"Os homens vão cair a seus pés", ouviu mulher convencida a fazer cirurgia por médico preso
Mulher afirma que ficou deformada após os procedimentos estéticos e agora move um processo em que pede R$ 100 mil como reparação
Depois de ter seis filhos, a cozinheira Dulcinéia Ferreira Costa, de 56 anos, queria levantar a autoestima. Em 2019, ela decidiu colocar uma prótese de silicone e fazer uma abdominoplastia com o cirurgião plástico Bolívar Guerrero Silva, de 63, preso na semana passada acusado de manter uma paciente em cárcere privado por mais de 50 dias no hospital no qual é diretor médico.
O sonho, no entanto, virou pesadelo. Ela afirma que ficou deformada após os procedimentos estéticos e agora move um processo em que pede R$ 100 mil como reparação. A história de Dulcinéia vem à tona após outras dezenas de possíveis vítimas procurarem a Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, para denunciar o especialista.
-- Eu não conheci ele pela internet ou por amigas. Eu estava em uma loja, em Caxias, e tinha uma mulher comentando sobre ele. Porque toda mulher comenta essas coisas. Ela estava mostrando umas fotos e dizendo que tinha perdido não sei quantos quilos, tinha feito uma abdominoplastia com ele e que anos depois a barriga dela estava perfeita. Então, eu decidi pegar o contato com essa pessoa -- lembra Dulcinéia, que foi até o médico para fazer uma consulta:
-- Como sou uma mulher de 1 metro e 46 centímetros, eu queria diminuir a minha mama. Primeiro, porque eu achava ela grande. Então, eu queria colocar silicone e reduzi-la, deixar pequenininha. Então, eu fiz abdominoplastia e mama.
Leia também
• Paciente relembra cárcere privado em hospital após cirurgia plástica mal sucedida
• Cirurgião acusado de cárcere privado tem prisão temporária renovada
• Paciente internada por cirurgião preso será transferida para o Hospital Federal de Bonsucesso
Na ocasião, para induzir a cozinheira a fazer a plástica, Bolívar teria dito que “os homens cairiam sobre seus pés”. Ela conta que o primeiro contato com o cirurgião foi positivo. A mulher diz também que foi incluída em um grupo de troca de mensagens com várias pacientes e que ficou confiante no trabalho. Contudo, segundo ela, o primeiro sinal de alerta aconteceu no pré-operatório. Dulcinéia estranhou que não recebeu muitas orientações do médico sobre como se preparar para a operação.
-- Eu me cuidei sem ele falar nada, durante quatro meses. Era um sonho e eu não podia botar a perder. Tomei vitamina C, não fumei, não bebi, não dormia tarde, eu fazia exercício e perdi peso. O máximo que eu pude perder até o dia da cirurgia, mas não foi porque ele pediu, porque ele não pede. Se você chegar lá com 100 quilos, ele te opera com 100 quilos. Mas eu perdi justamente para tentar tirar bastante excesso de pele, mas infelizmente não aconteceu isso -- relembra a cozinheira.
'Ele não prestou assistência em nenhum momento'
Dulcinéia afirma que a frustração completa e o desespero vieram após a região operada desinchar. O desejo de conseguir ficar com o corpo bonito, assim como o médico havia prometido, virou um drama. O resultado, alega a paciente, foi um dos seios torto e excesso de pele na região da cintura.
-- No início eu achei que era só inchaço e ia melhorar. Mas depois que desinchou eu vi que o peito estava pendurado e que a barriga estava feia. Hoje, eu estou com uma prótese que fica pendurada no meu peito e com excesso de pele. A minha abdominoplastia foi como se eu não tivesse feito nada. E ele não prestou assistência em nenhum momento. Eu quero que ele não exerça mais a profissão -- pede.
Dulcinéia, que pagou os dois procedimentos com a ajuda do ex-marido – a plástica saiu por R$ 14.700 --, afirma que, quando foi buscar explicações com o cirurgião pelo resultado indesejado, ainda teve que ouvir "deboche" no Hospital Santa Branca. O médico teria cobrado mais R$ 4 mil para fazer uma cirurgia reparatória.
-- Eu me recusei a pagar e por isso coloquei ele na Justiça – destaca a cozinheira.
O advogado Starlei Calvosa da Silva é quem defende a ex-paciente e outras 19 mulheres que teriam sido vítimas do médico. Ele destaca que tentou um acordo com Bolívar e a unidade de saúde para evitar uma ação judicial. Entretanto, em janeiro desse ano, o profissional decidiu abrir um processo contra o médico na 7ª Vara Cível de Duque de Caxias. Calvosa pretende conseguir uma indenização pelos danos causados em sua cliente e pela frustração que Bolívar causou.
-- Nós estamos pedindo R$ 100 mil reais por todo o dano causado, por toda a expectativa e frustração que foi empregada no procedimento estético – afirma o advogado, que completa: -- O valor é uma forma de punir o médico e o hospital para que eles não voltem agir com irresponsabilidade novamente.
‘Eu vejo essas denúncias com bastante ressalvas’, diz advogado de médico preso acusado de manter paciente em cárcere privado e que agora é investigado erros em cirurgias
Defesa diz ver denúncias com ressalvas
A nova defesa do cirurgião plástico Bolívar Guerrero Silva diz que “é preciso investigar com cuidado” os casos de mulheres que têm procurado a Deam de Duque de Caxias para relatar supostos erros médicos cometidos pelo especialista durante procedimentos. Segundo o advogado Renato Darlan Camurati de Oliveira, que defende o equatoriano, “eventualmente pode ter havido algum erro”. Entretanto, afirma ele, essas mulheres precisam passar por uma avaliação:
-- Eu vejo essas mulheres procurando a Deam com bastante ressalvas. Só hoje (ontem) vi três supostas vítimas fazendo registro lá na delegacia. Mulheres reclamando de cirurgias de seis, oito, dez anos atrás. Existe um prazo legal para esse tipo de reclamação e acredito que essas mulheres são avaliadas. A delegada (Fernanda Fernandes, titular da Deam Caxias) é competente e não empurra o problema para o Ministério Público e para a Justiça. É lógico que eu não posso e nem tenho aptidão para julgar cada caso mesmo momento. Mas cada caso terá de ser avaliado especificamente – diz Renato Darlan, que continua:
-- Eventualmente, pode ter havido algum erro. Mas agora não posso fazer essa avaliação. Entretanto, existe muita gente querendo aproveitar da situação. Mas não sei de cada caso. O doutor Bolívar é uma pessoa de boa memória. Você dá um nome para ele, e ele sabe te dizer o procedimento e te explica tudo. Então, cada caso que aparece vamos ter que conversar com ele e entender o que aconteceu. Entender o que é aproveitamento e o que não é. O que me parece é que tem muita gente querendo se beneficiar com isso.