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O que mandados de prisão do TPI contra Netanyahu significaria na prática

Israel não reconhece jurisdição do tribunal internacional sobre autoridades do país, mas ordens para prisão provocariam desgaste de imagem e limitaria viagens a outros países

Ativista de esquerda usa máscara do premier de Israel, Benjamin Netanyahu, e roupa de presidiário, e ergue cartaz com dizeres: "Bibi está esperando por um abraço de Haia?"Ativista de esquerda usa máscara do premier de Israel, Benjamin Netanyahu, e roupa de presidiário, e ergue cartaz com dizeres: "Bibi está esperando por um abraço de Haia?" - Foto: Jack Guez/AFP

O pedido do procurador-chefe do Tribunal Penal Internacional (TPI), Karim Khan, para que os juízes da instância internacional emitam mandados de prisão contra o premier de Israel, Benjamin Netanyahu, o ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant, e três líderes do Hamas por crimes de guerra e contra a humanidade cometidos durante o conflito na Faixa de Gaza, levantou a questão sobre a real chance das principais figuras políticas e militares envolvidas no enfrentamento terminarem atrás das grades. Embora exista a possibilidade de que os mandados sejam cumpridos, a maior chance é de que apenas efeitos indiretos sejam sentidos pelos acusados.

O TPI tem competência para investigar e julgar indivíduos acusados de crimes de guerra, contra a humanidade e genocídio. Ao contrário da Corte Internacional de Justiça (CIJ), onde o Estado de Israel responde por genocídio em um processo movido pela África do Sul, ele se volta a pessoas físicas, não Estados e governos. Suas decisões, contudo, sofrem com limitações relativas ao reconhecimento pela comunidade internacional.

Israel não reconhece a jurisdição do TPI sobre o seu território, seguindo países como EUA e Rússia. Em termos práticos, isso significa que mesmo que os juízes acatem o pedido do procurador e emitam os mandados de prisão, Netanyahu e Gallant não seriam presos enquanto estivessem em solo israelense. O mesmo se aplica, a priori, a Ismail Haniyeh, líder do Gabinete político do Hamas que vive no Catar, país que também não reconhece a autoridade do tribunal.

Do ponto de vista apenas procedimental, os líderes mais expostos pela emissão dos mandados seriam Yahya Sinwar e Mohammad Deif, que, acredita-se, estão em Gaza. O Estado da Palestina é signatário do Estatuto de Roma e reconhece a jurisdição do TPI, e teriam de cumprir com a medida judicial.

Em termos práticos, contudo, o reconhecimento do tratado não é o bastante para colocar os líderes do Hamas atrás das grades. O TPI não possui uma força policial própria para cumprir suas decisões, ou seja, os mandados que forem emitidos precisam ser cumpridos por autoridades locais. Nos casos de Sinwar e Deif, considerando que realmente estão em Gaza, as autoridades locais — o próprio Hamas — teria que realizar as prisões, um cenário pouco crível em meio à guerra.

Apesar disso, não significa que os mandados de prisão não terão efeitos práticos contra os acusados. Em primeiro lugar, há que se considerar o efeito simbólico que terão, principalmente para Netanyahu. A emissão dos mandados de prisão seria um importante reconhecimento internacional de que o líder israelense está no mesmo patamar de figuras como o presidente da Rússia, Vladimir Putin, e o ex-presidente deposto do Sudão, Omar al-Bashir, acusados de crimes de guerra. Também igualaria o premier aos líderes do Hamas, considerados terroristas no Estado judeu.

De forma ainda mais prática, os mandados de prisão afetariam diretamente a capacidade de movimento dos acusados, que poderiam ser presos em qualquer um dos 124 países que reconhecem o TPI como uma jurisdição competente. A lista inclui uma série de países europeus, como Alemanha, França e Reino Unido, que mantém relações próximas com o Estado de Israel.

Casos anteriores mostram a dificuldade imposta por um mandado de prisão do TPI. Quando o presidente da Rússia, Vladimir Putin, foi alvo de uma ordem de prisão do órgão, apesar do não reconhecimento de Moscou, ele protagonizou um incidente internacional às vésperas de uma reunião de Cúpula dos Brics na África do Sul, signatária do Estatuto de Roma.

Para evitar contrariar a ordem do Tribunal e não entrar em atrito com o aliado, as autoridades sul-africanas tiveram que iniciar um processo de convencimento de que a presença de Putin no país geraria um constrangimento global. Ele acabou concordando em não viajar a Pretória e participou da reunião de forma virtual.

Autoridades de Israel e do Hamas criticaram de forma enérgica o pedido apresentado pelo procurador. O ministro das Relações Exteriores de Israel, Israel Katz, disse que havia ordenado o estabelecimento imediato de um comitê especial destinado a combater a decisão, que, segundo ele, “tinha como objetivo, antes de tudo, amarrar as mãos do Estado de Israel e negar-lhe o direito de legítima defesa”. Ele também chamou a medida de uma "desgraça histórica".

Em um comunicado no Telegram, o Hamas condenou os pedidos de mandado contra os seus líderes, afirmando que o procurador Khan deveria exigir a prisão não só de Netanyahu e de Gallant, mas de todos os “líderes, oficiais e soldados que participaram em crimes contra o povo palestino”.

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