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ESTADOS UNIDOS

Quantidade de pessoal na torre de controle "não era normal" em acidente entre avião e helicóptero

Segundo o New York Times, o controlador que estava lidando com helicópteros nas proximidades do aeroporto na quarta-feira à noite também instruía aviões que estavam pousando e partindo de suas pistas

A torre de controle no Aeroporto Nacional Reagan após a queda de um avião da American Airlines no Rio PotomacA torre de controle no Aeroporto Nacional Reagan após a queda de um avião da American Airlines no Rio Potomac - Foto: Andrew Harnik/Getty Images via AFP

O pessoal na torre de controle de tráfego aéreo do Aeroporto Nacional Ronald Reagan "não era normal para a hora do dia e o volume de tráfego", de acordo com um relatório interno preliminar de segurança da Administração Federal de Aviação sobre a colisão na noite desta quarta-feira (29), que foi revisado pelo The New York Times.

O acidente foi entre um avião, que levava 64 pessoas — 60 passageiros e quatro tripulantes —, e um helicóptero do Exército dos EUA, que transportava três militares. Não houve sobreviventes.

Segundo o jornal americano, o controlador que estava lidando com helicópteros nas proximidades do aeroporto na quarta-feira à noite também estava instruindo aviões que estavam pousando e partindo de suas pistas. Essas tarefas normalmente são atribuídas a dois controladores, em vez de um.

Isso aumenta a carga de trabalho do controlador de tráfego aéreo e pode complicar o trabalho. Um motivo é que os controladores podem usar diferentes frequências de rádio para se comunicar com pilotos de aviões e pilotos de helicópteros.

Enquanto o controlador está se comunicando com os pilotos do helicóptero e do jato, os dois conjuntos de pilotos podem não conseguir ouvir um ao outro.

Como a maioria das instalações de controle de tráfego aéreo do país, a torre do Aeroporto Reagan está com falta de pessoal há anos. A torre estava quase um terço abaixo dos níveis de pessoal almejados, com 19 controladores totalmente certificados em setembro de 2023, de acordo com o mais recente Air Traffic Controller Workforce Plan, um relatório anual ao Congresso que mostra níveis de pessoal alvo e real. As metas definidas pela Administração Federal de Aviação (FAA) e pelo sindicato dos controladores pedem 30.

A escassez — causada por anos de rotatividade de funcionários e orçamentos apertados, entre outros fatores — forçou muitos controladores a trabalhar até seis dias por semana e 10 horas por dia.

A FAA não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.

O acidente
O avião colidiu com o helicóptero e caiu no Rio Potomac, nos arredores de Washington, quando se preparava para pousar no Aeroporto Nacional Ronald Reagan, na noite de quarta-feira.

Ninguém sobreviveu ao acidente, e uma operação de "recuperação" de corpos está em curso, segundo as autoridades. Até o momento, o Corpo de Bombeiros conseguiu retirar 28 mortos das águas.

A colisão entre a aeronave comercial e o helicóptero militar foi gravada em vídeo. Imagens publicadas nas redes sociais mostram o momento em que uma bola de fogo se forma no céu e cai nas águas do rio.

Um áudio gravado momentos antes da colisão entre um controlador de tráfego aéreo e o piloto do helicóptero, obtido pela rede americana CNN, demonstra que o militar visualizou o avião comercial antes da colisão.

O avião, um Bombardier CRJ700 construído há cerca de 20 anos, havia partido de Wichita, no Kansas, e pousaria em Washington. O voo da American Airlines era operado pela PSA Airlines.

O helicóptero era um Sikorsky UH-60 Black Hawk, fabricado pela Lockheed Martin, empresa americana de Defesa, segundo um comunicado do Exército. Ele estava em voo para um treinamento em Fort Belvoir, na Virgínia, segundo o secretário de Defesa, Pete Hegseth, que classificou o acidente como "absolutamente trágico".

