Pandemia agrava desigualdades na educação, alerta Unesco
Enquanto filhos de famílias com recursos puderam continuar estudando em casa usando computadores portáteis, celulares e internet, milhões de estudantes ficaram completamente desconectados
A pandemia do novo coronavírus, que já tinha causado problemas sem precedentes em sistemas escolares, afeta ainda mais o acesso à educação de estudantes pobres, jovens e alunos portadores de deficiência, adverte a Unesco em um relatório divulgado nesta terça-feira (23).
Em um informe avassalador, a Unesco afirmou que 260 milhões de crianças não tiveram acesso à educação em 2018, embora as disparidades tenham aumentado com a pandemia do novo coronavírus. As crianças das comunidades mais pobres, assim como as meninas, as portadoras de deficiência, os imigrantes e as minorias étnicas estavam em clara desvantagem educacional em muitos países, destaca a entidade sediada em Paris.
Em 2018, "258 milhões de crianças e jovens foram completamente excluídos da educação, sendo a pobreza o principal obstáculo para o acesso", ressaltou o informe. Isto representou 17% de todas as crianças em idade escolar, a maioria deles na Ásia meridional e central e na África subsaariana.
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Este quadro se agravou com a pandemia do novo coronavírus, que afetou mais de 90% da população estudantil mundial devido ao fechamento das escolas, segundo o informe. Enquanto filhos de famílias com recursos puderam continuar estudando em casa usando computadores portáteis, celulares e internet, milhões de estudantes ficaram completamente desconectados.
"As lições do passado - como como o ebola - demonstraram que as crises sanitárias podem deixar muitos para trás, particularmente as meninas mais pobres, muitas das quais nunca voltarão à escola", escreveu a diretora-geral da Unesco, Audrey Azoulay, no prólogo.
Marginalizados
O informe apontou que nos países de renda média e baixa, os adolescentes dos lares 20% mais ricos tinham três vezes mais possibilidades de completar a primeira parte do ensino médio até os 15 anos do que os dos lares pobres. As crianças portadoras de deficiência tinham 19% menos probabilidades de alcançar um domínio mínimo de leitura em dez destes países.
Em 20 países pobres, principalmente na África subsaariana, quase nenhuma menina da zona rural completa o ensino médio, destacou a entidade. Enquanto isso, nos países mais ricos, as crianças com até dez anos que receberam educação em um idioma diferente à sua língua materna tiveram uma pontuação 34% menor do que a dos falantes nativos nas provas de leitura.
Nos Estados Unidos, os estudantes LGBTI tinham quase três vezes mais probabilidade de ficar em casa porque não se sentiam seguros. "Infelizmente, os grupos desfavorecidos são postos à margem dos sistemas educacionais, através de decisões sutis que conduzem à exclusão dos planos de estudo, objetivos de aprendizado irrelevantes, estereótipos nos livros de texto, discriminação na dotação de recursos e avaliações, tolerância à violência e negligência das necessidades", destaca o informe.
Segregação educacional
Dois países africanos ainda proíbem meninas grávidas de irem à escola, 117 países permitem o casamento infantil e 20 ainda não ratificaram uma convenção internacional que proíbe o trabalho infantil. Trezentas e trinta e cinco milhões de meninas frequentaram escolas que não proporcionaram serviços de água, saneamento e higiene de que precisam para permanecer em aula enquanto menstruam.
Em vários países da Europa central e oriental, crianças romenas ou ciganas são segregadas nas escolas convencionais. E na Ásia, pessoas deslocadas como os rohinyas são ensinadas em sistemas separados. "Muitos países ainda praticam a segregação educacional, o que reforça os estereótipos, a discriminação e a alienação", diz o informe.
"Apenas 41 países em todo o mundo reconheceram oficialmente a linguagem de sinais e em todo o mundo as escolas estavam mais ansiosas por obter acesso à internet do que a atender os estudantes portadores de deficiência", aponta o documento.
A Unesco instou os países a se concentrarem nas crianças desfavorecidas, quando as escolas voltarem a abrir depois do fechamento provocado pela pandemia do novo coronavírus. "Para enfrentar os desafios do nosso tempo, é imperativo avançar para uma educação mais inclusiva", disse Azoulay. "Não agir atravancará o progresso das sociedades", reforçou.