Países aprovam regras para transações de carbono entre países na COP29
Nações mais ricas poderão cumprir suas metas climáticas pagando aos países da África e Ásia
Os países ricos poderão cumprir suas metas climáticas pagando aos países da África ou da Ásia ao invés de reduzir suas próprias emissões de gases de efeito estufa, após a adoção, neste sábado (23), de novas regras na COP29.
A decisão, tomada pelos países reunidos na conferência da ONU sobre mudanças climáticas, em Baku, no Azerbaijão, foi recebida com aplausos e chegou após três anos de um debate espinhoso sobre o comércio de créditos de redução de emissões de carbono.
Até agora, os créditos de carbono foram usados principalmente por empresas que queriam reduzir suas emissões, a fim de se apresentarem como companhias com um balanço de emissões de carbono neutro, e o fizeram em um mercado alheio à normativa internacional e marcado por muitos escândalos.
Mas, a partir de agora, para alcançar suas metas climáticas, os países - principalmente os ricos, mais contaminantes - poderão comprar créditos de carbono ou firmar transações diretamente com outros países com melhores ações inclusivas não previstas em seus próprios objetivos.
Esta possibilidade estava prevista no artigo 6.2 do Acordo de Paris de 2015, e a decisão deste sábado se tornará efetiva. Vários especialistas dizem temer que estes mecanismos permitem que os Estados se declarem menos contaminantes do que realmente são, criando uma maquiagem verde ou "greenwashing" em larga escala.
No entanto, os países em desenvolvimento, principalmente africanos e asiáticos, contam com estas transações para obter financiamento internacional.
Suíça, a pioneira
Os países ricos financiariam atividades que reduziriam as emissões de gases de efeito estufa nos países mais pobres, como plantio de árvores, substituições de veículos com motor a combustão por elétricos ou a redução do uso do carvão. Em seguida, registrariam em seu próprio balanço de carbono a redução correspondente de emissões.
Antes mesmo da aprovação dos países-membros da ONU, já tinham sido assinados 91 acordos bilaterais, especialmente por Japão, Coreia do Sul e Singapura, para 141 projetos piloto, segundo dados das Nações Unidas de 7 de novembro.
A Suíça assinou um acordo com Gana para reduzir suas emissões de metano procedentes de resíduos, e um pacto com a Tailândia para financiar uma frota de ônibus elétricos em Bangcoc. Esta é a única transação realizada no momento.
“Temos a possibilidade de uma redução [de emissões] no exterior e, ao mesmo tempo, ajudar [estes países] é uma [operação] na qual todos ganham”, disse na COP29 o ministro do Meio Ambiente da Suíça, Albert Rösti.
Ameaça
Os promotores das transações de carbono ressaltam que elas permitem gerar receita nos países em desenvolvimento. Mas, seus críticos temem que, com eles, os países se dediquem mais a revisar verificações ao invés de reduzir as emissões em seus territórios.
“Esta é a maior ameaça contra o Acordo de Paris”, disse à AFP Injy Johnstone, pesquisadora especializada em neutralidade de carbono na Universidade de Oxford e que acompanhou de perto as negociações finais em Baku. Seu temor é que muitos países “se apoiem nele para alcançar” seus objetivos.
Projetos à espera
Paralelamente a este sistema descentralizado, existirá outro sistema - centralizado - de Estados a Estados de intercâmbios de créditos de carbono, aberto tanto para os países quanto para as empresas, conhecido com o nome de "artigo 6.4" no jargão da ONU.
No primeiro dia da COP29, os países adotaram novas normas que enquadraram este mercado, com o que foram cumpridas como padrões melhorados, sob a supervisão de um Órgão das Nações Unidas.
“O mercado poderá começar a andar, há muitos projetos à espera”, explicou à AFP Andrea Bonzanni, do organismo IETA (International Emissions Trading Association), que reúne mais de 300 membros, incluindo empresas de energia como BP e TotalEnergies.
Apesar do impulso dado na COP29, vários especialistas duvidam que a qualidade dos créditos de carbono irá aumentar realmente nestes mercados regulamentados.
Segundo Erika Lennon, advogada no Centro para o Direito Internacional do Meio Ambiente (CIEL, na sigla em inglês), será preciso ver se estes mercados "não criariam ainda mais problemas e escândalos que os mercados voluntários de carbono", isto é, os mercados não regulamentados entre empresas.
Vários estudos demonstraram a ineficiência de muitos projetos que tinham certificados de organismos privados pouco específicos, às vezes em detrimento da população local.