Primeiro-ministro da Etiópia toma posse para segundo mandato em pleno conflito em Tigré
Não está claro se a posse de Abiy vai alterar o curso da guerra
O primeiro-ministro da Etiópia, Abiy Ahmed, tomou posse nesta segunda-feira (4) para um segundo mandato de cinco anos, em um contexto complexo devido ao conflito na região de Tigré, norte do país, uma situação que preocupa a comunidade internacional.
Abiy, cujo Partido da Prosperidade obteve uma grande vitória nas eleições de junho, prestou juramento diante da presidente da Suprema Corte etíope, Meaza Ashenafi.
A vitória eleitoral, que seu governo considera um respaldo às reformas democráticas iniciadas desde que chegou ao poder em 2018, foi ofuscada pela guerra em Tigré.
Dezenas de milhares de pessoas morreram nesta região e centenas de milhares enfrentam a fome, segundo a ONU, o que abala o prestígio do chefe de Governo, vencedor do prêmio Nobel da Paz de 2019.
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Os combates se propagaram para as regiões vizinhas de Afar e Amhara. Tigré entrou no que a ONU classifica de bloqueio humanitário de fato, o que provoca o temor de uma fome em larga escala como a que a Etiópia enfrentou na década de 1980.
Não está claro se a posse de Abiy vai alterar o curso da guerra em que as forças governamentais enfrentam a rebelde Frente de Libertação do Povo de Tigré (TPLF), que dominava a política nacional antes da chegada de Abiy ao poder.
A equipe de Abiy, que culpa os rebeldes pelo início da guerra em novembro do ano passado, com ataques ao exército, considera a possibilidade de adotar medidas conciliatórias, como parar de classificar a TPLF como grupo terrorista, após a formação do novo governo.
"A posição é que qualquer mudança na forma de abordar o conflito com as forças de Tigré só pode acontecer depois da formação do novo governo", disse o analista William Davison, do International Crisis Group.
Decepcionados
Aliados internacionais, como o governo dos Estados Unidos, que ameaçou aplicar sanções, "observarão de perto para constatar se há mudanças", destacou Davison.
As relações com a comunidade internacional ficaram ainda mais complicadas na semana passada, quando o ministério etíope das Relações Exteriores anunciou a expulsão de sete funcionários da ONU, incluindo os diretores locais do Unicef e do Escritório de Coordenação Humanitária.
Nesta segunda-feira, o embaixador britânico na ONU em Genebra pediu, em um discurso pronunciado em nome de mais de 40 países, o retorno dos funcionários expulsos, que segundo ele cumprem um "trabalho vital" nas crises humanitárias que a Etiópia enfrenta.
As potências ocidentais se sentiram "desapontadas" com Abiy, o que pode afetar as relações externas da Etiópia em seu segundo mandato, de acordo com Cameron Hudson, do Centro para África do Atlantic Council.
"O Ocidente provavelmente retornará ao manual estratégico que conhece: pressionar onde é possível, envolver-se onde necessário e esperar para ver melhores alternativas", disse Hudson à AFP.
"Conspiração"
Cartazes eram exibidos nas ruas de Adis Abeba com o slogan "Começar de novo".
"Fizeram muitos esforços para desestabilizar nossa soberania, união e coexistência social", declarou a presidente do país, Sahle-Work Zewde, que tem um papel principalmente honorário.
"Porém, os etíopes (...) conseguiram acabar com esta conspiração criada pelos inimigos externos e os traidores internos para destruir a Etiópia", afirmou a presidente, recorrendo à retórica combativa de muitas autoridades etíopes.
Abiy chegou ao poder depois de vários anos de protestos antigovernamentais contra a coalizão liderada pela TPLF e prometeu romper com o passado autoritário da Etiópia, assim como celebrar as eleições mais democráticas da história do país.
Este ano, alguns partidos de oposição optaram por boicotar as eleições. As formações reclamaram que seus candidatos foram detidos e seus escritórios vandalizados.
Além disso, não aconteceu votação em Tigré, enquanto as eleições para outras 83 cadeiras do Parlamento foram adiadas por motivos de segurança ou logísticos.