Ministério Público denuncia seis pessoas por morte de Beto Freitas no Carrefour
Denuncia é por homicídio triplamente qualificado com dolo (intenção) eventual e por motivo torpe
O Ministério Público do Rio Grande do Sul denunciou nesta quinta-feira (17) seis pessoas pela morte de Beto Freitas, homem negro de 40 anos espancado no Carrefour, em Porto Alegre, na noite de 19 de novembro, véspera do Dia da Consciência Negra. O crime completará um mês no próximo sábado.
A imagem da imobilização e a morte por asfixia lembram o caso do norte-americano George Floyd, cujo assassinato desencadeou protestos contra o racismo nos Estados Unidos.
As seis pessoas foram denunciadas por homicídio triplamente qualificado com dolo (intenção) eventual, por motivo torpe, meio cruel e recurso que dificultou a defesa da vítima.
Os seis denunciados foram os seguranças Giovane Gaspar da Silva, Paulo Francisco da Silva e Magno Braz Borges; a fiscal Adriana Alves Dutra; e os funcionários Kleiton Silva Santos e Rafael Rezende. A reportagem aguarda a manifestação da defesa de Giovane e não localizou as demais defesas.
Giovane, Magno e Adriana já estão presos. A promotoria irá se manifestar a favor da prisão preventiva de Kleiton, Rafael e Paulo.
Segundo o promotor André Gonçalves Martínez, as evidências "realçam a unidade e uniformidade do padrão de ação do grupo formado pelos denunciados, sempre adotando o mesmo perfil abusivo e temerário no emprego de violência visando à submissão arbitrária e pública da vítima sob condição aviltante, sem a devida e necessária cautela para preservação da vida".
De acordo com a denúncia de Martínez, qualquer um dos seis "deveria e poderia ter feito algo para evitar" a morte de Beto. O laudo do Instituto Geral de Perícias (IGP) apontou que Beto morreu por asfixia. Após ser espancado, ele foi mantido imobilizado no chão. Gravações também mostraram a vítima pedindo socorro. "Tô morrendo", disse ele em um dos vídeos. Ele também falava que não conseguia respirar.
Em um dos áudios, é possível escutar Paulo falando a Beto: "Ei rapaz, oh, sem cena tá? Sem cena, é a [inaudível] vez que tu vem e a gente te avisou da outra vez". Segundo promotor, a declaração reforça a ideia de que os denunciados agiram em grupo como resposta a atritos anteriores, que não justificam o que Martínez chamou de "verdadeira desforra".
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Para o promotor, a agressão foi marcada por "violência desmedida calcada em discriminação pela condição social e raça da vítima que era afrodescendente, e ousara confrontá-los anteriormente".
Assim, o promotor conclui que "este padrão de abuso e descaso" é explicado "pelo sentimento de desconsideração, senão desprezo, que os denunciados demonstraram ter para com ela, certamente a partir de uma leitura preconceituosa relacionada à sua fragilidade sócio-econômica e origem racial".
Os seis já haviam sido indiciados pela Polícia Civil. A investigação foi conduzida pela delegada Roberta Bertoldo.
No celular de Adriana, entregue por ela à polícia, a investigação encontrou mensagens que ela trocou com contatos após o homicídio. Em uma delas, faz referência a Giovane, o policial temporário que estava no seu primeiro dia de "bico" como segurança.
A Brigada Militar, como é chamada a PM gaúcha, desligou Giovane da corporação. Adriana escreve ao contato que o segurança "ratiou" (gíria para indicar que alguém cometeu equívoco), ao imobilizar Beto. "Fez que nem o policial americano aquele que asfixiou o cara."
"(...) sim, com certeza, eles não pensavam que ia acontecer isso, né, até porque ninguém morre com um soco na cabeça (...) a questão é que o brigada ratio, botou o joelho em cima, fez que nem o policial americano aquele que asfixiou o cara (...) despreparado, não tem a manha da imobilização e tal (...)", diz a transcrição da mensagem.
Segundo o MP, ela "manteve o domínio da ação de seus comparsas, já que na ocasião os chefiava, tendo sobre eles ascendência hierárquica na atividade laboral em que estavam envolvidos".