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ANIMAIS

Não alimente os animais: Contato com pessoas pode ser fatal para algumas espécies

Só no ano passado, morreram cerca de cem micos e macacos-prego no estado do Rio

O bebê macaco-prego-do-peito-amareloO bebê macaco-prego-do-peito-amarelo - Foto: Divulgação/Bioparque-Rio

O gesto parece inofensivo, mas tem impactos graves na fauna: quando comem o alimento dado (ou deixado) por humanos, animais silvestres correm risco de morte, e a questão pode se tornar um problema de saúde pública. Um macaco-prego, por exemplo, pode contrair o vírus do herpes. O contágio acontece quando uma pessoa infectada dá ao bicho um pedaço de comida já mordida.

Somente no ano passado, morreram cerca de cem micos e macacos-prego no Estado do Rio, segundo o Centro de Recuperação de Animais Selvagens (Cras), da Universidade Estácio de Sá, em Vargem Grande, que acolhe e trata animais debilitados.

Na última quarta-feira, um mico-estrela com suspeita de herpes estava em observação no centro e não resistiu. Geralmente, os animais são socorridos pela Patrulha Ambiental, pelo Corpo de Bombeiros ou por técnicos de parques ecológicos. O veterinário Jeferson Pires, do Cras, explica que macacos e quatis são as espécies mais atingidas.

"Nos casos de herpes, os animais costumam chegar com várias aftas na boca e úlceras na língua, alguns deles com conjuntivite. Em poucos dias, o quadro evolui para uma encefalite (inflamação do cérebro), levando à morte. São indivíduos muito sensíveis e com pouca resistência ao vírus", afirma.

Risco de retransmissão
No Cras, os bichos doentes passam por triagem, fazem exames, e o material genético coletado é enviado para análise da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). O vírus pode ser transmitido para outros macacos e até reinfectar os humanos.

"Um dos grandes medos da comunidade científica é que a gente se contamine de volta. Um vírus humano em um animal passa por alterações genéticas, e, se for retransmitido para os humanos, pode gerar uma zoonose grave. A gripe aviária é exemplo desse ciclo perigoso", alerta o veterinário. Em 2016, um surto de herpes causou a morte de aproximadamente 15 pequenos primatas no Rio em um único dia.

"É um grande número de animais morrendo por uma causa banal, que pode ser evitada. Quando a gente fala “não alimente os animais”, as pessoas acham que é chatice, mas é um comportamento grave. O macaco-prego, que tem predominância no município, é resistente a várias doenças, mas sucumbe ao herpes", explica Silvia Bahadian, veterinária do Centro de Primatologia do Instituto Estadual do Ambiente (Inea).

O problema não se restringe a macacos e quatis. O Cras já atendeu jacarés-de-papo-amarelo, que vivem nos canais da Zona Oeste do Rio, com acúmulo de gordura no fígado e, nos casos mais graves, cirrose, o que reduz a chance de sobrevivência.

"Os jacarés chegam mais prostrados. A gente fica sabendo de pessoas que jogam pão, biscoito, pão de queijo, fora os efluentes e o lixo presentes nos canais. O tratamento é correção alimentar. Mas é uma questão delicada, porque o animal é devolvido ao mesmo local", explica Pires.

No último dia 18, viralizou o vídeo de um urubu bebendo cerveja em um copo na areia da Praia do Recreio. Nas imagens, é possível ver o animal bicando o líquido, enquanto pessoas se divertem com a cena.

"Além do impacto na saúde, dar comida aos bichos altera o comportamento deles, que passam a ficar mais agressivos ao perderem o medo de chegar perto. Eles tendem a ficar mais preguiçosos para buscar alimento na natureza, e isso pode desequilibrar todo o ecossistema", observa Ana Elisa Bacellar, analista ambiental do ICMBio há 18 anos.

Bife para macacos
Além de fazer campanhas de conscientização, o Parque Nacional da Tijuca, que recebe cerca de quatro milhões de visitantes por ano, também substituiu parte das lixeiras por exemplares com tampas mais pesadas, conhecidas como antifauna, para impedir que os animais recolham alimentos.

"A gente orienta as pessoas a não alimentarem os animais explicando o risco de zoonoses, por campanhas nas redes sociais, ações voluntárias, folhetos e placas de sinalização ao longo do parque, além das ações do projeto Refauna. As lixeiras ajudam, mas não resolvem se não mudarmos hábitos de interação", pondera o chefe do parque, Eduardo Frederico.

Em 2015 e 2016, o Refauna, que faz a reinserção de animais silvestres no Parque da Tijuca, retirou dois macacos-bugios da floresta que estavam sendo alimentados com bisteca por visitantes.

"O trabalho de reinserção demanda esforço, recursos financeiros e humanos. Ter que retirar o animal da natureza foi um baque para a equipe. Quando comunicamos o fato nas redes sociais, as pessoas se sensibilizaram, e isso mudou a nossa abordagem", explicou Marcelo Rheingantz, biólogo e diretor-executivo do Refauna.

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