas que se conectam ao programa lançado no ano passado e visam resolver gargalos.

Em abril, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ministra da Saúde, Nísia Trindade, lançaram o programa Mais Acesso a Especialistas, com foco em reduzir as burocracias que o paciente enfrenta durante um tratamento no SUS. O investimento é de R$ 1 bilhão.

A ideia é agilizar o atendimento, concentrando exames e consultas em unidades de saúde próximas à casa da pessoa e, dependendo do caso, atendendo por meio de telessaúde. Na prática, o programa foi iniciado há cerca de duas semanas.

A iniciativa também amplia o atendimento em especialidades como oftalmologia, ortopedia e cardiologia por telessaúde, modelo que permite reduzir as barreiras geográficas, já que é difícil levar profissionais especializados ao interior do país.

"Não vamos acabar com as filas. Se trata de reduzir o tempo de espera. O que muda é que o atendimento é centrado nas necessidades do paciente, e não nos serviços isolados" declarou a ministra, durante o lançamento.

A ofensiva do governo para gerenciar as filas ainda conta com a organização de planos regionais. No mês passado, a pasta começou a receber das unidades da federação diagnósticos sobre as necessidades da rede, identificação dos principais problemas e prioridades, número de filas por procedimento e sistemas utilizados.

A medida é vista com bons olhos pela médica sanitarista e pesquisadora da USP, Marília Louvison, que cita a fragmentação das filas e ausência de um sistema centralizado de atendimento como dois dos principais empecilhos para a demora no atendimento de procedimentos complexos no SUS:

"Não são filas únicas porque ainda não temos um sistema de informação em que as gestões federal, estadual e municipal estejam integradas. Então, muitas vezes há filas duplicadas e o governo tem dificuldade de adequar a oferta e identificar onde está a demanda."

Outros desafios estão ligados à natureza dos serviços: cirurgias mais complexas dependem de boas tecnologias e profissionais qualificados, assistências que não são distribuídas de forma equânime no SUS em todo o país.

"Uma grande questão, principalmente para os procedimentos mais complexos, é que eles dependem de maior densidade tecnológica. Isso quer dizer que preciso de recursos financeiros e políticas de formação e descentralização de profissionais em um país extremamente desigual, com vazios assistenciais em partes do Centro-Oeste, Norte e Nordeste" comenta Louvison.

Na avaliação do sanitarista e ex-secretário de Atenção Primária, Nésio Fernandes, a ausência de uma plataforma tecnológica que centralize os dados sobre a espera no SUS gera “uma desorganização do acesso dos pacientes no SUS até às cirurgias”.

"Entre ir na atenção primária e chegar ao centro cirúrgico, ainda se enfrenta caminhos difíceis no sistema de saúde. Poderíamos ter soluções tecnológicas que fossem capazes de organizar essa caminhada, uma plataforma digital que permitisse o acompanhamento independente do nível de atenção, do nível de gestão ou da esfera jurídica do prestador."

Nesse sentido, o governo federal anunciou neste mês que o SUS Digital, aplicativo do sistema, terá uma aba de acompanhamento de consultas, exames e procedimentos.

Além disso, os profissionais da saúde poderão ter acesso a um prontuário eletrônico unificado. A medida, contudo, ainda não foi colocada em prática.

O envelhecimento da população e a migração de clientes de planos de Saúde para o SUS, além de um represamento de atendimentos causado pela pandemia da Covid-19, são os três principais motivos apontados pela Louvison para a espera no SUS.

Na última semana, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), do Ministério da Justiça, solicitou esclarecimentos adicionais a 17 operadoras e quatro associações de saúde sobre o cancelamento unilateral de planos na última semana.

A investigação foi iniciada devido ao aumento expressivo de reclamações registradas nos canais do governo. A sanitarista reforça que “o SUS tem que estar preparado para reinserir” esses usuários.

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