Namíbia elege primeira presidente mulher enquanto partido no poder mantém liderança
Em todo o sul da África, partidos políticos que lideram seus países desde o fim do colonialismo cederam poder à oposição nos últimos meses
Em um ano marcado por reviravoltas eleitorais que alteraram o cenário político do sul da África, o partido governista da Namíbia manteve sua posição, vencendo as eleições gerais do país rico em minerais, informou a comissão eleitoral nesta terça-feira. Pela primeira vez em sua história, a Namíbia também elegeu uma presidente mulher. A
A vencedora, Netumbo Nandi-Ndaitwah, junta-se ao pequeno grupo de mulheres que já lideraram países na África.
Nandi-Ndaitwah, de 72 anos, foi vice-primeira-ministra e ministra de Relações Internacionais e Cooperação no governo do presidente Hage G. Geingob, que faleceu em fevereiro. Um presidente interino assumiu o cargo, mas não se candidatou à eleição.
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Nandi-Ndaitwah, que conquistou 57,3% dos votos, liderou a Swapo (Organização do Povo do Sudoeste Africano, em português), que governa a Namíbia há mais de três décadas, desde a independência. O partido conquistou 51 dos 96 assentos no parlamento, uma redução em relação aos 63 assentos obtidos nas eleições de 2019. A perda de cadeiras reflete, provavelmente, a frustração generalizada com a economia estagnada do país.
Panduleni Itula e seu partido Patriotas Independentes pela Mudança, fundado em 2020 por um grupo de políticos dissidentes da Swapo, ficaram em segundo lugar, com 20 cadeiras. Outros 13 partidos de oposição dividiram o restante das vagas.
“Fizemos compromissos, e digo a vocês que vamos cumprir o que prometemos”, disse Nandi-Ndaitwah na terça-feira, em Windhoek, a capital. Itula e outros líderes da oposição boicotaram o anúncio da comissão eleitoral em protesto contra os resultados e o manejo da votação.
Essas eleições eram consideradas as mais desafiadoras para a Swapo até agora. O partido evoluiu de um movimento de libertação clandestino que lutou pela independência da África do Sul para um partido político que enfrenta dificuldades para responder às frustrações de uma nova geração de eleitores.
Na última eleição presidencial, Geingob conquistou 56% dos votos, uma queda em relação aos 87% obtidos em 2014.
As eleições, realizadas em 27 de novembro, foram marcadas por falhas técnicas que resultaram em longas filas e forçaram alguns locais de votação a permanecerem abertos muito além do horário de fechamento. Alguns partidos de oposição tentaram interromper a contagem dos votos e criticaram a decisão tardia da comissão eleitoral.
As irregularidades eleitorais foram incomuns na Namíbia, que introduziu o que foi considerado o primeiro sistema de votação eletrônica do continente há uma década.
Em toda a África Austral, partidos políticos que começaram como movimentos de libertação sofreram derrotas eleitorais nos últimos meses, à medida que uma geração sem memória direta do colonialismo ou do apartheid foi às urnas. Segundo analistas, essa geração está mais preocupada com o desemprego e o acesso desigual à educação.
Na Namíbia, mais de 40% dos 1,4 milhão de eleitores registrados têm 35 anos ou menos, e o desemprego é elevado. O país também enfrenta uma grave escassez habitacional, e muitos estão descontentes com o que consideram a incapacidade do governo de tornar a propriedade da terra acessível. A maior parte das terras está nas mãos de elites ricas e politicamente conectadas. Apesar de ser classificada como um país de renda média-alta pelo Banco Mundial, a Namíbia possui uma das economias mais desiguais do mundo.
O partido Patriotas Independentes pela Mudança prometeu reformar o setor empresarial do país e investir em infraestrutura para estimular a criação de empregos. Já a Swapo, no poder, prometeu destinar parte do orçamento para criar projetos que gerassem empregos para jovens, além de desenvolver os setores de mineração, turismo e agricultura.
Nos países vizinhos, os eleitores enviaram mensagens de reprovação a partidos que consideravam incapazes de criar empregos suficientes e desenvolver suas economias. Na África do Sul, o Congresso Nacional Africano perdeu sua maioria absoluta neste ano pela primeira vez desde o fim do apartheid. Meses depois, em Botsuana, o Partido Democrático de Botsuana sofreu sua primeira derrota eleitoral desde que chegou ao poder há quase seis décadas.
Embora a Frelimo, partido que governa Moçambique desde sua independência em 1975, tenha sido declarada vencedora das eleições de outubro, protestos generalizados eclodiram devido a acusações de manipulação dos resultados pela legenda governista.
O partido governista da Namíbia também se beneficiou de uma oposição fragmentada. Com 14 candidatos de oposição na cédula, os votos contra foram divididos, favorecendo o partido incumbente.
Nandi-Ndaitwah ingressou na Swapo quando a Namíbia era governada pelo regime de apartheid da África do Sul, segundo sua biografia oficial. Ela foi detida após participar de protestos estudantis e mais tarde fugiu para o exílio, trabalhando para o partido na Zâmbia e na Tanzânia.
Como muitos ativistas políticos africanos, foi educada na antiga União Soviética e mais tarde obteve um diploma de pós-graduação no Reino Unido. Ela atuou em todas as Assembleias Nacionais desde a independência da Namíbia e ocupou cargos nos ministérios de bem-estar da mulher e da criança, meio ambiente e turismo, além do Ministério das Relações Exteriores.