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Irã: projeto de lei que prevê até dez anos de prisão para iranianas sem véu em público, é aprovado

Projeto de lei estabelece que violação da norma de vestimenta atrairá punição de 'quarto grau'; aprovação final depende de Conselho Guardião

Uso de véuUso de véu - Foto: AFP

O Parlamento iraniano aprovou nesta quarta-feira um projeto de lei que endurece as penas para meninas e mulheres que não usarem o véu obrigatório em locais públicos.

"O apoio à cultura da Castidade e do Hijab", que terá um tempo experimental de três anos, estabelece que aquelas que forem denunciadas ou apanhadas violando o código de vestimenta iraniano sofrerão punição de “quarto grau” — o que significa multas de até US$ 7,3 mil ou entre cinco e dez anos de prisão.

‘O véu tem que ser uma opção!’, clamam iranianas em Teerã

O texto foi aprovado por 152 contra 34 votos quatro dias após o primeiro aniversário da morte da curda Mahsa Amini, de 22 anos. Após ter sido detida em Teerã por supostamente violar o rigoroso código de vestimenta para as mulheres, Amini morreu em 16 de setembro do ano passado, ainda sob custódia da polícia da moralidade.

A medida, que ainda precisa ser endossada pelo Conselho Guardião antes de se tornar lei, também prevê punição de "quarto grau" para pessoas que não se vestirem “adequadamente”.



Para homens, isso significa roupas "que mostrem partes do corpo abaixo do torso, acima dos tornozelos ou ombros nus", enquanto, para as mulheres, vestimentas "reveladoras ou apertadas, ou que mostrem partes do corpo abaixo do percoço, acima dos tornozelos ou antebraços nus", informou a rede Al-Jazeera.

Há ainda multas para quem “promover a nudez” ou “zombar do hijab” nos meios de comunicação e nas redes sociais, assim como punições financeiras e proibição de deixar o país para proprietários de empresas cujas funcionárias não utilizem o véu. Veículos nos quais a motorista ou as passageiras estejam sem o véu ou com roupas inapropriadas também poderão ser multados em US$ 10,7.

Cabelos descobertos
A medida é apenas mais uma de uma série de endurecimentos seguidos. Do fechamento de estabelecimentos comerciais, em particular restaurantes, à instalação de câmeras nas ruas para perseguir as mulheres que desafiam a proibição, as autoridades tentam sufocar um movimento que vêm sendo percebido nas iranianas: nos últimos meses, elas circulam cada vez mais com os cabelos descobertos, principalmente nas grandes cidades.

Desde a Revolução Islâmica de 1979, a lei iraniana, que interpreta a Sharia, exige que todas as mulheres usem o hijab em locais públicos. Conservadores, que estão em maioria no Parlamento e no governo, defendem com veemência o véu afirmando que o fim da obrigatoriedade seria o início de um processo que modificaria de maneira profunda as “normas sociais”.

Atualmente, quem descumpre a lei islâmica fica sujeito ao pagamento de uma multa que pode chegar a US$ 10,14 ou reclusão de 10 dias a dois meses.

O assassinato de Amini
A julgar pelas fotos divulgadas nas redes sociais e na mídia iraniana, a jovem curda Amini usava seu hijab um pouco solto, de modo que alguns fios de cabelo estavam soltos, como muitas outras mulheres usam a peça no país. Ela foi levada para a delegacia de polícia para uma "aula de reeducação", mas depois foi transferida em coma de ambulância para um hospital, onde morreu três dias depois.

A jovem provocou uma onda de protestos que começou enquanto ainda estava no hospital e seguiu até novembro. Durante o seu sepultamento em 17 de setembro, em sua cidade natal de Saqqez, no Curdistão iraniano, mulheres retiraram seus véus como forma de protesto.

Nos dias seguintes, as manifestações se alastraram por outras cidades, como Teerã e Mashhad, chegando a estudantes, professores, comerciantes, operários e no setor petroleiro (o que causou greves e passeatas).

Segundo a Guarda Revolucionária, os protestos deixaram mais de 300 mortos, incluindo membros das forças de segurança. Milhares de pessoas foram detidas, e sete homens foram executados após serem condenados por participar do movimento.

Acusada e criticada pelos manifestantes, a polícia da moralidade havia desaparecido da maioria das ruas iranianas nos últimos meses, permitindo que cada vez mais mulheres saíssem de casa sem o véu, em particular em Teerã e nas grandes cidades.

Mas em julho deste ano, a polícia anunciou que as patrulhas retornariam “de carro e a pé” para “alertar e punir as pessoas que, infelizmente, desobedecem as ordens e continuam desrespeitando o código de vestimenta”, informou o porta-voz da polícia, Said Montazeralmahdi, citado pela agência Tasnim.

'Apartheid de gênero'
O projeto de lei foi debatido por meses antes de chegar à aprovação no Parlamento. No início deste mês, oito especialistas independentes em direitos humanos na ONU disseram à BBC que o projeto “poderia ser descrito como uma forma de apartheid de gênero, uma vez que as autoridades parecem governar por meio de discriminação sistêmica com a intenção de reprimir mulheres e meninas até a submissão total". Eles também alegaram que as punições podem culminar na sua aplicação de maneira violenta.

Ainda segundo os especialistas, o projeto “viola os direitos fundamentais”.

Na época, quando foi enviado ao Parlamento, o texto não agradou a todos os conservadores, que defendiam leis mais severas. Segundo o jornal Kayhan, os que apoiam o projeto de lei do modo em que foi elaborado "não sabem que o inimigo" procura, ao eliminar o véu, "destruir a instituição familiar e atacar os fundamentos do sistema islâmico".

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