As questões jurídicas por trás de uma nova identidade visual
A reformulação da identidade visual da Jaguar, uma das marcas mais prestigiadas do mercado automotivo, chamou a atenção do público e gerou polêmica nas redes sociais e na mídia especializada. A marca optou por adotar um novo logotipo com design moderno e abandonar elementos icônicos, como a imagem clássica que fazia referência direta a um jaguar, símbolo de força e dinamismo. Essa decisão, aliada a uma campanha publicitária sem a presença de veículos e focada em inovação e conceitos modernos, dividiu opiniões.
Entre os críticos, destacou-se Elon Musk, CEO da Tesla, que ironizou a campanha com a pergunta: “Vocês vendem carros?”. Esse movimento ousado, que busca reposicionar a Jaguar na era dos veículos elétricos, também levanta importantes questões jurídicas no campo da propriedade intelectual, além de evidenciar os desafios de equilibrar inovação e legado.
Do ponto de vista jurídico, a mudança de identidade visual traz implicações que vão além da comunicação mercadológica. A primeira delas é a necessidade de registro da nova identidade junto aos órgãos de propriedade intelectual. A legislação brasileira exige que alterações significativas em uma marca sejam formalmente registradas para garantir proteção contra usos não autorizados por terceiros. No caso do novo logotipo, esse passo é indispensável para preservar a exclusividade e a integridade da marca.
Outro ponto fundamental é o risco de caducidade associado ao abandono de elementos tradicionais. A ausência de uso contínuo de uma marca registrada por cinco anos consecutivos pode levar à sua caducidade, conforme estabelece a Lei da Propriedade Industrial. No contexto da Jaguar, abandonar completamente o uso de elementos visuais anteriores, como a imagem clássica do jaguar, pode abrir margem para que terceiros contestem esses registros ou tentem se apropriar de características simbólicas da marca. Para evitar isso, a Jaguar deve adotar estratégias que preservem, ainda que de forma limitada, o uso de elementos históricos enquanto consolida sua nova identidade.
A mudança também impacta o status da Jaguar como marca de alto renome, título obtido no Brasil em 2019 por meio de ação judicial. Esse reconhecimento garante proteção especial contra usos não autorizados em qualquer classe de produtos ou serviços, indo além do mercado automotivo. Assim, não só outros fabricantes de veículos, mas empresas de qualquer setor - como moda ou tecnologia - estão proibidas de usar a marca sem autorização, mesmo sem concorrência direta.
Alterações drásticas na identidade visual podem enfraquecer essa proteção, dificultando a manutenção do status de alto renome, que depende do reconhecimento amplo pelo público. Caso a nova identidade não estabeleça rapidamente essa conexão, o reconhecimento jurídico pode ser comprometido. Por isso, a Jaguar deve investir em campanhas que consolidem a nova imagem, fortalecendo sua posição como ícone global e garantindo a obtenção da proteção legal ampliada para a nova marca.
Outro aspecto jurídico relevante é a necessidade de proteger a nova identidade contra diluição e concorrência desleal. A mudança pode abrir espaço para que outras empresas utilizem elementos visuais semelhantes ou explorem a fragilidade inicial de uma nova identidade que ainda não conquistou total reconhecimento público. Monitorar o mercado, registrar variações estilísticas e agir prontamente contra infrações se torna essencial para evitar o enfraquecimento da marca e a confusão no consumidor.
A reformulação da Jaguar evidencia o desafio de equilibrar inovação e tradição no reposicionamento de uma marca histórica. Embora necessária para atrair novos públicos e acompanhar a transição para veículos elétricos, a modernização não pode ignorar o vínculo com consumidores fiéis e a necessidade de preservação de seu valioso patrimônio intangível.
O caso da Jaguar mostra que o rebranding vai além do estético, exigindo uma abordagem jurídica robusta para proteger a nova identidade e o histórico da marca. Em um mercado competitivo, a análise dos aspectos relacionados à propriedade intelectual é essencial para permitir inovação sem perder a essência ou o valor econômico da marca.
*Advogado especialista em Propriedade Intelectual e sócio de Escobar Advocacia.
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