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LUTO

Morre, aos 93 anos, o banqueiro José Luiz de Magalhães Lins

Longe dos holofotes, teve atuação marcante na economia, na política e na cultura

Bbanqueiro José Luiz de Magalhães LinsBbanqueiro José Luiz de Magalhães Lins - Foto: Divulgação

Morreu nesta sexta-feira (3) o banqueiro José Luiz de Magalhães Lins, aos 93 anos. Sobrinho de Magalhães Pinto, assumiu o comando do Banco Nacional em 1960, e era considerado um mecenas. Otto Lara Resende dizia que ele era “o amigo certo das promissórias incertas”.

O escritor e jornalista mineiro se referia ao apoio permanente dado às artes, ao cinema e às letras pelo banqueiro, que fez do Banco Nacional de Minas Gerais, que tinha apenas duas agências quando ele assumiu seu comando, a se tornar, no auge, o segundo maior banco do país.

Aos 17 anos, José Luiz de Magalhães Lins começou a trabalhar no banco do tio, Magalhães Pinto. Assumiu o posto de diretor-executivo em 1960.

“Durante dez anos, Magalhães Lins comandou o Nacional. Era um inovador. Abriu as salas dos gerentes das agências aos clientes. Concedia financiamentos a pessoas físicas e pequenas indústrias. Criou uma imagem popular para a empresa, tendo como símbolo o guarda-chuva. Sob a administração dele, o Nacional multiplicou o seu capital e se tornou o segundo maior banco brasileiro”, conta Mario Sérgio Conti, em seu livro “Notícias do Planalto”.

Simultaneamente, apoiava as artes. Foi fundamental para o florescimento do Cinema Novo, financiando algumas obras-primas como “Vidas Secas”, de Nelson Pereira dos Santos, “Os Fuzis”, de Ruy Guerra, “A Grande Cidade”, de Cacá Diegues, “Menino de Engenho”, de Walter Lima Jr, “A Falecida”, de Leon Hirszman, e “O Padre e a Moça”, de Joaquim Pedro de Andrade.

Seu papel no apoio ao Cinema Novo foi reconhecido por Glauber Rocha. Magalhães Lins financiou “Deus e o Diabo na Terra do Sol” e “Terra em Transe” do cineasta: “O exemplo do Sr. José Luiz Magalhães Lins é de extraordinária importância neste momento que vive o cinema brasileiro, o mais fértil de sua história, o mais definido pela qualidade cada vez maior de seus filmes.”, declarou o cineasta no livro “Revisão crítica do cinema brasileiro”. O financiamento de Magalhães foi fundamental para os clássicos “Terra em Transe” e “Deus e o Diabo na Terra do Sol”.

Ruy Castro também citou a importância do banqueiro em seu livro “Ela é carioca”, de 1999: “cada filme (do Cinema Novo) era um parto para ser rodado e muitos deles não teriam existido se não fosse pelo Banco Nacional, leia-se José Luiz de Magalhães Lins, em empréstimos a perder de vista”.

“O auge do cinema novo foi após 1964. Ninguém foi incomodado. Essa foi minha maior façanha”, resumiu o próprio banqueiro em entrevista à Folha de São Paulo, em 20 de dezembro de 2020.

“Nos primeiros dias de abril de 64, Harold Polland, um grande construtor aqui do Rio, me telefonou e disse que queria que eu conversasse com o coronel Newton Leitão, o número 2 do general Golbery [no SNI]”. O encontro ocorreu em um apartamento em Copacabana. “Ficamos nós dois ali umas três horas. Ele [Leitão] falou no Cinema Novo. Eu falei: ‘Isso aí eu queria que você não mexesse. Deixa por minha conta. Tem que dar um lugar para desaguar um pouco as mágoas’. Tanto é que eu não parei de dar financiamento para ninguém. E nunca ninguém foi incomodado. Todos os filmes foram feitos”, complementou Magalhães Lins na mesma entrevista.