Uma grande operação de resgate lançada no local da queda, em um trecho do rio que fica na divisa de Washington, Virgínia e Maryland. Cerca de 300 socorristas foram enviados para atender a emergência, e os esforços são visíveis desde a noite de quarta-feira, quando barcos e helicópteros circulavam pela área do acidente, tentando localizar sobreviventes.

Em uma entrevista coletiva na manhã desta quinta-feira, o chefe do Corpo de Bombeiros e Serviços Médicos de Emergência de Washington, John Donnelly, afirmou que os socorristas enfrentam condições extremamente difíceis, com frio intenso, vento forte e gelo na água. Ele confirmou que 28 corpos já foram resgatados, incluindo um militar.

— Estamos em um ponto em que estamos mudando de uma operação de resgate para uma operação de recuperação [de corpos]. Neste ponto, não acreditamos que haja sobreviventes deste acidente — disse Donnelly.


No início da noite, a principal preocupação das equipes de resgate era localizar rapidamente possíveis sobreviventes na água, já que era esperado que as temperaturas caíssem abaixo de zero na área de Washington, o que que elevava o risco de hipotermia — que pode acontecer entre 20minutos e 30 minutos em água fria, de acordo com o serviço meteorológico dos EUA.

Trump acusa ex-presidentes
O presidente americano, Donald Trump, acusou nominalmente os ex-presidentes democratas Barack Obama e Joe Biden por "rebaixarem os padrões" do serviço aéreo no país, e fez uma correlação entre programas de incentivo à diversidade nas Forças Armadas e o acidente.

"Devemos ter apenas os mais altos padrões para aqueles que trabalham em nosso sistema aéreo. Eu mudei os padrões de [Barack] Obama de muito medíocres, na melhor hipótese, para extraordinários", afirmou Trump durante entrevista coletiva convocada na Casa Branca nesta quinta-feira (30).

"Eles [os controladores de voo] têm que ter o mais alto intelecto, e pessoas psicologicamente superiores foram autorizadas a se qualificar para controladores de tráfego aéreo. Isso não era assim antes de eu chegar lá."

"Quando cheguei em 2016, fiz essa mudança muito cedo, porque sempre senti que esse era um trabalho (...) que tinha que ser de inteligência superior, e nós realmente não tínhamos isso. Passamos a ter. E então, quando deixei o cargo e [Joe] Biden assumiu, ele os mudou de volta para mais baixos do que nunca."

As acusações contra as administrações democratas ocorreram logo após o próprio presidente admitir que não sabia exatamente os fatores que causaram o acidente — o chefe da Associação Nacional de Controladores de voo, em uma carta aos seus membros publicada on-line, afirmou que é "prematuro especular sobre a causa". Contudo, Trump disse que compartilharia "opiniões fortes" que criou a partir de observações que fez "ao longo dos anos".

Mais cedo, ele disse estar "totalmente informado" sobre o acidente e pediu que Deus abençoasse as almas das vítimas. Nas redes sociais, Trump sugeriu que o acidente poderia ter sido evitado.

"O avião estava em uma linha de aproximação perfeita e rotineira para o aeroporto. O helicóptero estava indo direto para o avião por um longo período de tempo. É uma NOITE CLARA, as luzes do avião estavam acesas, por que o helicóptero não subiu ou desceu, ou virou. Por que a torre de controle não disse ao helicóptero o que fazer em vez de perguntar se eles viram o avião. Esta é uma situação ruim que parece que deveria ter sido evitada", escreveu Trump na Truth Social.

Companhia defende pilotos
Em uma entrevista coletiva na manhã desta quinta, o CEO da companhia aérea American Airlines, Robert Isom, saiu em defesa dos pilotos do voo 5342, afirmando que eles tinham experiência no mercado da aviação comercial, e questionou a presença da aeronave militar na rota de pouso do Aeroporto Nacional Ronald Reagan.

