Ozempic: semaglutida reduz o desejo pelo excesso de bebidas alcoólicas, diz novo estudo; entenda
Acompanhamento de centenas de milhares de pessoas indicou uma redução de até 56% em novos casos e na recorrência do diagnóstico
A semaglutida, princípio ativo do Ozempic e do Wegovy, foi associada a uma incidência e recorrência de casos de transtorno por uso de álcool de 50% a 56% menores em novo estudo publicado na revista científica Nature Communications. Os remédios da farmacêutica dinamarquesa Novo Nordisk são destinados oficialmente ao tratamento da diabetes tipo 2 e da obesidade, respectivamente, mas são conhecidos pelo amplo uso para perda de peso.
O trabalho foi conduzido por pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade Case Western Reserve, nos Estados Unidos. Eles explicam que relatos de pacientes que após o uso dos medicamentos tiveram um desejo reduzido por bebidas alcoólicas têm despertado o interesse de cientistas.
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Para investigar essa relação, eles analisaram dados de registros eletrônicos de saúde disponíveis em bancos de dados americanos. Inicialmente, selecionaram 83.825 pacientes com obesidade que não tinham diagnóstico prévio de transtorno por uso de álcool.
Os indivíduos escolhidos receberam uma primeira prescrição para a semaglutida ou para outros medicamentos para obesidade, como naltrexona ou topiramato, entre junho de 2021 e dezembro de 2022.
Os pesquisadores acompanharam cada paciente por um período de 12 meses e analisaram a ocorrência de novos diagnósticos do transtorno entre os diferentes tratamentos. Os resultados mostraram que entre aqueles que faziam uso da semaglutida houve uma incidência 50% menor do transtorno.
Essa redução foi consistente entre gêneros, idades e etnias, e de forma ainda mais pronunciada num subgrupo de pacientes que também tinham diabetes tipo 2, de menos 56%.
“Essa é uma notícia muito promissora, pois podemos ter um novo método terapêutico para tratar o transtorno por uso de álcool”, diz Rong Xu, professor de informática biomédica da universidade e principal pesquisador do estudo, em comunicado.
Em seguida, os cientistas fizeram uma análise semelhante com 4.254 indivíduos que já tinham um diagnóstico prévio do transtorno, para avaliar uma possível redução na recorrência. Os resultados indicaram um efeito positivo da semaglutida, com também 56% menos casos recorrentes.
Diante do potencial, os responsáveis decidiram investigar se esses números seriam replicados ao observar uma população que fazia uso da semaglutida exclusivamente para tratar diabetes tipo 2. Para isso, selecionaram 598.803 pessoas sem diagnóstico prévio do transtorno, e 22.113 que tinham um histórico da doença. Todas iniciaram o tratamento entre dezembro de 2017 e maio de 2021.
O acompanhamento de 12 meses mostrou que aqueles que utilizavam a semaglutida tiveram uma redução de 44% no número de novos casos de consumo excessivo de álcool, e de 39% na recorrência, reforçando o efeito do medicamento.
Os dados são animadores, já que a Pesquisa Nacional sobre Uso de Drogas e Saúde dos Estados Unidos, de 2021, mostrou que 29,5 milhões de americanos, ou seja, 10,6% de todos com 12 anos ou mais, têm um diagnóstico do transtorno – definido como um padrão problemático do consumo de álcool que leva a comprometimento ou sofrimento clinicamente significativos.
Um estudo na revista científica Lancet estima cerca de 80 mil mortes por ano no país norte-americano ligadas ao diagnóstico. No Brasil, segundo dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, foram 8.479 óbitos associados oficialmente a "transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de álcool" em 2022.
Porém, muitas vezes o alcoolismo não é indicado como causa da morte, e o Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa) estima que cerca 69 mil brasileiros tenham falecido em 2021 por causas totalmente ou parcialmente atribuíveis ao álcool.
Apesar da dimensão do problema, há poucas medicações destinadas ao tratamento do quadro. Agora, os novos resultados sugerem que a classe de medicamentos da qual a semaglutida faz parte, os análogos de GLP-1, podem ser uma nova alternativa.
Mas, para isso, serão necessários estudos clínicos randomizados, que dividem pacientes entre placebo e o remédio, para avaliar de forma robusta a eficácia e a segurança, lembra a também autora do estudo Pamela Davis:
“Embora as descobertas sejam promissoras e forneçam evidências preliminares do possível benefício da semaglutide no transtorno em populações do mundo real, são necessários mais ensaios clínicos randomizados para apoiar seu uso clínico".