População resiste à 'bancarização' da economia de Cuba
Banco Central do país anuncia redução de número de cédulas em circulação no país
"Sem chance! Não se pode dar nada ao banco", diz Lisandra Pupo, uma engenheira mecânica cética quanto à "bancarização" das operações econômicas anunciada pelo Banco Central de Cuba, que tenta reduzir o número de cédulas em circulação no país.
A nova medida, que entrou em vigor na última quinta-feira (3), obrigará tanto a população quanto as empresas a realizarem, por seis meses, a maior parte de suas transações financeiras através de canais eletrônicos. No entanto, os cubanos acreditam que esta solução dificultará a obtenção de seu próprio dinheiro, devido à limitação tecnológica da ilha.
"Isso é impossível. Agora o caixa automático não tem dinheiro ou não tem conexão", disse a engenheira de 30 anos, denunciando o limite de saque de 5.000 pesos (cerca de US$ 28 ou R$ 137, na cotação atual).
Desde que o governo cubano implementou a reforma monetária em janeiro de 2021, é cada vez mais comum a população carregar maços de notas para pagar uma simples conta de restaurante ou um serviço em uma oficina mecânica.
"Hoje há um nível significativo de dinheiro que está fora do sistema bancário. Esse dinheiro não circula nos circuitos lógicos da economia e só é negociado entre pessoas físicas", o que está "incentivando a espiral inflacionária", explicou Joaquín Alonso, presidente do Banco Central, na segunda-feira (7), em um programa da televisão estatal.
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Quando a reforma monetária foi aplicada, o Banco Central cubano injetou uma boa quantidade de capital de giro para "dar poder de compra à população", dada a expectativa de aumento de preços que acompanhou um aumento salarial médio de 450%.
No entanto, as autoridades reconhecem que enfrentam desafios significativos diante da falta de recursos para instalar e atualizar terminais de pagamento com cartão em todos os estabelecimentos do país.
Para Rossel Garcés, um tipógrafo de 32 anos que trabalha por conta própria, colocar o dinheiro no banco é um problema.
Sabendo "que só posso sacar 5.000 pesos, que esperei três horas na fila, vou para outro banco esperar em outra fila para sacar mais 5.000. Vou passar uma semana para tirar 20.000 pesos?" questiona, adicionando que muitas pessoas na ilha não têm acesso a smartphones para fazer transferências.
"Escassez" e "inflação"
O economista independente cubano Omar Everleny Pérez considera que "os preços tão elevados e a inexistência de notas de alto valor" tornaram "necessária esta bancarização".
A inflação interanual chegou a 45,8% em maio, comparada aos 39% registrados em 2022, de acordo com dados oficiais, mas analistas indicam que este número já atingiu os três dígitos.
O anúncio também coincide com as cotações recordes do dólar (240 pesos ou R$ 4,90) e do euro (245 ou R$ 5,38) no mercado informal, segundo o portal independente El Toque.
As micro, pequenas e médias empresas, licenciadas há apenas dois anos, também foram afetadas, já que agora terão de fazer todos os seus negócios eletronicamente. Estes empreendimentos precisam de dólares para realizar suas importações e têm dificuldade de adquiri-los no mercado oficial.
Para o consultor de empresas privadas Oniel Díaz, estas empresas vão perder a capacidade de importar "em um ambiente de escassez e inflação", disse em uma publicação no seu perfil no Facebook.
O governo cubano afirmou recentemente que 100% de sua cesta básica é importada, em meio à pior crise econômica em três décadas.