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Cervantes e o tempo

O tempo marca. Como falam, ele é o senhor. Conduz, revela e esclarece. Pode punir ou dadivar, nas circunstâncias da vida, como aconteceu com o escritor Miguel de Cervantes e, consideremos, com o seu livro “O engenhoso fidalgo Dom Quixote de la Mancha” – o criador e a criatura, vida e obra-prima, na formação da ideia até alcançarem a dita universalidade contemporânea. 

No “Quixote”, Cervantes escreveu que [...] “mais força tem o tempo para desfazer e mudar as coisas que as humanas vontades” (Dom Luís, cap. XLIV, I parte). O caso é que a vida do apelidado Manco de Lepanto, de tantas situações adversas, mostra que o tempo foi o seu grande aliado, para superações, e, em simultâneo, a do “Dom Quixote”. A posteridade ratifica isso. 

Em relação ao principal personagem do livro quixotesco, o escritor e crítico literário Jorge Luis Borges afirmou que [...] “poderiam perder-se todos os exemplares do “Quixote”, em espanhol ou em traduções, perder-se todos, mas a figura do Dom Quixote já é parte da memória da humanidade” (Borges & Ferrari, Diálogo I, 2005).

Pois bem, no último dia 29 de setembro, deste ano de 2024, Miguel de Cervantes (Alcalá de Henares – ES, 1547) completou 477 anos de nascimento – o batismo aconteceu no dia 9 de outubro. Anualmente, em torno dessas duas datas, acontecem diversas manifestações culturais para relembrar e homenagear o autor manchego e suas obras literárias e teatrais, notadamente o “Dom Quixote”, em diversos lugares do mundo.

Nas cidades de Alcalá de Henares, berço de Cervantes (“o filho mais ilustre”), e Guanajuato, no México, realizam-se as maiores e mais completas efemérides cervantinas, consideradas múltiplas e de repercussão turística internacional. É bom saber que as duas cidades são Patrimônios Históricos da Humanidade pela UNESCO.

Em Alcalá de Henares, de 8 a 13 de outubro, teremos a Semana Cervantina, com exposições, atos, conferências, oficinas, feiras, shows… Paralelamente, no mesmo período, ocorre o Mercado Cervantino, de modo que a cidade adquire um movimento no estilo da idade média e da época do “Quixote”, o Século de Ouro, com desfiles, torneios e apresentações de personagens, inclusive medievais e das ficções cervantinas; teatro e circo, artesanato e música e uma típica jornada gastronômica.

Em Guanajuato, reconhecida como a Capital Cervantina da América, vai acontecer o longevo 52º Festival Internacional Cervantino, entre os dias 11 e 27 de outubro, com uma programação extensa, de muitos espetáculos ao ar livre, em museus e casas especializadas. São assinalados, em diversos cenários, o cinema, o teatro, a literatura, a música, a dança, a pintura, o artesanato e o folclore.

Nessa temática, entre outros eventos, ainda podemos assistir, via associações e universidades, os seguintes:

- A XIV Jornadas Cervantinas de Azul, na cidade de Azul, Buenos Aires – AR, nos dias 17, 18 e 19 de outubro. 

- As Jornadas Cervantinas de Castro del Rio, em Córdoba – ES, com o título Cervantes: De la Carcel a la Gloria, nos dias 8 e 9 de novembro.

- O II Congresso Internacional Cervantes y el Quijote desde Alcázar, por meio da Sociedade Cervantina de Alcázar, na cidade de Alcázar de San Juan, em Ciudad Real – ES, no dia 9 de novembro. 

- O 18º Festival Cervantino da Argentina, com o lema Sueño y Coraje, de 8 a 18 de novembro, em Azul – AR.   

- O VIII Festival Cervantino Don Quijote de la Mancha, na cidade de Pauza – PE, de 21 a 24 de novembro.  

Enquanto isso, as ações da comunidade cervantina, com o quixotismo em evidência, seguem a dinâmica de leituras, de estudos e pesquisas, de publicações literárias e do colecionismo. Frequentemente, fatos novos e interessantes são divulgados, com dedicação e ética à causa. 

Um desses tópicos é que, na cidade do Rio de Janeiro – BR, há 75 anos foi publicado um pequeno livro (plaquete), “Rui Barbosa e o Dom Quixote” (1949), pela Casa Rui Barbosa, em conjunto com o escritor J. A. Pinto do Carmo.  

Rui Barbosa foi advogado, jurista, político, ministro, diplomata e escritor. Uma pessoa de cultura privilegiada. Membro fundador da Academia Brasileira de Letras (ABL), tinha “em conta especial” o livro “Dom Quixote”, possuindo cinco edições, em que escrevia comentários nas páginas, e outras mais sobre Cervantes.

Em posições mais avançadas, nesse âmbito, o escritor e cervantista José Luis Salinas Rodríguez, em Madrid - ES, propôs a criação do Dia do Quixote. Já o empresário e cervantista Eduardo Reynoso, em Aguascalientes - MX, fundou a “Asociación Internacional de Lectores y Coleccionistas de Don Quijote”. 


* Administrador de empresas (UFPE) e cervantista ([email protected]).

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