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População global de tubarões de recife caiu mais de 60%, revelam câmeras

Estudo monitorou águas de 67 países

Tubarão-martelo-panãTubarão-martelo-panã - Foto: Divulgação / Portal dos Animais

As populações de cinco espécies de tubarão de recifes de corais sofreram redução de 60% a 73%, revela uma pesquisa realizada em águas de 67 países, incluindo o Brasil. A causa provável do problema, afirmam os cientistas, é a pesca predatória.

Com o declínio dos tubarões, as arraias estão passando a dominar vários locais com esse tipo de habitat, tomando o lugar de predador te topo de cadeia e causando perturbação no equilíbrio ecológico. Essa alteração afeta os estoques de peixes, moluscos e crustáceos de importância comercial, que dependem dos recifes para reprodução e crescimento.

O diagnóstico global sobre os tubarões de recife foi resultado de um esforço de monitoramento com câmeras subaquáticas. Os pesquisadores mapearam populações dos animais em 391 conjuntos de recifes no planeta, produzindo mais de 22 mil horas de vídeo. O resultado da análise desses dados é descrito hoje em artigo publicado na revista Science.

"Se não forem enfrentadas, as pressões que causam a queda de diversidade de tubarões que descrevemos continuarão a resultar na perda de espécies, funções ecológicas e serviços ecossistêmicos que garantem o modo de vida sustentável de milhões de pessoas no mundo", escreveram os pesquisadores.

O estudo foi liderado pelo biólogo Colin Simpfendorfer, da Universidade James Cook, da Austrália. Como não existia uma série temporal para saber se os tubarões em questão estavam aumentando ou diminuindo de número, o cientista teve de elaborar um modo de estimar quais seriam os tamanhos originais das populações do animal.

"Estimamos a linha de base desenvolvendo uma relação entre o número de tubarões de cada espécie vistos nos vídeos, o rigor das áreas marinhas protegidas onde eles existiam e a distância do recife de pressões humanas, como cidades e rotas comerciais", explicou o cientista ao Globo.

O método funcionou porque o trabalho de campo envolveu muito esforço e produziu informações suficientes. O estudo na Science é assinado por 154 cientistas.

O segredo para coletar tantas imagens é uma pequena estação automática de filmagem, batizada com o acrônimo BRUV (Baited Remote Underwater Video System). O pioneiro do uso dessa tecnologia não invasiva na costa brasileira foi o biólogo italiano Tommaso Giarrizzo, da Universidade Federal do Ceará (Labomar/UFC).

"É uma câmera de vídeo compacta colocada em uma caixa montada numa estrutura de metal ou PVC. Na frente do campo de visão da câmera fica uma haste presa a um saco de tela com uma isca, geralmente sardinha, esmagada para atrair os peixes", explica. "Os BRUVs são lançados diretamente da embarcação, encostam no fundo, e ficam na água filmando por 60 minutos".

Quando os dados globais sobre avistamento dos tubarões de recife começaram a ser agrupados e analisados, os números surpreenderam mesmo os cientistas que já estavam pessimistas. Algumas espécies individuais de tubarões não foram encontradas em 34% a 47% dos recifes na pesquisa.

Situação brasileira

O Brasil é um dos locais em situação preocupante. Nas águas brasileiras, populações do tubarão-recifal (*Carcharhinus perezi*) caíram pela metade, e as do tubarão-lixa (*Ginglymostoma cirratum*) em cerca de 75%. Essas foram as duas espécies de tubarão monitoradas no Atlântico.

O biólogo Hudson Pinheiro, do Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (Cebimar/USP), participou do estudo e explica por que elas são tão capturada, apesar de não ter um valor comercial tão alto.

"Esses predadores são as primeiras espécies a serem capturadas quando você põe um anzol grande dentro d'água. São sempre os mais agressivos que vêm morder a isca primeiro", diz.

Ele conta que antes de o arquipélago de Trindade se tornar um parque nacional a 1.200 km da costa capixaba, em 2018, o peixe mais capturado por frotas pesqueiras ali era o tubarão-recifal.

"Já o tubarão lixa é muito capturado também pela pesca recreacional, porque é uma espécie que ocorre em águas mais rasas e é muito acessível", conta Hudson.

O Brasil, apesar da situação preocupante, está longe de ser o país mais afetado. Em duas locações do Caribe (Jamaica e Martinica) os dois tubarões em questão nem sequer foram vistos pelas câmeras dos cientistas.

Além dessas duas espécies acompanhadas no Atlântico, outros três foram monitorados em recifes do Pacífico e do Índico: o tubarão-cinzento-de-recife, o galha-preta-de-recife e o galha-branca-de-recife. O tubarão-cinzento parece ser aquele em situação preocupante no Oriente, porque simplesmente sumiu das águas de 13 países onde costumava aparecer.

Os números novos mostram uma situação que coloca todas as espécies dentro da categoria de "ameaçadas" para a União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN). Segundo Simpfendorfer, apesar de preocupante, a situação tem potencial para ser revertida na escala de uma década, caso sejam adotadas medidas de proteção.

— A recuperação será muito dependente da ação país por país. A implementação de áreas marinhas protegidas onde a pesca não ocorre é um método muito bom — diz o cientista. — Mas há também um componente internacional. Já usamos nossos resultados para incluir essas espécies na Convenção sobre Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas (CITES), o que significa que seu comércio internacional será regulamentado em breve, e esperamos que isso faça diferença.

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