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Você precisa mesmo de uma nova marca?

Um dos temas mais recorrentes no mundo corporativo diz respeito a reposicionamento ou rebranding (expressão em inglês que vem de brand, marca). Muitas vezes, ele é necessário por conta de fusões e aquisições. Por outras, por um abalo sísmico de reputação. Talvez seja mandatório para uma expansão. Ou cogitado porque a empresa está em um ponto de inflexão, tendo de equilibrar a consistência da atuação passada com a inovação para manter a relevância futura.

Mas, apesar de frequente, o tema nem sempre é abordado com a profundidade necessária. Ideias preconcebidas podem dificultar o entendimento e as expectativas, tanto quanto ao processo, que não é simples, como quanto a resultados, nem sempre rápidos, tampouco a panaceia contra todos os males. Quando se precisa ajustar a percepção da marca no mercado, é preciso ter em mente que não se trata de algo corriqueiro, rápido e barato. Nem sem riscos.

Às vezes, a mudança não “cola” no prazo pretendido e o consumidor segue chamando a empresa ou produto pelo nome antigo. Pior: nem percebe diferença no novo posicionamento. Em outros casos, a mudança é tão radical que se perde parte da “memória afetiva” e, com ela, uma parcela de um público já fidelizado – algo ainda mais grave se os novos consumidores não aparecem. Em outros exemplos, a adaptação é mais rápida e fluída – em geral porque a mudança se ancorou em dados, em ouvir o cliente.

Saber o que os clientes – e aqueles que poderiam ser clientes, mas não são - pensam e querem da empresa ou do produto é crucial. Em igual medida, é preciso pleno entendimento do que se quer com um novo nome ou posicionamento. Uma coisa é certa: seja mantendo a essência da identidade ou realizando transformações profundas, que podem incluir mudanças na marca e na cultura organizacional, o tempo é relativo no processo.

Se algumas marcas abandonadas são rapidamente esquecidas, outras, trocadas há anos, ainda ressoam na memória de uma parcela do mercado - uma pesquisa rápida certamente mostrará que ainda há quem lembre de Kolynos, Yopa, Corona, Nextel ou Arisco, por exemplo. Claro que às vezes a mudança de nome é sutil: um pronome que cai, uma palavra encurtada, uma sigla que surge. Com maior ou menos sucesso, é o caso de Vale (antes “Vale do Rio Doce”), Ponto (antes “Pontofrio”), Magalu (antes Magazine Luiza) e LATAM (antes “TAM”).

Há, ainda, casos bem mais complexos, em que, na balança do que é positivo ou negativo, a marca pode até ser mantida. O que muda é o posicionamento, o que ela representa. É o caso da Abercrombie & Fitch, que estampou há algumas semanas a prestigiada The Economist. As ações da empresa, que já foi considerada tóxica, subiram 274% no ano passado. Sem mexer no nome, foi nos bastidores que aconteceu uma das mais notáveis transformações da indústria da moda.

A empresa viveu a rejeição por dizer aos consumidores o que eles "deviam" querer. Ao trocar a abordagem impositiva por uma escuta atenta e usar dados para entender as preferências dos consumidores, recuperou a relevância. O exemplo mostra que, para conquistar uma nova percepção, seja no reposicionamento ou no rebranding, é preciso um mergulho profundo. E fôlego para fazê-lo.

Podem ser necessárias novas práticas e condutas que, aí sim, sustentarão a nova narrativa e imagem. De nada adianta nova marca ou campanha publicitária recheada de promessas, se a empresa não repensar a jornada e a experiência de seus clientes. Nem “banho de loja" basta para substituir a renovação do portfólio de produtos às vezes crucial. Também não haverá milagres se a forma como, quando, onde ou a que preço produtos e serviços são oferecidos, não estiver alinhada aos anseios, expectativas, percepção de valor e comportamentos do público-alvo.

Incremental ou disruptiva, a mudança dependerá dos objetivos e do contexto de cada empresa. Mas é preciso ter clareza quanto ao que se busca em um reposicionamento e se a mudança de marca é de fato necessária. Há várias boas razões para fazê-lo. Só não pode ser feito por algum motivo trivial. Porque exige investimento constante, tempo de maturação e, muitas vezes, uma transformação transversal que envolve do jurídico ao comercial, do financeiro ao industrial, e não só o marketing. Muitas vezes, o problema não está na marca, mas na gestão...
 

* Vice-presidente de Marketing da Falconi.

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