Primeiro-ministro do Haiti oficializa renúncia após conselho de transição tomar posse
Expectativa é de que processo traga alguma estabilidade ao país, que não realiza eleições desde 2016; gangues expressaram descontentamento por terem sido excluídas
Como prometido após anunciar sua renúncia em março, o primeiro-ministro Ariel Henry oficializou sua demissão, nesta quinta-feira, após os nove membros do Conselho Presidencial de Transição do Haiti, encarregados de supervisionar a transição política e impor alguma estabilidade ao país devastado pelas gangues, terem prestado juramento no Palácio Nacional e tomarem posse. A cerimônia foi marcada pela violência dos grupos armados, e um tiroteio obrigou o evento a ser transferido para o gabinete do premier, conhecido como Villa d'Accueil, em Porto Príncipe, segundo a BBC.
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O premier, que deveria ter deixado o governo em fevereiro, oficializou sua saída em uma carta. O anúncio segue a promessa feita por Henry, no dia 11 de março, de que deixaria o cargo após a instalação do conselho. "Senhoras e senhores, membros do Conselho de Ministros, [...] confirmo-vos que, por motivos pessoais, optei por retirar-me imediatamente do cargo de primeiro-ministro e de todas as responsabilidades ministeriais", afirmou Henry em sua carta, citada pelo Le Nouvelliste. E concluiu:
"Agradeço ao povo haitiano pela oportunidade de servir ao nosso país com integridade, sabedoria e honra. O Haiti renascerá".
Imagens compartilhadas nas redes sociais mostram os membros do conselho — composto por oito homens e uma mulher, sendo sete votante e dois observadores — durante a cerimônia de posse, sendo recebidos com festa no palácio presidencial de Porto Príncipe, acompanhados pela música de uma fanfarra.
O Escritório Integrado das Nações Unidas no Haiti (BINUH) saudou a instalação, informou o jornal haitiano Le Nouvelliste. O porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, John Kirby, disse que a posse do conselho "um passo crucial rumo a eleições livres e justas", acrescentando que os EUA entregaram um primeiro carregamento de equipamento não letal à polícia nacional haitiana.
A formação do conselho foi confirmado em 12 de abril. Sua instalação, adiada várias vezes devido a semanas de lutas internas, tem agora a tarefa de preparar o país, que não realiza eleições desde 2016, para novas eleições até 2026. O próximo passo é a nomeação de um novo primeiro-ministro.
Nesse meio tempo, o Haiti funcionará com um governo interino, dirigido pelo ministro da Economia, Michel Patrick Boisvert, nomeado por decreto na quarta-feira. O dirigente já tinha assumido algumas comunicações oficiais nas últimas semanas, uma vez que Henry está em Los Angeles, nos EUA, e impossibilitado de regressar ao país após uma viagem ao Quênia.
A posso do novo conselho renova as expectativas sobre a missão internacional liderada pelo Quênia, cujo envio ao Haiti foi condicionado à sua instalação. O envio de uma força de segurança foi aprovado pelo Conselho de Segurança da ONU em outubro do ano passado, mas o acordo havia sido alcançado com o primeiro-ministro Henry.
Violência em Porto Príncipe
Como nas últimas, a cerimônia de posse foi marcada pela violência. Tiroteios foram registrados em vários locais da capital e próximo ao Palácio Nacional, obrigando, segundo a BBC, a transferência do evento para o gabinete do premier. As gangues, que expressarem descontentamento por terem sido excluídas das negociações, já haviam prometido inviabilizar a cerimônia. No dia anterior, a polícia teve que usar gás lacrimogêneo para dispersar as multidões nos arredores, informou a rede britânica.
Em um vídeo divulgado nas redes sociais na terça-feira, um dos mais poderosos líderes de gangue, Jimmy "Barbecue" ameaçou os membros do conselho: "Estejam ou não instalados, esta mensagem é para vocês. Preparem-se". Segundo a rede britânica, no mês passado, ele prometeu depor as armas se as gangues pudessem participar das negociações para o conselho de transição.
Depois de enfrentar uma série de crises, incluindo vulnerabilidade econômica e desastres naturais, a instabilidade política do Haiti só piorou desde o assassinato do presidente Jovenel Moïse, em 2021. O quadro da violência teve uma guinada em fevereiro: as ruas de Porto Príncipe foram tomadas pelo caos desde o fim de fevereiro, quando gangues criminosas lançaram ataques a delegacias de polícia, prisões, sedes oficiais e ao aeroporto da capital, exigindo a renúncia de Henry.
Os grupos armados controlam mais de 80% da capital e têm cometido vários abusos, incluindo assassinatos, estupros, saques e sequestros. De acordo com as Nações Unidas, o conflito deslocou cerca de 360 mil haitianos internamente, em um país com cerca de 11,6 milhões de habitantes.
A violência das gangues também forçou 95 mil pessoas a fugirem da capital e mergulhou cinco milhões em uma "fome aguda", de acordo com especialistas da ONU. Os hospitais no momento estão sobrecarregados e à beira do colapso, e a organização relatou a falta de suprimentos médicos como remédios, luvas cirúrgicas, anestésicos. O combustível para geradores também tornou-se inacessível.
Um acordo político alcançado pelos membros do conselho presidencial determinou, entre suas prioridades, "restabelecer as condições de segurança pública" ou "adotar medidas excepcionais para reativar a economia, melhorar a oferta de serviços básicos e combater a insegurança alimentar". Mas, antes, eles terão que assumiu o poder.