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OPINIÃO

Dom Quixote 420 anos e o Recife     

A fim de, simplesmente, somar esforços para difundir e impulsionar o cervantismo no meio recifense e brasileiro, há quase uma década publicamos a crônica Dom Quixote 410 anos e o Recife (22/01/2015). Agora, com alegria, vamos repetir o gesto. O título desta nova é semelhante, mas com o total de anos do aniversariante atualizado, 420; nela vamos expor informações sobre o livro quixotesco e sobre ações cervantinas e reviver alguns pontos da crônica anterior.

Lembrar o aniversário do Dom Quixote é um marco importante. Não apenas pela data em si. Observem que a grandeza do atual universo literário deve-se, em parte, ao livro do escritor Miguel de Cervantes, considerado o pioneiro do romance moderno. Com o passar do tempo, expandida sua compreensão, a magia do Quixote foi incorporada por outros campos da arte e, até, alcançou nossas vidas, como simbolismo.

O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de la Mancha (Primeira Parte) teve a sua primeira edição (princeps) impressa, “com privilégio”, por Juan de la Cuesta, em Madrid, sendo o trabalho concluído em dezembro de 1604. Os livros inéditos foram entregues, para venda comercial, na capital do império, à “casa de Francisco Robles (o financiador), livreiro do Rei”. E assim, no dia 16 de janeiro de 1605, a inimaginável novidade chegou, serenamente, às mãos do público leitor… A partir dessa data, consideremos, o Dom Quixote passou a ser do mundo; a “pertencer a todos os seus leitores”, do ponto de vista interpretativo, como afirmou o pensador Miguel de Unamuno.  

Um fato curioso é que o local do estabelecimento impressor de Juan de la Cuesta manteve seu vestígio, e nele, hoje, na calle Atocha 87, está instalada a “Sociedade Cervantina - Imprenta del Quijote” (uma associação cultural).  

Em relação ao patrimônio literário propriamente dito, a Real Academia (RAE) e a Biblioteca Nacional da Espanha (BNE) são as verdadeiras guardiãs, institucional, do Quixote, que nunca parou de ser editado. Essa perenidade foi vaticinada por um personagem dele, o bacharel Sansón Carrasco, ao falar que “não há de haver nação ou língua onde não se lhe traduza” (Capítulo III, II Parte).  

Com muita responsabilidade, a RAE e a BNE zelam pela história e pelos valores originais do conteúdo das duas partes: O Engenhoso Fidalgo Dom Quixote de la Mancha (Primeira Parte - 52 Capítulos) e Do Engenhoso Cavaleiro Dom Quixote de la Mancha (Segunda Parte - 74 Capítulos). 

Dispondo de uma gestão aprimorada e segura, tanto a RAE como a BNE possuem, em seus acervos bibliotecários, edições princeps da Primeira e da Segunda Parte, impressas por Juan de la Cuesta, e de sucessivas edições publicadas, em várias épocas, em diferentes localidades da Espanha e de outros países. De todas as edições, a mais valorizada é a Princeps da Primeira Parte (segundo pesquisa e monitoramento da BNE, em todo o mundo ainda “conservam 28 unidades” dela). Nesse delicado ambiente de raridades, tudo é bem assinalado, em detalhes.

No tocante à crônica publicada nos 410 anos do Quixote, acompanhem o fragmento que mostra o perfil físico cervantino da cidade do Recife, configurado tendo em conta uma hipotética viagem do Cavaleiro da Triste Figura e seu fiel escudeiro Sancho Pança à nossa terra, fazendo alusão com algumas passagens reveladas no Quixote… Então, os ilustres visitantes manchegos, percorrendo os caminhos recifenses, associaram: Os Montes Guararapes, com a Sierra Morena. O Castelo de São João (do Instituto Ricardo Brennand), com o castelo em que Dom Quixote armou-se Cavaleiro Andante. O Parque da Jaqueira, com a área da Caverna de Montesinos. O Largo dos Manguinhos (Igreja e casario), com o pueblo El Toboso, berço de Dulcinea. O busto do Herói da Pátria Frei Caneca (no Forte das Cinco Pontas), com os ideais de liberdade de Dom Quixote. E a ilha do bairro do Recife Antigo, com a Ilha Baratária, governada por Sancho Pança. …Nesse instante, conversando comigo mesmo, aproveitei a ocasião para incluir, com crédito para esta crônica dos 420 anos, uma associação que o cavaleiro e o escudeiro com certeza fariam, do nosso estimado Rio Capibaribe com o Rio Ebro, onde Dom Quixote e Sancho Pança viveram a “aventura do barco encantado”, nas adjacências de Zaragoza. 

Não custa lembrar que, ainda na cidade do Recife, no período do Dia Mundial do Livro de 2015, em conjunto com o diretor do Instituto Cervantes Recife, Isidoro Castellanos Vega, e com a presidente da Academia Pernambucana de Letras (APL), Fátima Quintas, realizamos uma sessão em homenagem ao IV Centenário da Publicação da Segunda Parte Do Engenhoso Cavaleiro Dom Quixote de la Mancha (que se deu em novembro de 1615), com uma conferência do reconhecido escritor e romancista pernambucano Raimundo Carrero, imortal da APL.

Portanto, celebremos os 420 anos do Dom Quixote de la Mancha. Certamente, eventos devem ocorrer, mundo afora, por meio das tantas associações e sociedades culturais cervantinas existentes e por organizações literárias e aficionados cervantistas.  

Feliz Novo Ano. Viva 2025! 


* Administrador de empresas (UFPE) e cervantista. Autor do livro “Sonho Impossível - O Recife e Cervantes” (2024).

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