Organizações acusam governo Milei após mortes de lésbicas em ataque incendiário na Argentina
Ativistas e grupos voltados à população LGBTQIA+ afirmam que novo governo promove discurso de ódio contra minorias e diminui representatividade
Em uma nova frente de pressão, o presidente da Argentina, Javier Milei, e seu governo estão sendo acusados de fomentar a intolerância contra pessoas LGBTQIA+, após um triplo-homicídio em Buenos Aires causar comoção e ser apontado como um crime de ódio por ativistas, opositores e organizações de direitos humanos, voltado contra mulheres lésbicas.
Três mulheres morreram e uma quarta ficou ferida após um idoso de 67 anos atear fogo ao quarto de pensão onde viviam, no bairro de Barracas, na capital argentina, na segunda-feira da semana passada.
Testemunhas ouvidas pelo jornal La Nación disseram que o ataque aconteceu após uma discussão, mas que o homem, que vivia em um quarto em frente ao das mulheres na pensão, fazia repetidamente comentários ofensivos a elas, que formavam dois casais.
Ele foi preso ao tentar suicídio após se evadir do local. Uma das mortas, segundo informação do mesmo jornal, estava grávida.
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O caso motivou uma série de protestos contra a violência de gênero no país e o contra o discurso de ódio que ativistas acusam o governo de fomentar. Um protesto na semana passada, perto do Congresso argentino, exigia justiça pelas vítimas.
Dois dias antes, cerca de cem pessoas se reuniram em frente à pensão e acenderam velas em uma vigília improvisada em memória das vítimas.
O ataque foi classificado como um crime de ódio pelo Ministério da Mulher da Província de Buenos Aires — governada por Axel Kicillof, opositor de Milei e um dos principais nomes da oposição — e pela Federação Argentina LGBT+. As entidades vincularam o ataque ao contexto de cerceamento da população LGBTQIA+.
"Este crime de ódio, não é um fato isolado e se enquadra nos discursos que são repetidos irresponsavelmente pelo governo nacional", escreveu o órgão ministerial de Buenos Aires.
Desde que assumiu o poder, em dezembro do ano passado, Milei fechou o Ministério das Mulheres, o Instituto Nacional contra a Discriminação e proibiu a linguagem inclusiva em todas as comunicações da administração pública. Ele também mantém uma retórica hostil a movimentos que defendem a diversidade. Anteriormente, definiu o feminismo como "uma luta ridícula e antinatural entre o homem e a mulher".
— O ataque é um dos crimes de ódio mais cruéis dos últimos anos e ocorre em um contexto em que o discurso de ódio está aumentando em todo o país — disse María Rachid, líder da Federação Argentina LGBT+, ao jornal britânico The Guardian.
A Federação ainda disse que os únicos espaços para vítimas de ataques homofóbicos “estão sendo esvaziados ou eliminados pelo atual governo”.
Dúvidas e críticas
O porta-voz de Milei, Manuel Adorni, foi criticado ao se pronunciar sobre o ataque. Embora tenha classificado o caso como “terrível”, ele ponderou que “não gostaria de o definir como um ataque contra um determinado grupo”.
O caso ainda está sob investigação e uma acusação não foi formalmente apresentada contra o idoso por crime de ódio — um agravante ao crime de homicídio pela lei argentina. Fontes policiais e testemunhas da pensão ouvidas pelo La Nación colocaram em xeque a versão defendida pelas organizações.
Embora testemunhas ouvidas pelo mesmo jornal inicialmente tenham dito que o idoso costumava ofender as mulheres por serem lésbicas — com ofensas que incluíam 'monstros', por suas opções sexuais —, outras pessoas presentes no local disseram desconhecer xingamentos anteriores e disseram que a discussão teria começado porque o agressor se incomodou com o barulho no apartamento das mulheres.
Ainda não há consenso sobre o modus operandi do crime. A polícia informou ter encontrado uma lata de tinta, um frasco de solvente e um trapo embebido em líquido altamente inflamável. Testemunhas relataram que ele teria impedido as mulheres de saírem do local após o início do incêndio.