Perspectivas para 2023
O artigo reflete um pequeno extrato da apresentação feita no seminário do Cine PE 2022
Gostaria de fazer três pontos sobre as perspectivas para 2023. O primeiro ponto é de regozijo. O segundo, de esperança. O terceiro é um ponto de interrogação.
O regozijo é porque em 1º. de janeiro o país irá despertar do pesadelo dos últimos quatro anos. Regozijo pela demonstração de força das instituições e da sociedade brasileiras na resistência às tentativas de rompimento da democracia pelo atual Presidente. O país saiu-se desse embate melhor do que Filipinas, Hungria, Turquia que estão hoje subjugados a autoritarismos de extrema direita. Viva a democracia brasileira, portanto.
A esperança é quanto à reversão das políticas de terra arrasada dos últimos quatro anos, na ciência, na cultura, na educação, no meio ambiente, na saúde; que foram acompanhadas de uma postura de fomento ao ódio e à violência na sociedade brasileira. Viva portanto a resiliência da cultura brasileira, tão bem representada pelo Cine PE 2022.
A interrogação refere-se a como se comportará o novo governo na condução da economia. O país tem enormes oportunidades, mas também grandes desafios.
As oportunidades são principalmente de ordem externa. Derivam por um lado da nova geopolítica mundial, fruto da guerra da Ucrânia e do enfrentamento comercial entre os EUA e a China. O Brasil poderá ser um ponto de equilíbrio nessas disputas, podendo beneficiar-se da redefinição das cadeiras mundiais de valor na direção de países próximos e amigos. Deixamos nos anos 1990, após o fim do império soviético e a incorporação da China à Organização Mundial do Comércio, de nos beneficiarmos da enorme expansão do comércio mundial que então ocorreu, exceto pela exportação de bens primários para a China. Temos agora, com a redefinição das cadeias globais de valor, nova oportunidade de maior integração ao comércio mundial.
Para o Nordeste, trata-se de oportunidade particularmente importante, dada sua maior proximidade dos EUA e Europa, e sua capacidade de concorrer com o México e o Caribe no aproveitamento do redirecionamento do comércio ocidental na direção de países próximos e amigos.
A importância crescente do enfrentamento do aquecimento global gera outro conjunto de oportunidades para o país. Principalmente no aproveitamento do potencial de geração de créditos de carbono da Amazônia para reestruturar a Zona Franca de Manaus. Ela poderia deixar de ser um custoso intermediário na internação de produtos industriais importados, para se tornar – com apoio financeiro dos créditos de carbono – numa importante processadora de bens e serviços da Amazônia para serem exportados para as demais regiões do país e para o mundo exterior.
Os desafios são principalmente de ordem interna. Apesar de haver diminuído, a inflação continua muito acima da meta de 3% fixada para 2024. Isto significa que a atual taxa Selic, de 13,75%, deverá continuar prevalecendo ainda por bom tempo, onerando sobremaneira as contas públicas. O Tesouro Nacional emite hoje títulos que pagam IPCA mais 6% ao ano, o que significa que a dívida pública deverá aumentar de forma substantiva no futuro próximo. Impõe-se por isso prudência na política fiscal, com contenção de gastos. Mas não é o que vemos acontecer na chamada PEC da transição, que deverá gerar um rombo de grandes proporções nas contas do governo em 2023 e 2024. O risco de uma crise de confiança em relação ao pagamento da dívida pública está posto, com consequências danosas para a economia do país.
Ademais, manifestações de renovado intervencionismo do Estado na economia, especialmente através do BNDES, têm ocorrido na equipe de transição. A bolsa despenca e o Real se desvaloriza face aos riscos desse intervencionismo, cujos males ficaram patentes na administração de Dilma Rousseff.
A interrogação é se o Presidente Lula se dará conta desses riscos – da gastança e do intervencionismo – e porá neles um freio, recuperando o espírito positivo de seu primeiro mandato em 2002. É o que saberemos nos próximos meses.
*Economista e professor. Foi presidente do BNDES e um dos autores do Plano Real
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