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A PEC 28/2024 e a retaliação despudorada. Urge preservar o STF

A malsinada PEC que intitula o artigo é um projeto que delega ao Congresso Nacional a possibilidade de suspender decisões do Supremo Tribunal Federal, restringindo sua competência, admitindo situações, inclusive, que possam levar ao impeachment de ministros da Corte.

O autor da proposta é o deputado Reinhold Stephanes. A proposição prevê que o Congresso, se entendendo que o Supremo Tribunal Federal ultrapassou o exercício adequado de sua função de guarda da Constituição possa sustar a decisão por meio do voto de 2/3 de cada uma de suas casas legislativas (Câmara e Senado), pelo prazo de dois anos, prorrogável uma única vez por mais dois anos. Cabendo ainda ao STF só poder manter sua decisão pelo voto de 4/5 de seus membros. A iniciativa é também extensiva, automaticamente, aos demais tribunais.

Na quarta-feira, 09 de outubro de 2024, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou a admissibilidade da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 28/2024 que autoriza o Congresso anular decisões liminares de ministros do Supremo Tribunal Federal na hipótese de os deputados entenderem que os magistrados transgrediram a competência da Corte.

As propostas se constituem um escárnio à soberania e independência do Poder Judiciário e tem raízes revanchistas pelo protagonismo do STF na defesa do Estado Democrático de Direito.

Não por acaso a Comissão é presidida pela deputada Caroline De Toni (PL-SC) e é majoritariamente formada por seguidores do ex-Presidente, ora alijado do processo eleitoral, Jair Bolsonaro. Além do mais foram aprovados dois projetos que alongam a lista de crimes de responsabilidade e mudam regras para o processo e impeachment de ministros do STF.

O professor de processo civil Henrique Ávila, admite que não há o que mudar, considerando que o funcionamento vigente já tem mecanismos de controle que utiliza freios e contrapesos.

A ideia que se tem é que a Comissão de Constituição e Justiça tem sua postura inteiramente voltada contra o desempenho do Supremo Tribunal Federal além de viabilizar projetos que dimensionam o contingente de crimes de responsabilidade eventualmente praticados por ministros da Suprema Corte.

A postura revanchista está mais do que evidente. Tanto isso é verdade que temas inoportunos como aprovar uma proposta que anistia os vândalos e golpistas que praticaram os ataques as sedes dos Três Poderes no dia 08 de janeiro de 2023, se encontra em acelerado crescimento.

A polêmica interferência de outros poderes nas prerrogativas do Poder Judiciário não é fato novo. Pouco tempo faz que o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, propôs ao parlamento (Knesset) um pacote de medidas que deixou preocupado o mundo que prevê medidas que afetam diretamente a Democracia no país judeu. Autoridades intelectuais judaicas, como o cientista político Gideon Rahat, que também é professor da Universidade Hebraica de Jerusalém, considera que a democracia israelense poderá ser vitimada. Principalmente se consideramos que Israel sofre serias restrições em consequência das ocupações de territórios palestinos, reconhecidos pela Organização das Nações Unidas;

Se voltarmos um pouco mais no tempo iremos constatar que em 1934, mais precisamente no dia 5 de dezembro, Adolf Hitler mandou fechar as secretarias estaduais de justiça, desencadeando debates aos profissionais do direito que não se ajustassem aos ideais nazistas. O que era a justiça livre e soberana da República de Weimar se transformou em instrumento de ação e vilipendio do Terceiro Reich. Apenas os homens compunham o Poder Judiciário, espaço vedado as mulheres;

No Brasil os ataques ao Poder Judiciário são recorrentes. Não há como fugir ao que aconteceu lá atrás e nos tempos presentes. No ano de 1882, Floriano Peixoto pressionou os ministros do STF a negarem habeas-corpus impetrado por Rui Barbosa em defesa de generais que se revoltaram contra o governo. A mesma prepotência levou Getúlio Vargas, por decreto, a aposentar seis ministros do STF. Era o ano de 1931;

O Ato Institucional nº 2, alterou substancialmente o número de ministros do STF de 11 para 16. Felipe Recondo no seu livro Tanques e Togas narra que a Suprema Corte tem conquistado prerrogativas e assegurado soberania e independência;

A disfuncionalidade das instituições republicanas é pressionada pela imaturidade da democracia ao longo da história, que, por décadas, sofreu injuções das forças armadas que comprometiam seriamente a instabilidade social pela carência de representatividade democrática. Tamanho desacerto abre espaços para ingerências exóticas, quando, por exemplo, um estrangeiro, no caso Elon Musk, dono do X, incitou a desobediência às ordens judiciais, como entendeu Alexandre de Morais. 

O objetivo a ser alcançado é o fortalecimento das instituições em proveito do bem comum, seu próprio fim.
A defesa que se faz das instituições democráticas não é incondicionada. A má prestação jurisdicional, a condescendência com práticas que desmerecem os valores cívicos e morais do Poder Judiciário não pode ficar à margem do conhecimento público, como aconteceu ultimamente envolvendo tribunais de várias instâncias, em atividades impróprias, reprováveis e não Republicanas;

No chamado Estado Democrático de Direito, João Ubaldo Ribeiro, na sua obra Política, nos ensina que “a ordem urídica rege o comportamento do cidadão, do próprio Estado e das relações entre o Estado e o cidadão” e conclui: o Estado faz três tipos de coisas 1) elaborar as leis, atividade legislativa; 2) aplica as leis a casos particulares – atividade judicial; 3) administra os negócios públicos, executa a lei – atividade administrativa e executiva;

O STF não tem feito outra coisa a não ser aplicar a lei.


* Procurador de Justiça do Ministério Público de Pernambuco. Diretor Consultivo e Fiscal da Associação do Ministério Público de Pernambuco. Ex repórter do Jornal Correio da Manhã (RJ).

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