— Neste momento, não sabemos por que a aeronave militar entrou no caminho da aeronave PSA— afirmou.

Daniel Driscoll, escolhido por Trump para secretário do Exército, disse nesta quinta-feira que o Exército pode precisar encerrar o treinamento de voo perto de aeroportos urbanos congestionados, como o Aeroporto Nacional Reagan. Driscoll, falando em uma audiência do Senado sobre Serviços Armados para considerar sua nomeação, disse que o Exército precisaria analisar “onde é o momento apropriado para assumir o risco de treinamento, e pode não ser perto de um aeroporto como o Reagan”.

Pouco antes da colisão, os pilotos do avião foram solicitados a mudar sua rota de pouso de uma pista para outra, de acordo com uma pessoa informada sobre o evento e conversas ouvidas em gravações de áudio de conversas que ocorreram entre um controlador de tráfego aéreo e os pilotos, relatou o New York Times.

O voo 5342 da American Airlines havia sido originalmente liberado pela torre de controle de tráfego do Aeroporto Nacional para pousar na pista principal do aeroporto, chamada de Pista 1, segundo revelou a pessoa informada sobre os eventos e as gravações de áudio.

Porém, nos momentos finais do voo, essa pessoa e essas gravações também mostraram que o piloto do jato foi solicitado pelo controle de tráfego aéreo a fazer um pouso circular em uma pista separada e cruzada, a Pista 33.

As identidades de alguns dos passageiros do voo começam a ser conhecidas. Vários membros da comunidade da patinação artística estavam a bordo da aeronave civil, incluindo os patinadores artísticos Evgenia Shishkova, de 52 anos, e Vadim Naumov, de 55, ambos de nacionalidade russa, conhecidos por conquistarem o Campeonato Mundial em 1994 antes de se mudarem para os EUA em 1998, onde passaram a atuar como treinadores. De acordo com relatos iniciais, ambos estavam retornando de um evento nacional de patinação acompanhados por um grupo de jovens patinadores.

Todas as decolagens e aterrissagens foram interrompidas no aeroporto, enquanto o pessoal de emergência respondia ao acidente. A previsão é de que o Aeroporto Nacional Ronald Reagan ficasse fechado até as 11h desta quinta-feira (13h em Brasília), segundo informou John Potter, presidente da Autoridade Metropolitana de Aeroportos de Washington.

Último acidente com vítimas
O último acidente fatal envolvendo uma companhia aérea comercial dos EUA foi o voo 3407 da Colgan Air, que caiu perto de Buffalo, matando 50 pessoas, em 12 de fevereiro de 2009.

Especificamente com a American Airlines, o último acidente com vítimas foi em novembro de 2001, quando um grande avião caiu no bairro de Belle Harbor, no Queens, em Nova York, matando 251 passageiros.

Enquanto as causas da colisão ainda não foram esclarecidas, autoridades políticas e aeronáuticas comentaram o cenário. O secretário de Transportes, Sean Duffy, afirmou que as duas aeronaves seguiam "padrões de voo regulares". O piloto Chesley Sullenberger III, que pousou um avião de passageiros com segurança no Rio Hudson, em Nova York, em 2009 — e inspirou o filme "Sully, o herói do rio Hudson", estrelado por Tom Hanks — disse que o pouso à noite sobre a água e as condições da pista do Aeroporto Ronald Reagan podem ter contribuído para o acidente.

O Aeroporto Nacional Ronald Reagan foi construído no final da década de 1930 e exige treinamento adicional para os pilotos que operam nele, disse o capitão Sullenberger. Ele também afirmou que o pouso noturno, e o local do acidente, sobre o rio, apontam para condições de pouso mais desafiadoras.

— Haveria menos luzes de solo visíveis sobre a água do que sobre a terra à noite — afirmou. — Pode ter tornado um pouco mais difícil de ver. Mas isso é suposição. Não sabemos.

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