TST concede jornada reduzida à mãe de autista, sem redução de salário
O Tribunal Superior do Trabalho (TST), em recente decisão (RR20253-08.2018.5.04.0821), aplicou, por analogia, a regra do Regime Jurídico Único dos servidores públicos federais (Lei 8.112/1990), que possibilita a redução de jornada para o trabalhador que tem filho com deficiência sem a diminuição dos vencimentos. Sob tal fundamento, a 7ª Turma do TST deferiu a redução de jornada diária de oito para quatro horas, de uma trabalhadora que tem filhas autistas, com grau de moderado a severo, e que, portanto, necessitam da presença constante do responsável.
Na avaliação do ministro, se o servidor federal tem a prerrogativa de reduzir a jornada sem perda da remuneração, os empregados celetistas também devem ter tal direito, por analogia, sob pena de violação do princípio da igualdade, previsto na Constituição Federal e na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com deficiência da ONU (CNPD). O relator também destacou que o Supremo Tribunal Federal (STF) já havia estendido essas diretrizes aos servidores estaduais e municipais.
A grande discussão em torno dessa decisão proferida pelo TST, a qual deferiu a redução de jornada sem impacto na remuneração, se deve ao fato de que, de um modo geral, os trabalhadores da iniciativa privada não possuem estabilidade no emprego, salvo as exceções legais. Deste modo, a sociedade indaga: quais seriam os efeitos desta decisão do ponto de vista prático? E quais as possibilidades de “retaliação” do empregador para com o empregado beneficiado pela redução da jornada?
Não podemos esquecer que pode existir uma possibilidade real de insatisfação por parte do empregador e que isso pode ter consequências para o trabalhador. Entretanto, a justiça do trabalho tem atuado de forma atenta para inibir e punir as dispensas discriminatórias, que poderiam se enquadrar na hipótese de que se trata a decisão aqui comentada. De certo que o desligamento do trabalhador estaria diretamente ligado à sua condição de possuir filho diagnosticado com o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e, como tal, ter sido beneficiado com a decisão judicial.
Um trabalhador, nestas circunstâncias, deveria se munir de provas. Isso para o caso de ocorrer uma situação de assédio moral ou mesmo demissão, para que ele possa provar na justiça, através de seu advogado, que faz jus à reparação, pelo fato da dispensa ser presumidamente discriminatória.
O artigo 1º da Lei 9.029/1995 proíbe qualquer prática discriminatória e limitativa para acesso ou manutenção da relação de emprego, por motivo de sexo, origem, cor, estado civil, situação familiar e idade. Podendo-se ainda incluir qualquer outro motivo capaz de modificar a igualdade de oportunidades ou de tratamento no âmbito das relações de trabalho, sem justificativa plausível, com violação do princípio da isonomia.
Um dos princípios fundamentais da República Federativa do Brasil é o valor social do trabalho, que, aliado aos pilares da dignidade do ser humano, da não discriminação e da função social da empresa (artigos 1º, III e IV, 3º, IV, 5º, I e XLI, 6º, 7º, I, XXX e XXXI, 170, III, VIII e 193, da Constituição), proíbem a dispensa discriminatória.
É evidente que o empregador tem o poder de dispensar os empregados quando lhe convém. Entretanto, não pode agir de maneira a discriminar trabalhadores, devendo respeitar o princípio da dignidade humana. Deste modo, o exercício do direito indiscutível do empregador - de rescindir o contrato de trabalho - não é absoluto, encontrando seu limite no abuso, que pode se caracterizar de diversas formas, destacando-se, entre elas, a dispensa com intuito discriminatório.
*Advogada especializada em Direito do Trabalho e coordenadora jurídica do Escritório Robson Menezes Advogados