Ele garantiu que nunca levou prejuízo ao emprestar para os cineastas: “Enquanto eu estive no negócio, ninguém deu prejuízo. Ninguém”, afirmou à Folha.

Como diretor-executivo do Banco Nacional, foi o avalista de um empréstimo concedido ao jornalista e empresário Roberto Marinho, considerado fundamental para os primeiros anos da TV Globo e para a desvinculação da empresa do grupo norte-americano Time-Life. Tornaram-se amigos, Magalhães Lins e Marinho.

Cuidando de Garrincha

Magalhães Lins chegou a ficar responsável pelas finanças de Garrincha, conta Ruy Castro no livro “Estrela Solitária”, sobre a vida do jogador. Os jornalistas Armando Nogueira, Sandro Moreyra e Araújo Netto, amigos de Garrincha, temiam pela desastrosa administração financeira do craque e o convenceram a deixar o banqueiro organizar suas finanças, recolhendo o dinheiro que tinha em casa para aplicar em ações sob a os cuidados do banqueiro.

Na casa de Garrincha, “encontraram dinheiro em gavetas, fruteiras, enfiado em velhos exemplares de Mindinho e Reis do Faroeste, debaixo de outros colchões e até caído por trás do fogão. Havia cruzeiros, libras, francos, liras, pesetas, coroas suecas, florins holandeses, moedas de toda a parte onde o Botafogo jogara nos últimos anos, além de soles e bolivares que já tinham deixado de valer. Havia também inúmeros cheques jamais descontados e muitos, muitos maços de notas de dólar.”, conta Castro no livro.

Mas o papel mais importante foi salvar o craque da cadeia por deixar de pagar pensão alimentícia à ex-mulher Nair Marques, primeira mulher do jogador. Magalhães Lins quitou a dívida na época de 2.600 cruzeiros novos, momentos antes da prisão: “O oficial de justiça já vestia o paletó para ir prender Garrincha quando um emissário de José Luiz de Magalhães Lins entrou na Sexta Vara e entregou ao juiz Áureo um cheque no valor de 2600 cruzeiros novos”.

Avesso à publicidade e aos holofotes, Magalhães Lins não costumava frequentar festas nem viajar. Mario Sergio Conti, em “Notícias do Planalto” descreve o estilo do banqueiro: vestia ternos pretos, só bebia gim, com muito gelo, fumava charutos e só falava português:

“Dormia tarde, acordava cedo e lia muito, sobretudo jornais e revistas. Gostava de conversar com jornalistas, mas não dava entrevistas, nem posava para fotos. Era um desconhecido dos leitores de jornais e revistas. Mas foi um dos homens mais influentes na imprensa carioca: a mais discreta das eminências pardas, amigo de Roberto Marinho, Nascimento Brito e Chagas Freitas, dono de O Dia”.

Apoiou artes plásticas, como conta Ruy Castro, ao financiar a Petite Galarie em Ipanema, que abriu acesso à classe média para comprar arte. Ajudou Carlos Lacerda a abrir a Editora Nova Fronteira.

O banqueiro atuou à esquerda e à direita do espectro político. Foi o coordenador da campanha do presidente João Goulart no plebiscito que afastou o parlamentarismo e devolveu poder total a Goulart, em 1963. Em 1964, o tio Magalhães Pinto se alinhou ao golpe militar.

“Magalhães Pinto sempre foi candidato a presidente. Veja o que é o destino. Se não tivesse havido nada, ele queria ser candidato, mas os militares que assumiram o poder afastaram os civis”, comentou o banqueiro na entrevista à Folha em 2020.

Magalhães Lins nasceu em Arcos, Minas Gerais, em 12 de abril de 1929. Depois que deixou o banco em 1972, foi presidente da Light e do Banerj. Em 1980, tornou-se conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, onde ficou até 1999, quando se aposentou.

Ele era casado desde 1961 com Nininha Nabuco, com quem teve cinco filhos.

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