Ainda estamos na mesma
A premiação dada à atriz Fernanda Torres só reacendera mais a chama da polarização que tomou conta do Brasil, desde o advento da candidatura de Bolsonaro ao cargo presidencial, em 2018, deixando a conclusão de que continuamos “na mesma”, mesmo.
Embora seja inegável que a ideologia política da Premiada e, consequentemente da Produção do Filme, qualquer movimento, seja individual ou coletivo, que se empreenda, quando já é conhecida a ideologia de quem o faz, torna-se inseparável da opinião pública desse “rolo” em que fomos metidos, que é a polarização.
Se eu aqui falar que antes de qualquer conotação política que o Filme tenha impresso, Fernanda Torres, assim como grandes nomes da dramaturgia brasileira, já eram dignos de receber prêmios internacionais, certamente irão dizer que sou “de esquerda”.
Se eu disser que existem tantos outros trabalhos de peso no Cinema, feitos por brasileiros, que mereceriam há mais tempo, uma tão cobiçada premiação lá fora, mas nunca sequer foram indicados, certamente irão dizer que sou “de direita”.
Nem sei onde me meto. Ops! Isso pode me render uma inserção de ser “do centrão”. Vixe Maria! Fica ruim para se posicionar ou, como alguns dizem por aí “está ficando chato viver”.
Então, lá vou eu.
Guardadas todas as proporções (e desproporções), porém, nesse cenário (nada cinematográfico), vou ser “sincerão”, pois ao menos, conscientemente, direi com honestidade: o Prêmio foi “merecidamente” merecido, com o perdão do tencionado pleonasmo.
Se não querem atribuir o mérito à atuação da Atriz, ou ao “pano de fundo” da Obra, são outros quinhentos, mas negar o direito de receber essa tão sovinada Premiação ao Cinema brasileiro, é que constituiria uma negação patriótica.
Basta se fazer uma incursão pela história das nossa produções nas telonas, para se chegar à conclusão de que um Globo de ouro dado ao Brasil (“unzinho”), depois de tantos anos, mais semelha aos prêmios tardios “de arrependimento”, que aqui e acolá são dados a atores e a diretores, negligenciados no ao longo de suas carreiras e, consequentemente, de suas vidas.
Por esse ângulo, ainda é pouco o que recebemos. Nem irei aqui lembrar que, noves fora esse importante Prêmio, há bastante tempo, em 1962, o ótimo “O pagador de promessas”, de Anselmo Duarte, conquistou a Palma de ouro, no Festival de Cannes.
Ainda em 1988, o mesmo Diretor do polêmico “Ainda estou aqui”, conquistou dois “ursos” (premiação alemã), sendo o de ouro para o seu Filme “Central do Brasil” e o de prata para quem? Quem? Raimundo Nonato? Não, embora esse também merecesse. Mas para Fernanda Montenegro. Tal mãe, tal filha!
Não posso esquecer que a extraordinária atriz Marcélia Cartaxo foi a primeira brasileira (paraibana arretada) a trazer um “Urso de prata”, para o Brasil, por sua impecável atuação em “A hora da estrela” (não deixe de conferir), em 1985, isso bem no comecinho do que se passou a chamar de “redemocratização”.
E nem se questionava o mérito naquela década, como hoje, tola e contraproducente(mente), se faz.
Por isso, antes do juízo de valor (e de desvalor) que seja feito, em relação não só a essa oportunidade que o Cinema nacional tivera, nos bastidores internacionais, não faz mal se deixar de lado a ideologia política, que é livre e própria de cada um.
Antes da análise sob o ponto de vista político ou histórico, convém se ater à técnica do trabalho, seja de direção ou de atuação.
Nesse ponto, a Atriz tem de sobra, que não fica nada atrás dos nomes que desbancou na Premiação.
Celebremos, portanto, a conquista, sob o ponto de vista artístico, pois como dizia Friedrich Nietzsche “temos a Arte, para não morrermos de verdade”.
Defensor público de Pernambuco e professor.
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