Panamá e EUA firmarão convênio para repatriar migrantes que cruzarem o Darién
A floresta do Darién, com 575 mil hectares, na fronteira entre Panamá e Colômbia
O presidente eleito do Panamá, José Raúl Mulino, que assumirá o cargo na próxima semana, anunciou nesta sexta-feira (28) que assinará um acordo com os Estados Unidos para repatriar conjuntamente os migrantes que cruzam a inóspita floresta do estreito de Darién, na fronteira com a Colômbia.
O documento, segundo Mulino, será assinado na segunda-feira em uma reunião com o secretário de Segurança Nacional dos Estados Unidos, Alejandro Mayorkas, que visitará o Panamá para a posse do novo presidente.
"Neste dia, espero assinar um acordo com os Estados Unidos, respeitoso e digno, para que entre os dois países iniciemos os processos de repatriação de todas essas pessoas que estão aqui amontoadas", afirmou Mulino ao visitar o Centro de Recepção Temporária para Migrantes de Lajas Blancas, na província de Darién, cerca de 250 km a leste da Cidade do Panamá.
No entanto, o presidente eleito, que percorreu o local acompanhado por futuros ministros e conversou com vários migrantes, não adiantou detalhes sobre o acordo.
"Eu vi crises em Darién de outra dimensão, mas esta ultrapassou todos os limites. Não consigo e parte meu coração ver crianças da idade dos meus netos pedindo uma garrafa de água", acrescentou, ao anunciar que denunciará internacionalmente a crise migratória enfrentada pelo seu país.
A floresta do Darién, com 575 mil hectares, na fronteira entre Panamá e Colômbia, tornou-se um corredor para os migrantes que, partindo da América do Sul, tentam chegar aos Estados Unidos em busca de oportunidades de trabalho.
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Em 2023, mais de 520 mil pessoas cruzaram esta rota, enfrentando perigos como rios caudalosos, animais selvagens e grupos criminosos. Muitos morrem durante o trajeto.
"Sonho do inferno"
"Se fecham um lado, abre-se outro", afirmou horas antes da visita de Mulino o migrante venezuelano Jeison Chacín, após cruzar o Darién.
O homem, de 26 anos, relatou, como outros migrantes, episódios difíceis vividos na hostil selva: "Vimos um caso onde estupraram uma menina de quatro anos e o pai quis dizer algo e levou um tiro. Ali acontece de tudo".
Em busca do "sonho americano", o Darién "é o sonho do inferno", declarou à AFP no abrigo de Lajas Blancas.
Durante a campanha eleitoral, Mulino, um advogado conservador de 65 anos, prometeu "fechar" o Darién à migração, embora depois tenha dito que realizaria deportações em massa.
Em 11 de junho passado, os Estados Unidos anunciaram que estenderão a essa vasta floresta uma unidade especializada no combate ao tráfico de pessoas, criada em 2021 e que operou em Honduras, Guatemala, El Salvador e México.
"Não gostaria que me deportassem depois de ter passado por uma jornada tão difícil pelo Darién, e isso não recomendo a ninguém (...), ser deportado depois de ter chegado aqui seria muito doloroso", declarou à AFP Jerson Salcedo, venezuelano de 30 anos que viaja com quatro filhos, entre 4 e 9 anos.
Colômbia diz "não" ao fechamento
Em Lajas Blancas, as estradas são de terra e os migrantes dormem em barracões de madeira em colchões no chão, entre roupas penduradas. Do lado de fora, há banheiros comunitários ao lado de um pequeno chuveiro e duchas improvisadas.
No local, os migrantes recebem atendimento médico e serviços básicos do governo e de diversas organizações internacionais.
Eles chegam em viagens organizadas em canoas, após serem detectados pelas autoridades panamenhas assim que cruzam a floresta do Darién, uma travessia que leva de quatro a seis dias desde o território colombiano.
"A Colômbia obviamente não concordaria com o fechamento das fronteiras e muito menos obviamente a fronteira do Darién, porque vemos que, pelo contrário, o que temos que oferecer são saídas mais humanitárias para a população que atravessa essa área", assegurou no mês passado à AFP o ministro das Relações Exteriores colombiano, Luis Gilberto Murillo.
"Queremos seguir em frente"
Durante sua odisseia, Chacín diz ter visto "muitas mulheres chorando com os pés machucados" de tanto caminhar. Ele deixou a Venezuela há sete dias, onde ganhava a vida comprando e vendendo animais.
"Entende-se que, como presidente, [Mulino] zele pelo seu país, mas é complicado fechar a fronteira porque nós também queremos seguir em frente", comentou à AFP também a colombiana Angélica Páez.
Até agora 200 mil migrantes - dois terços venezuelanos, mas também equatorianos, colombianos, chineses e haitianos - atravessaram a floresta neste ano, um número ligeiramente superior ao registrado no mesmo período do ano passado.