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Saúde

Musicoterapia: entenda como o uso da música ajuda no tratamento de autistas

Elementos como som, harmonia e ritmo estimulam o paciente como um todo

Fonoaudióloga e musicoterapeuta Vanessa Lira Vieira em uma sessão de musicoterapia com uma pequena paciente Fonoaudióloga e musicoterapeuta Vanessa Lira Vieira em uma sessão de musicoterapia com uma pequena paciente  - Foto: Divulgação/Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo

Apesar de antiga, a musicoterapia ainda não é amplamente conhecida. O tratamento é baseado no uso profissional da música e de seus elementos como intervenção em ambientes médicos, educacionais e cotidianos, com indivíduos e grupos que buscam otimizar a qualidade de vida e melhorar a saúde física, social, comunicativa e emocional. Entre pacientes neurológicos, com questões de mobilidade e sindrômicos, como autistas, a abordagem terapêutica traz diversos benefícios.

— Vejo muita diferença na Isa. Agora, por exemplo, consigo escovar os dentes dela. Também fica mais fácil de chamar a atenção dela quando está chorando. São coisas que parecem simples, mas que eu tinha bastante dificuldade antes. Tudo com música fica mais simples — diz Larissa Gomes Pinheiro, mãe da Isadora, de 2 anos.

A menina está em processo de diagnóstico do transtorno do espectro autista (TEA), faltando apenas o laudo do neurologista. Inicialmente, a mãe pensou que ela tinha problemas de audição, já que, ao chamar a filha pelo nome, não obtinha resposta. A menina também tem dificuldade para socializar com outras crianças de sua idade.

— Eu percebia o jeito dela de brincar. Ela tem uma seletividade alimentar grande e pouca interatividade social, também. Pelo atraso na fala que ela tinha, a creche indicou um acompanhamento e conseguimos o tratamento com a fonoaudióloga e a nutricionista na Unidade Básica de Saúde — explica Larissa.

Isadora sempre gostou de música, que já a ajudava em diferentes situações — como comer, tomar banho e dormir —, além de acalmá-la em momentos de estresse. Há três meses, a pequena começou a ter sessões de musicoterapia na Unidade Básica de Saúde (UBS) Jardim Miriam, em São Paulo, e a mãe já nota diferenças significativas no comportamento da filha.

— A Isa gosta de todas as músicas possíveis e canta tudo. Ela está conseguindo falar e interagir melhor, e eu acho maravilhoso. De início, não conhecia a musicoterapia, mas a fono percebeu que este seria um jeito fácil de acessar a minha filha e começamos o tratamento — conta Larissa.

Tratamento de ampla atuação

A responsável pelo tratamento de Isadora é a fonoaudióloga e musicoterapeuta Vanessa Lira Vieira, que trabalha na unidade de saúde desde abril de 2022. Segundo a especialista, se destinado a pessoas dentro do espectro autista, é preciso considerar o nível de autismo do paciente para entender as possibilidades.

— Também precisamos pensar se a criança ou o adolescente é oralizado ou não, para entendermos as possibilidades. No caso de autistas não oralizados, a musicoterapia entraria como uma abertura de canal de comunicação, para que a interação social e a linguagem sejam estimuladas. Por exemplo, com um autista não oralizado que começou a fazer vocalizações, eu posso começar a fazer uma improvisação musical — detalha a fonoaudióloga.

Vieira acrescenta que a recriação é outra ferramenta utilizada na musicoterapia, já que é possível, a partir de uma música existente, incluir o nome da criança ou de um familiar e um objeto que ela goste na letra.

— Com uma criança que já tem linguagem, entendemos que é mais fácil já que temos um caminho previamente iniciado. Então, conseguimos abordar emoções em canções que falam sobre esses aspectos.

A terapeuta ainda ressalta que, para ter os atendimentos de musicoterapia, é preciso realizar uma avaliação prévia com as crianças, já que, para algumas com disfunções sensoriais, música pode ser um sofrimento.

Cuidado com o diagnóstico
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), aproximadamente uma em 100 crianças têm autismo. As características podem ser detectadas na infância e, geralmente, incluem algum grau de dificuldade na interação social e comunicação. Além disso, autistas podem apresentar padrões atípicos de atividades e comportamentos, como dificuldade na transição de uma atividade para outra, foco em detalhes e reações incomuns a sensações.

Segundo a musicoterapeuta, o diagnóstico é muito importante, mas a lógica dele ser tão precoce precisa ser desconstruída.

— A equipe multidisciplinar trabalha a criança de acordo com o que seria a “normalidade” naquele período. Então, o que ela deveria estar fazendo e não está? Fazemos toda essa sensibilização. As famílias ficam com a angústia de precisar de um diagnóstico o quanto antes, mas é preciso ter cuidado com laudos não assertivos — alerta.

Além do autismo
Vieira esclarece que a musicoterapia utiliza todos os elementos que compõem a música — como som, harmonia, ritmo, letra e melodia —, que estimulam a criança como um todo.

— Chegavam para mim pacientes com nível três de autismo (mais grave) com quem já tinham sido feitas diferentes abordagens terapêuticas. As possibilidades se esgotavam e eles vinham para a musicoterapia. O autista, muitas vezes, fica no mundo dele e, com o tratamento, o acesso à criança era melhor: ela se tornava mais responsiva e conseguia se organizar melhor psiquicamente — relata.

Vieira acrescenta que, em pacientes neurológicos, sindrômicos e com questões de mobilidade, é possível usar instrumentos percussivos. Ela reforça que a musicoterapia também pode oferecer muitos benefícios para a saúde mental.

A especialista, por exemplo, utiliza a musicoterapia no trabalho com mulheres que têm algum diagnóstico em saúde mental, como ansiedade generalizada, fobia social, síndrome do pânico e depressão maior.

— Uso letras de canções para acessar eventos traumáticos. Consigo trazer uma nova visão de vida e possibilidades para elas se verem mais protagonistas de suas vidas — diz.

*Estagiária sob a supervisão de Adriana Dias Lopes.

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