Quem é Pierre Poilievre, opositor de Trudeau que busca liderar o Canadá após renúncia de premiê
Veterano na política, líder conservador busca cortejar eleitores da classe trabalhadora com uma mensagem anti-elite que às vezes pinta um quadro mais sombrio do país
Pierre Poilievre, de 45 anos, não é o típico líder conservador, tampouco um canadense convencional. Definido por analistas como ousado e confrontador — até mesmo com seus apoiadores na alta cúpula executiva — ele transformou o Partido Conservador, que governou o Canadá apenas quatro vezes desde a Segunda Guerra Mundial, em uma força política temida, ao mesmo tempo em que tem transformado o relacionamento da sigla com o setor empresarial.
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Assim como no Partido Republicano de Donald Trump nos Estados Unidos, ataques contra aqueles que cruzam o caminho do político estão em alta, e a estratégia tem funcionado: há mais de um ano, os Conservadores mantêm uma liderança de dois dígitos nas pesquisas de opinião pública, e Poilievre agora é apontado como possível sucessor do primeiro-ministro Justin Trudeau, que apresentou sua renúncia na segunda-feira.
Sob a liderança de Poilievre, o Partido Conservador lidera o Partido Liberal de Trudeau com 29 pontos percentuais, segundo uma pesquisa recente citada pelo Wall Street Journal (WSJ). A vantagem atual do partido é tão grande — e o Partido Liberal de Trudeau parece tão enfraquecido — que as projeções sugerem que os Conservadores têm chances de ganhar mais de 200 das 343 cadeiras em disputa na Câmara dos Comuns.
Tal maioria daria a Poilievre a capacidade de fazer mudanças abrangentes na direção de uma das dez maiores economias do mundo, e ele dá a entender que é exatamente isso que deseja fazer.
Conhecido no Parlamento por seu estilo de discurso contundente e falta de respeito pelas normas políticas de Ottawa, ele se gaba de uma intensa rotina de exercícios que envolve virar um pneu de trator de 226 kg em um campo e correr morro acima enquanto arrasta um trenó de 34 kg.
Seu perfil faz parte de uma estratégia eleitoral que atrai partes de sua base conservadora, bem como eleitores não alinhados que são céticos em relação às grandes empresas e à mídia tradicional. Com Trudeau saindo de cena, porém, ele terá que provar que é mais do que apenas um candidato anti-Trudeau e que sua marca combativa de política — relativamente estranha ao Canadá até agora — pode conquistar eleitores.
Político de carreira, ele cresceu na tradicionalmente conservadora província de Alberta como filho adotivo de professores. Desde cedo, o canadense participou de comícios antiaborto com sua mãe, que era ativa nos círculos conservadores. Na faculdade, foi presidente do clube conservador do campus e conseguiu seu primeiro emprego na capital como assessor político de um político conservador, publicou o WSJ.
Mais tarde, em 2004, ele foi eleito pela primeira vez para o Parlamento do Canadá, derrotando um ex-ministro da Defesa liberal numa vitória surpreendente. Depois, foi um membro ávido do governo conservador do ex-primeiro-ministro Stephen Harper, que liderou o país de 2006 a 2015.
— Ele estava disposto a fazer o que fosse necessário para realizar as coisas — disse Garry Keller, um alto funcionário do governo Harper.
Populista de direita
Poilievre adotou posições moderadas em questões sociais, rotulando-se como pró-escolha e irritando alguns conservadores ao prometer nunca regulamentar o aborto. Ele também apoiou o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Seus pais se separaram quando Poilievre tinha 12 anos e logo após seu pai adotivo se assumiu gay.
Seu maior destaque, contudo, vem do populismo econômico, que mistura políticas de livre mercado com desdém pelas grandes empresas canadenses, seguindo um caminho trilhado por muitos dos populistas de direita que chegaram ao poder em todo o mundo, segundo o jornal americano.
Como líder da oposição, Poilievre busca cortejar eleitores da classe trabalhadora com uma mensagem anti-elite que às vezes pinta um quadro mais sombrio do país.
“Tudo parece quebrado no Canadá”, ele diz em anúncios de televisão. Nas redes, complementa indicando que “grupos empresariais não têm as soluções: eles só sabem realizar ‘almoços e reuniões inúteis’”.
Essas mensagens encontram um público receptivo num país frustrado com o crescimento econômico lento, baixa produtividade e altos preços de moradia. Para lidar com isso, ele prometeu cortar impostos, reduzir regulamentos sobre mudanças climáticas e impulsionar a indústria de energia canadense.
Em entrevista coletiva na segunda-feira, Trudeau alertou que Poilievre propõe uma agenda política limitada, afirmando que “parar a luta contra as mudanças climáticas não faz sentido”.
A mensagem, no entanto, parece reverberar pouco entre os residentes. Ao psicólogo e comentarista conservador Jordan Peterson, porém, Poilievre disse que seu sucesso nas pesquisas se resume a uma economia em deterioração que deixou as famílias pagando cerca de 20% a mais por bens e serviços do que antes da pandemia.
O PIB per capita do Canadá — que analistas argumentam ser uma boa medida do padrão de vida — caiu em oito dos últimos nove trimestres. Isso deixa a economia no mesmo nível de uma década atrás.
De acordo com a empresa de pesquisas Angus Reid, 55% dos canadenses tinham uma visão desfavorável de Poilievre, em comparação com 34% que o viam de forma favorável. Isso ainda era melhor do que Trudeau, cujos números desfavoráveis atingiram 74% no final de dezembro, comparado com 22% que tinham uma visão favorável do primeiro-ministro que estava saindo.
Ainda assim, porém, Poilievre tem uma liderança mais estreita sobre Chrystia Freeland, ex-vice-primeira-ministra e ministra das Finanças cuja renúncia acabou por selar o fim de Trudeau — e que deverá concorrer à liderança do Partido Liberal.
— Poilievre está disposto a ultrapassar limites, a descrever as coisas e desafiar as ortodoxias de uma forma que eu não acho que tenhamos visto em outro indivíduo que provavelmente se tornará premier — disse David Coletto, que dirige a empresa de pesquisa de opinião Abacus Data.