Projeto prevê urbanização da orla de Maracaípe
Obra pretende construir avenida com calçadão e muros de contenção para o mar. Prefeitura diz que requalificação surgiu de demanda da população. Ambientalistas são contra
O projeto municipal de urbanização da orla de Maracaípe, em Ipojuca, Litoral Sul de Pernambuco, a 66 quilômetros do Recife e um dos principais cartões-postais do Estado, se tornou alvo de uma polêmica. Estão previstas a construção de uma avenida beira-mar, de um muro de contenção para o mar e de um calçadão, além da instalação de postes de iluminação pública.
Projetos similares já foram executados em outras praias do Estado, como a de Boa Viagem, no Recife, e as de Olinda e Paulista. A praia de Maracaípe é conhecida por ser um ponto de prática de surfe e possuir piscinas naturais, mangues, trilhas e desova de tartarugas. A Prefeitura de Ipojuca confirmou à Folha de Pernambuco a existência do projeto, mas alegou que o material compartilhado nas redes sociais foi alterado.
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De acordo com dados públicos divulgados pela plataforma Tome Conta, do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE), a empresa Premier Consultoria, Planejamento e Gerenciamento em Engenharia, com sede no bairro de Casa Forte, na Zona Norte do Recife, foi contratada pela Prefeitura de Ipojuca “para elaborar projetos executivos para construção da obra de contenção costeira através do dissipador de energia em estrutura de concreto ou similar em trecho da orla de Maracaípe”. O contrato, firmado pela Secretaria Municipal de Infraestrutura e Obras em 13 de agosto de 2019, através de um processo licitatório, custou aos cofres públicos da cidade um total de R$ 79,2 mil, já pagos à Premier Engenharia, em duas parcelas.
Por meio de nota, a Prefeitura de Ipojuca afirmou que o projeto foi desenvolvido a partir de uma demanda da população da cidade para conter o avanço do mar em Maracaípe. “Uma empresa foi contratada para identificar o tipo ideal de contenção com o menor impacto possível. O projeto ainda está na fase de análise técnica e esperando pareceres e licenças ambientais”, afirmou a gestão municipal. Ao todo, o projeto deve custar R$ 3,5 milhões, recursos provenientes dos cofres federais e municipais.
Ainda de acordo com a prefeitura, o projeto se faz necessário para “preservar a via pública da praia e proporcionar acesso único a pontos turísticos do local, a casas residenciais e a pousadas”. “Todos os estudos ambientais dos órgãos responsáveis pela área foram solicitados e a gestão municipal aguarda parecer. A tecnologia escolhida para obra de contenção é holandesa, que é reconhecida mundialmente pelo seu baixo impacto”, acrescenta. A gestão afirma ainda que as licenças para o projeto deverão ser o passo seguinte aos pareceres emitidos pelos órgãos fiscalizadores, porém não informa prazo.
Voluntário da ONG Salve Maracaípe, o gestor ambiental Sidney Marcelino afirmou que recebeu a notícia da urbanização da praia com preocupação e angústia. “É uma área ecologicamente importante porque há desova de tartarugas. É uma ilusão e uma irresponsabilidade achar que o mar está avançando. Na verdade, são as construções que estão avançando”, criticou.
O objetivo da entidade é barrar a licitação para contratação da empresa responsável por executar o projeto. Uma manifestação foi protocolada junto ao Ministério Público de Pernambuco (MPPE). “O inquérito administrativo já foi aberto. Nossa intenção é que essa licitação nem sequer chegue a ser aberta”, acrescentou Sidney. A Agência Estadual de Meio Ambiente (CPRH) também será acionada, uma vez que é competência do órgão vistoriar obras de contenção marítima, como a prevista para Maracaípe. Também foram enviados ofícios à Comissão Permanente de Licitação de Ipojuca; à secretária de Infraestrutura e Serviços Municipais, Giuliana Lins Cavalcanti; e ao presidente da Câmara de Vereadores, Albérico da Cobal.
Ainda segundo Sidney, a Salve Maracaípe estuda a melhor estratégia para tentar evitar a execução da urbanização. “Estamos alertando através do nosso perfil no Instagram e pretendemos agir com todas as forças para impedir esse horror de projeto”. O gestor ainda alega que não houve nenhuma audiência pública na cidade para tratar do projeto. A prefeitura reitera, no entanto, que a própria população demandou a construção. “Como o projeto ainda está em fase de análise, só mediante aprovação que poderá ser concluído e, posteriormente, apresentado à população local”, diz trecho da nota.
Vídeo do projeto
Por fim, em relação ao vídeo do projeto compartilhado nas redes sociais, a Prefeitura de Ipojuca afirma que houve alteração no material. “A prefeitura lamenta que vídeos institucionais da gestão municipal sejam usados e manipulados com o objetivo de confundir a população. Reforçamos que a preocupação com o Meio Ambiente é legítima e é de todos nós, mas é inadmissível que para isto se passe por cima da ética”, argumenta.
As imagens enviadas pela prefeitura à Folha de Pernambuco mostram uma faixa de areia antes da água. Já o material compartilhado pela Salve Maracaípe no Instagram traz a água do oceano próxima ao muro de contenção e sem faixa de areia. A ONG alega que o vídeo publicado mostra o projeto com maré alta.
"Existem dois vídeos. O que publicamos mostra como ficaria com a maré alta. O outro vídeo mostra a maré baixa. De qualquer forma, é absurdo fazer esse muro de contenção. O vídeo é muito claro com o que a prefeitura quer fazer com a praia de Maracaípe: destruí-la", rebateu Sidney, acrescentando que também faltam publicar os estudos de impactos ambientais do projeto.
Impacto da ação humana em Maracaípe
Um estudo feito por pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) realizou levantamento geoambiental da costa de Maracaípe de 2010. O resultado apontou para uma forte influência humana no uso irregular do orla em dois dos três setores que foram analisados. Entre os principais problemas encontrados na praia, estavam as intervenções na estrutura para o turismo, o desmatamento, as construções indevidas, o tráfego de carros de passeio e a formação de trilhas pela passagem de bugres, o que impede o crescimento da vegetação nativa e facilita a perda de sedimentos.